A guerra entre gangues que fez de Cruzeiro a cidade mais violenta do estado acumula várias vítimas jovens na cidade, coloca adolescentes em lados opostos do conflito e exporta a brutalidade para cidades da região sem histórico de criminalidade.
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A vítima mais recente foi morta na manhã da última quinta-feira (8), quando um adolescente de 16 anos foi baleado por outro da mesma idade dentro de um centro de atividades do Sesi, em Cruzeiro. Ele foi perseguido pelo jovem que efetuou cerca de nove disparos.
Gabriel Henrique Santos Batista correu para dentro do centro de atividades quando começou a ser alvo do atirador, ainda na rua. O jovem foi socorrido pelo Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência), mas morreu na Santa Casa de Cruzeiro.
O autor do crime foi preso em flagrante e teria confessado o homicídio. Ele alegou que a vítima teria tentado matá-lo na quarta-feira (7). A prisão ocorreu após investigação da DIG (Delegacia de Investigações Gerais), com apoio da Polícia Militar.
A Polícia Civil informou que, na mochila da vítima, apreendida no local do crime, havia um revólver calibre 32, municiado com seis projéteis intactos.
Drogas.
Em maio, um jovem de 28 anos foi morto com tiros na cabeça no bairro Washington Beleza, em Cruzeiro. Ele foi encontrado por policiais militares após moradores escutarem barulho de tiros próximo a uma escadaria. No local, os agentes encontraram Wesley Martins Clemência, 28 anos, caído na via pública e alvejado pelos disparos.
Ele foi baleado na cabeça e nas costas e chegou a ser socorrido pelo resgate do Corpo de Bombeiros, mas faleceu após dar entrada na Santa Casa.
De acordo com a polícia, o local do crime é um ponto de venda de drogas conhecido como “Buraco Quente”. A vítima tinha passagem criminal e era procurada pela justiça desde janeiro.
Vingança.
Em fevereiro deste ano, uma mulher de 39 anos foi assassinada dentro da própria casa, em Queluz, por um desafeto do filho dela. Ele invadiu a residência para matar o rapaz, mas, sem encontrá-lo, decidiu dar cabo da mãe dele. Samantha Alves Mendes foi morta a tiros dentro da sua residência.
Segundo a investigação da Polícia Civil, dois irmãos teriam ido à casa de Samantha para matar o filho dela, desafeto de ambos. A dupla estava em guerra com o rapaz, com outras tentativas de homicídio frustradas anteriormente.
Eles chegaram atirando e invadiram a casa, em seguida alvejando Samantha com tiros no braço e no rosto. O filho dela não estava em residência. Os matadores acharam que matá-la valeria como vingança na guerra entre gangues. A vítima foi atingida no braço e depois no rosto e teria sido morta na frente de outros filhos. Os irmãos fugiram pela linha férrea.
A dupla de matadores seria inimiga do filho de Samantha, que estava “jurado de morte”. Eles estavam em “pé de guerra”.
Logo após o crime, policiais militares e civis iniciaram as buscas para localizar os suspeitos. Eles foram encontrados em uma casa em construção no bairro da Palha. Um adulto portava um simulacro de arma de fogo e o adolescente confessou ter efetuado os disparos contra a mulher.
Os irmãos eram moradores de Cruzeiro e estariam vivendo no bairro da Palha, em Queluz, quando foram à residência de Samantha e cometeram o assassinato. O maior de idade foi preso e recolhido à cadeia pública de Cruzeiro e o adolescente, apreendido e conduzido à Fundação Casa.
Violência.
Também em maio, um homem foi morto a pauladas em Itagaçaba, bairro mais violento de Cruzeiro. A vítima se envolveu em uma briga e foi agredida com pedaços de madeira. Ele chegou a ser socorrido com fratura e afundamento de crânio, mas faleceu na Santa Casa de Cruzeiro.
Em julho, em menos de 24 horas, duas pessoas foram assassinadas na cidade. Thiago Donizete Crispim, 42 anos, foi morto a facadas e Raphael Caetano Lombardi da Costa, 30 anos, foi alvejado por disparos de arma de fogo. Ambos os crimes ocorreram na região central.
O servente de obras Thiago Donizete foi esfaqueado durante a madrugada na praça Nove de Julho. Ele chegou a ser socorrido e levado para a Santa Casa, mas não resistiu aos ferimentos e morreu durante a tarde.
De acordo com a irmã da vítima, que prestou depoimento à polícia, Thiago era usuário de drogas e costumava se envolver em brigas. Suspeita-se de que o motivo da morte tenha sido uma briga relacionada ao uso de drogas.
Menos de 24 horas após o primeiro homicídio, Raphael foi alvejado por disparos de arma de fogo e morto na rua Afonso Pena, na região central de Cruzeiro.
Ele foi atingido na cabeça e nas costas. O Corpo de Bombeiros foi acionado e fez o resgate, mas Raphael não resistiu aos ferimentos e morreu ao chegar à Santa Casa.
Segundo moradores da cidade, Raphael havia trabalhado em uma lanchonete na rodoviária de Cruzeiro e estaria empregado numa pizzaria da cidade.
“Tem alguma coisa muito errada nesta cidade. Não é normal a perda de jovens dessa maneira. É necessário urgente fazer um levantamento das causas de tantas mortes e investir em ações que a curto e médio prazo muda essa violência toda”, comentou um morador de Cruzeiro nas redes sociais.
Cultura da violência.
À frente da Delegacia Seccional de Cruzeiro, o delegado João Paulo de Oliveira Abreu está na cruzada por descobrir os autores dos assassinatos e reduzir o número de mortes na cidade, que vem registrando queda nos homicídios desde 2021, mas com um recrudescimento neste começo de 2024.
Em entrevista a OVALE, em março deste ano, ele falou sobre a disputa entre gangues violentas no Itagaçaba. “O bairro Itagaçaba está dividido por dois grupos que estão rivalizando entre eles”, afirmou João Paulo.
Ele percebeu e, Cruzeiro um fenômeno conhecido da criminologia: a subcultura da delinquência, que faz jovens atuarem no crime não em benefício próprio, para obter ganhos materiais, mas para impor respeito, impor uma questão de território e de status.
“São pessoas que agem e atuam não em benefício próprio, para obter ganhos materiais, mas muitas vezes simplesmente para impor respeito, impor uma questão de território”, explicou.
“A gente observou esse fenômeno em Cruzeiro com muita força. São bairros de periferia ou jovens unidos ali entre eles e que entraram em rixa com outros bairros, e aí vêm cometendo crimes. Todos participam em grande parte do tráfico de drogas, mas a gente não viu uma disputa de territórios entre esses bairros”, disse o delegado.
“Eles têm as culturas próprias deles, a gente observa muitas tatuagens no rosto com elementos claros de gangues, como tragédia, palhaço, cifrão, lágrima, coração na garganta. São típicos elementos que caracterizam para nós elementos de gangue, de subcultura da delinquência. É o que nós temos observado.”
De janeiro a junho deste ano, a cidade registra 15 vítimas de homicídio contra 18 no mesmo período do ano passado, uma queda de 16%. Em 2022, no mesmo intervalo, foram 19 mortes e 16 em 2021.
Os números estão em queda, mas a taxa de vítimas de homicídio por 100 mil de Cruzeiro continua a maior do estado, com 38,69 vítimias, quando a média estadual é de 5,89.