
Apenas nos primeiros três meses do governo Sérgio Victor (Novo), a Prefeitura reduziu em 36% o número de famílias atendidas no programa de transferência de renda do município, o Cartão Mesa Taubaté.
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De janeiro até março desse ano, foi registrada uma queda de 1.365 beneficiários. Mas o número de excluídos pode chegar a 1.430, já que a Prefeitura informou que 65 novas famílias passaram a ser atendidas no período.
Em entrevista a OVALE, o secretário de Desenvolvimento e Inclusão Social, Marco Antônio Tolomio, disse que a medida visa permitir que o programa priorize famílias em situação de extrema vulnerabilidade social, mas distorceu trechos da legislação municipal para justificar a exclusão de beneficiários (leia mais abaixo ou leia a entrevista completa aqui).
Corte.
Criado no início de 2022, no governo do então prefeito José Saud (PP), o cartão substituiu as cestas básicas que eram distribuídas mensalmente pela Prefeitura para famílias de baixa renda. Eram 3.900 cestas por mês. Esse mesmo número foi colocado como limite máximo para os cartões, que são recarregados com crédito todos os meses - no início, de R$ 129 por mês, e atualmente, de R$ 188.
Em 2024, no último ano do governo Saud, o número de famílias atendidas mensalmente no programa variou de 3.693 (abril) a 3.737 (fevereiro).
No governo Sérgio, foram 3.733 famílias atendidas em janeiro. Em fevereiro, o número caiu para 2.785 - uma redução de 948 beneficiários. Em março, passou para 2.368 - um corte de mais 417 famílias.
Justificativa/Prazo.
Questionado pela reportagem, o secretário de Desenvolvimento e Inclusão Social disse que o corte atingiu beneficiários que se enquadravam em três grupos: com renda familiar per capita acima de R$ 400; que já eram atendidos pelo programa Cartão Mesa Taubaté há mais de um ano e meio; e que já são contemplados em outros programas, como o Bolsa Família e o BPC (Benefício de Prestação Continuada), ambos do governo federal.
Na entrevista, no entanto, Tolomio distorceu trechos da legislação municipal para justificar o uso desses grupos como critério. O secretário afirmou, por exemplo, que o tempo máximo de permanência no programa seria de 12 meses. "A lei que foi criada no município de Taubaté diz que o cartão é para seis meses, podendo ser prorrogado por mais seis, completando um ano. 60% das pessoas que estavam inseridas no cartão, o que dá 2.500 pessoas, estavam no cartão entre um ano e meio e três anos, ininterruptamente", disse. "Bateu um ano, a pessoa tem que deixar o ciclo para permitir que outros entrem", completou.
A lei do programa, que foi criada em 2021, chegou a prever inicialmente esse prazo - eram seis meses, prorrogáveis por mais seis. Mas esse trecho da norma foi alterado em março de 2023, e não há mais tempo máximo de permanência no programa. A exigência atual é que, a cada semestre, o beneficiário passe por nova avaliação e recadastro.
Justificativa/programas.
O secretário também afirmou que a lei municipal proibiria que fossem atendidas pessoas beneficiadas por outros programas assistenciais, como Bolsa Família e BPC.
"Todas as 3.700 pessoas inseridas no cartão estavam inseridas em algum programa social. Se você pegar a lei que fundamenta o cartão de alimentação, diz claramente que esse cartão é para as pessoas que não estão sendo assistidas por nenhum programa do governo", disse.
A lei municipal enumera, em ordem a ser seguida, 10 critérios que devem ser usados para definir as famílias a serem priorizadas com o cartão. O décimo e último critério estabelece que sejam priorizadas as famílias que não estejam recebendo benefícios de outros programas de transferência de renda. E, além de ser o último critério, a lei não proíbe que famílias contempladas com outros programas também sejam beneficiadas com o cartão.
Justificativa/renda.
O secretário também citou dados diferentes da lei municipal para justificar o corte com base na renda. "Qual é o critério da extrema vulnerabilidade que o próprio governo federal diz? R$ 216 [de renda familiar per capita]".
A lei municipal que criou o programa, no entanto, diz que podem ser atendidas famílias "em situação de vulnerabilidade ou extrema vulnerabilidade social", e estabelece critérios para definir essas situações.
A vulnerabilidade social, por exemplo, seria no caso de renda familiar per capita de até meio salário mínimo, o que representaria atualmente R$ 759 - quase o dobro do patamar de R$ 400, usado para o corte promovido pela Prefeitura. Já a extrema vulnerabilidade seria para renda familiar per capita de até um quarto do salário mínimo (até R$ 379,50).
Prioridade.
O secretário afirmou ainda que o corte visou abrir espaço para que famílias de menor renda possam ser contempladas. No entanto, a redução foi de 1.365 beneficiários, enquanto a lista de espera do programa era de apenas 500 pessoas.
Além disso, dessas 500 pessoas, apenas 65 teriam sido incluídas no programa de janeiro a março. "Obrigatoriamente as 500 que esperavam [na fila] precisavam ser inseridas? Não. Qual foi a prioridade? Renda zero. No meio dessas 500 pessoas que aguardavam ser inseridas no cartão, muitas não estavam inseridas em programas nenhum, não tinham nenhum tipo de benefício. A gente está identificando. O mês de janeiro foram 20 [pessoas que entraram no programa], fevereiro foram 25, agora em março foram mais 20", disse Tolomio.
"Se a pessoa foi cortada e está numa situação extrema de vulnerabilidade, só ligar para nós, que nós vamos fazer a visita social. E, se no contexto familiar, a visita social detectar que a pessoa tem necessidade, nós regressamos com o cartão. Das 900 pessoas que foram cortadas [foram, pelo menos, 1.365], quantas até agora ligaram para nós e pediram a visita social? Vinte pessoas. Das 20 pessoas que foram visitadas, só três puderam retornar para o cartão. As demais, tiveram casos com salão de manicure, salão de cabeleireiro, salão de barbeiro, trabalhando na economia informal, trabalhando de Uber. Elas acabaram não voltando para o cartão, porque elas já estão assistidas de alguma forma e elas têm fontes de renda", acrescentou o secretário.
Programa.
Questionado sobre o Cartão Mesa Taubaté, o secretário fez críticas ao programa. "Foi criado um programa político, em que foram distribuídos irresponsavelmente os cartões. Estou entrando em contato com todos os municípios. São José [dos Campos], sabe quantas cestas básicas distribui? Nenhuma. Em Guaratinguetá, são 100 cestas básicas. Taubaté tem um programa político. E a maneira como ele foi coordenado no município foi irresponsável".
Tolomio disse que, posteriormente, o corte no programa poderá ser ampliado. "Vamos continuar o trabalho, nesses 2.600 que sobraram [são 2.368], para saber se verdadeiramente essas pessoas precisam ou não precisam. Temos que fazer o correto, senão a gente continua incorrendo no grande equívoco que foi a criação do cartão e de ter sido distribuído de uma forma aleatória e sem uma regra verdadeira a ser seguida".
O secretário negou, no entanto, que o objetivo do corte no programa seja economizar - em janeiro, Sérgio Victor determinou que todas as pastas reduzissem os gastos em 30%, e o corte no Mesa Taubaté foi de 36%. "O corte da Prefeitura, de 30%, tem a ver com cargo de gestão, redução da folha com questão de cargos que foram criados. Agora, com relação aos contratos, não foi falado que era para reduzir. O que o governo está fazendo é chamar os contratos vencidos, que a Prefeitura tem que pagar, e renegociando a dívida".
A lei municipal determina que o valor do cartão seja reajustado anualmente. Segundo Tolomio, isso deve ocorrer apenas no segundo semestre. "No ano passado, reajustaram o cartão em março. Não tem uma data em que precisa ser reajustado, precisa ser reajustado durante um período. Estamos nos organizando para tentar fazer um reajuste do cartão no segundo semestre".