
Em meio à natureza exuberante do Gomeral, um dos bairros rurais mais bonitos do Vale do Paraíba, os sons de pássaros, das cachoeiras e da vida selvagem não têm significado para Wanderson Chiaradia Gabriel, 34 anos, que trabalha como guia turístico ecológico.
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O motivo não é falta de sensibilidade, que ele tem de sobra. É que Wanderson é surdo desde os 3 anos de idade, quando uma meningite roubou-lhe a audição.
Ele não ouve absolutamente nada, mas sente a natureza como poucos, o que o torna um guia ecológico especial e referência na luta por inclusão de pessoas com deficiência na sociedade. Ele não tem memória auditiva e não se lembra de nenhum som, mas tem na visão sua grande aliada. Por não escutar, ele também não desenvolveu a fala.
“Consigo perceber a natureza. Eu sinto o gosto de uma cachoeira”, disse ele.
“As pessoas falam muito e eu consigo sentir ao máximo, não fico perturbado quando estou no local, somente a paz, eu sinto as nuvens. Tenho uma empatia com a natureza e o silêncio é bom para contemplar. Não me perco nos sons, eu sinto a natureza e acaba sendo mais forte para mim entre todos os sentidos”, explicou o guia.
Aplicativo.
Wanderson se comunica com a ajuda de um aplicativo, por meio de uma chamada de vídeo que o coloca em contato com uma pessoa que domina a Língua de Sinais. Essa pessoa, que pertence a uma organização que oferece esse serviço, “empresta” o ouvido e a voz para o guia do Vale, que nasceu, mora e trabalha em Guaratinguetá.
A mãe dele tem uma pousada no Gomeral, na zona rural de Guará, de onde Wanderson parte com seus grupos para trilhas pela natureza exuberante do local, que faz divisa com Campos do Jordão. Ele faz parte da organização Guia Trilhas Gomeral, que tem perfil no Instagram e leva pessoas para conhecer a região.
“Temos um encontro quando faço o trabalho de guia e começamos pelo Whatsapp, onde combinamos o encontro em frente à pousada da minha mãe. Depois a gente faz esse trajeto de trilhas. Muitas pessoas me conhecem e confiam no meu trabalho”, disse o jovem guia.
Wanderson tem formação de técnico em turismo pelo Senac e já fez vários workshops na área, incluindo cursos em Minas Gerais. Ele frequentou o ensino fundamental em Guará, com muita dificuldade, e disse ter contado sempre com o apoio de professores para seguir em frente. “Fiz ensino básico em Guará e não foi fácil, mas sempre tive professores que me ajudaram. A surdez não me limitou, mas não foi fácil”.
Atualmente, além de atuar como guia, ele é funcionário do Santuário Nacional de Aparecida, no setor de correspondência. O guia é casado com Dalila e ambos têm a filha Maressa, de apenas três meses.
Confiança.
Segundo Wanderson, as pessoas estranham no início o trabalho dele como guia ecológico, mas a estranheza é logo substituída por confiança.
“A acolhida: é muito tranquila. Às vezes as pessoas ficam confusas e preocupadas, mas acabo me adaptando a elas e elas a mim. Tem gente que conhece Libras ou usamos comunicação por texto, no aplicativo de mensagem, e esse desenvolvimento da trilha e essa parceria acabam sendo bem tranquilas.”
“Eu não escuto e consigo perceber muita coisa, a parte visual é muito grande e consigo perceber muita coisa, como um passarinho cantando, embora não escute. Eu cresci no Gomeral e conheço bem a região, é uma experiência visual muito grande. As pessoas têm essa preocupação no início e depois se acostumam e até retornam, por ser uma experiência diferente. Conseguimos interagir”, disse ele.
Inclusão.
Ainda sem encontrar muitos deficientes entre os turistas que atende, em razão das dificuldades desse público, Wanderson sonha em conseguir levar cada vez mais pessoas com deficiência para conhecer a natureza.
“É um sonho que tenho de conseguir apoio e ajuda para participar desse turismo ecológico, mas hoje não temos acessibilidade para essas pessoas. É um sonho que tenho. Futuramente, com o desenvolvimento da acessibilidade, pode ser que consigamos. Eu faço várias trilhas com pessoas surdas e eles têm maior facilidade, porque não têm a barreira da mobilidade.”
Para Wanderson, a vida é uma batalha diária de superação e esperança, que ele compartilha com quem é guiado por ele. Faz questão de sorrir, amar o que faz e acreditar no futuro. A doença tomou-lhe a audição, mas não conseguiu roubar-lhe a fé.
Comentários
1 Comentários
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Cheryl Annette Li 17/02/2025No 16 fev. 2025, o passeio com o Wanderson foi simplesmente maravilhoso. Um excelente pessoa. Nem sendo um deficiente auditivo, gostei muito. Meus parabéns pelo esforço, coragem e ser um guerreiro em pessoa que eu conheço.