Sétimo lugar, com 1,25% das intenções de voto.
Esta era a posição de Sérgio Victor (Novo) no grid da corrida ao Palácio do Bom Conselho, sede da Prefeitura de Taubaté, em 20 de maio de 2023, de acordo com levantamento OVALE/Ágili Pesquisas. À frente dele estavam outros competidores, como Loreny, Capitão Souza, Padre Afonso, José Saud, Digão e Ortiz Junior, isolado na ponta, com 24%.
Legenda: Pesquisa OVALE de março de 2023
Dentro de um ano e cinco meses, Sérgio sairia das últimas filas e, em 27 de outubro de 2024, receberia a bandeirada como novo prefeito da segunda maior cidade do Vale do Paraíba, destronando o favoritismo de Junior e a dinastia Ortiz, que acumula cinco mandatos desde a década de 1980, com pai e filho.
E qual é a história desta vitória tão improvável?
Quem acompanha Fórmula 1 e teve o privilégio de assistir o brasileiro Ayrton Senna (1960-1994) nas pistas sabe que a chuva pode mudar os rumos de uma corrida. Pois bem, nas eleições de 2024, caiu uma 'tempestade perfeita' sobre Ortiz -- perfect storm, expressão inglesa, refere-se a um evento drasticamente agravado pela ocorrência de uma rara combinação de circunstâncias, transformando-se em um desastre.
Desde 2023, Ortiz, prefeito entre 2013 e 2020, liderava todos os levantamentos sobre a corrida eleitoral em Taubaté, favorecido pelas derrapadas da gestão José Saud (PP), atual chefe do Executivo municipal, dono de uma péssima avaliação de governo, com uma consequente baixíssima intenção de votos na briga pela reeleição. Como desafiante, Loreny (Solidariedade), segunda colocada em 2020, destacava-se e parecia destinada a ocupar o papel de antagonista de Ortiz.
Com as voltas e voltas do relógio, voltas e voltas neste autódromo político, chegamos a 2024 e ao início da campanha em agosto, com a definição do grid para a largada, com seis nomes na disputa.
Ortiz na pole position, seguido, bem atrás, por Loreny e Márcia do PL (que tentava arrancar tendo como ponto forte o motor do voto bolsonarista), no duelo roda com roda pela segunda posição. Sérgio figurava em uma posição intermediária, atrás do bloco da frente, à frente do bloco de trás, formado pelos retardatários Saud e Coronel Paulo Ribeiro (PT), nas últimas colocações.
Fator Saud e cinco contra um.
Com 3% das intenções de voto nas pesquisas, no início da campanha, e uma reprovação estratosférica, Saud teve papel de figurante na disputa pelo voto, mas, com um estilo kamikaze, focou a campanha em fustigar Ortiz. E não foi só ele.
No primeiro turno, essa foi a tônica da campanha, em um roteiro "cinco contra um". Afinal, por que os demais candidatos atacariam o irrelevante Saud? A meta era atingir Ortiz, evitando inclusive o risco de vitória em primeiro turno.
Com Saud poupado por sua irrelevância eleitoral, Ortiz se tornou 100% "vidraça". "Até parece que o prefeito sou eu", resmungou o candidato do Republicanos, nos bastidores do debate na TV Band Vale.
Ortiz foi alvo preferencial de Loreny, Márcia, Sérgio, Paulo e Saud -- que entrou na disputa com a meta de contrapor o seu desafeto político; é voz corrente até mesmo na campanha Ortiz que o atual prefeito, que terminou a eleição com um resultado pífio (1,52% dos votos válidos ou 2.414 votos), teve papel importante no esforço para minar o candidato do Republicanos.
Bússola quebrada.
Em setembro, com as pesquisas indicando um crescimento de Márcia e um acirramento na disputa entre a candidata do PL e Loreny, pela segunda posição, Ortiz intensificou a sua artilharia contra as adversárias. "Márcia é Saud", destacava o líder da corrida eleitoral. E os ataques contra Sérgio?
Com base em trackings internos, a campanha de Ortiz orientava o candidato a evitar críticas ao ex-deputado estadual. A expectativa era que Sérgio tivesse de 8 a 10% dos votos e que seria importante tentar o apoio dele em um eventual segundo turno. Bússola quebrada, estratégia furada.
Sabe aquelas corridas em que os carros lá da frente batem e o piloto que aparecia mais atrás, de repente, assume posições no pelotão da frente?
Pois bem. Na reta final do primeiro tempo, na última semana, Márcia e Loreny sentiram o impacto da artilharia de Ortiz e perderam tração. Incólume, Sérgio correu por fora e teve uma arrancada surpresa, deixando as favoritas para trás e, em uma curva ascendente, garantindo uma vaga no segundo turno, com 23,52% dos votos válidos, contra 21,56% de Márcia e 15,18% de Loreny; Ortiz cruzou a linha de chegada em primeiro, com 36,20%.
Segundo turno.
Aí, as nuvens carregadas avizinharam-se de Ortiz.
É provável que o ex-prefeito, mesmo sendo alvo principal das críticas no primeiro turno, vencesse todos os demais concorrentes no segundo turno, com uma exceção: Sérgio Victor. Se Ortiz se colocava como a 'mudança', em uma cidade decepcionada por quatro anos de Saud, de repente, Sérgio capturou esse discurso. Agora, rapidamente, o novo era ele, Ortiz era a "velha política".
Ao ser poupado no primeiro turno, Sérgio chegou ao segundo tempo desta disputa com baixa rejeição. Se a Márcia, a Loreny, o Saud e o Paulo criticaram Ortiz no primeiro turno, o eleitor destes candidatos votariam em Ortiz agora?
Coube ao ex-prefeito recalcular a rota e, ao longo do segundo turno, tentar descontruir o adversário, até mesmo reciclando estratégias usada contra outros adversários, como o lema "Sérgio é Saud". Não foi suficiente.
Na comparação com o primeiro turno, Ortiz conquistou 2.203 novos votos (de 57.565 para 59.768), enquanto Sérgio obteve 60.051 novos votos (de 37.399 para 97.450). Em uma tempestade perfeita, Ortiz derrapou e saiu da pista, sendo ultrapassado pelo novo prefeito de Taubaté.
Qual é a previsão do tempo para o próximo mandato?
A partir de 1º de janeiro de 2025, Sérgio estará a bordo de um carro desajustado, que exigirá muita pilotagem até mesmo em pista seca. Por via das dúvidas, haja pneu de chuva!
Comentários
1 Comentários
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Tarcísio José de Souza e Silv 28/10/2024Parabéns pela qualidade dessa matéria, perfeita, exatamente, derrubou a velha política da família Ortiz, Taubate ´sorriu de novo.