
Após o desabafo da médica Ana Paula Pereira sobre as condições de trabalho enfrentadas na rede municipal de saúde de Taubaté, entre eles o acesso a prontuários de pacientes, a prefeitura da cidade admitiu "instabilidades" após “mudanças de sistema durante os últimos anos”.
Clique aqui para fazer parte da comunidade de OVALE no WhatsApp e receber notícias em primeira mão. E clique aqui para participar também do canal de OVALE no WhatsApp.
Atuando há 11 anos na UBS Mais Independência, a médica desabafou em vídeo nas redes sociais na quinta-feira (17) expondo a falta de recursos, a sobrecarga e o impacto psicológico sobre os profissionais da área. Ela afirmou que faltam até papel e tinta para impressão de prontuários e receitas médicas.
“A gente faz tudo online, só que o sistema muda sempre. As consultas que eu fiz no ano passado, por exemplo, eu não tenho registrado porque não deu para imprimir. Como vou lembrar o que eu disse para 40 pacientes por dia?”, desabafou.
“Se não tem o prontuário impresso, é sem histórico. Como vou saber se o câncer evoluiu, se não evoluiu, e resolver isso em 15 minutos?”, questionou a médica.
No vídeo, Ana Paula também descreveu o cansaço emocional de lidar com uma rotina tão pesada. “Hoje foi muito pesado o dia. Muita paciente oncológica, sabe, e às vezes coincide no mesmo dia. Eu saí com o coração em caco. É muito sofrimento, e o pior é não conseguir ajudar em tudo por falta de papel e de tinta. Isso não entra na minha cabeça”, disse.
Procurada pela reportagem, a Prefeitura de Taubaté informou que, atualmente, as unidades da rede municipal utilizam prontuário eletrônico, o que elimina a obrigatoriedade de impressão dos atendimentos.
“O material físico disponível nas unidades é destinado prioritariamente à impressão de encaminhamentos, receitas e documentos imprescindíveis ao atendimento”, afirmou a administração municipal.
Que completou: “Sobre a alegação de dificuldade no acesso a prontuários anteriores, a Secretaria de Saúde esclarece que houve mudanças de sistema durante os últimos anos, o que pode gerar instabilidades”.
Psicológico.
Além das dificuldades estruturais, a médica fez um alerta sobre a saúde mental dos profissionais da linha de frente.
“O nosso psicológico não está bom. Uma amiga psicóloga falou: ‘quem está cuidando de vocês?’. Porque ela me viu chorando. Não é à toa. A maioria de nós fica aqui atendendo com maior carinho, com medo de perder salário, e com a intenção de oferecer o melhor para o paciente, independentemente de quem esteja na prefeitura. Não temos medo de trabalhar, mas queremos estrutura para atender bem”, afirmou.
Em relação ao tempo de atendimento, a Prefeitura de Taubaté informou que o padrão orientado é de “dois a quatro pacientes por hora, por conta da alta demanda, podendo o profissional ajustar esse número conforme o perfil epidemiológico do território e complexidade de cada caso”.
“A Secretaria de Saúde reafirma seu compromisso com a qualidade do atendimento à população e segue trabalhando para garantir as melhores condições de atendimento”, completou.
Por fim, Ana Paula reforçou que o desabafo não é uma crítica política, mas um pedido de socorro por melhores condições para atender a população. “Eu não falei nenhuma mentira e não estou falando mal do prefeito, pelo amor de Deus. É um desabafo mesmo, porque a gente está numa condição muito ruim e quem sofre é o paciente”.
Ela recebeu diversas mensagens de apoio após o vídeo viralizar nas redes sociais.
“Orgulho de ser filho dessa mulher incrível e poder me formar médico inspirando-me em uma profissional exemplar como é a minha mãe, a médica do vídeo. Já passou da hora da população jogar junto com os médicos e cobrar os verdadeiros responsáveis, aqueles que estão brincando com a cara do cidadão e ninguém faz nada nesse país”, disse Rafael Augusto, estudante de Medicina em São José dos Campos e atleta universitário. Ele é filho de Ana Paula.