O patriarcado cria uma divisão hierárquica.
Eu, por ser mulher, sou estigmatizada como puta por vender conteúdo erótico. Os homens não passam por isso. Pelo contrário, vendem conteúdo erótico, fotografias e vídeos em plataformas internacionais e vão realizar seus sonhos e representam seus respectivos países nas olimpíadas, por exemplo.
Percebo que eu e algumas amigas que também produzem conteúdo erótico vivemos “justificando nosso trabalho”, uma situação de total subserviência ao poder fálico.
É preciso estarmos atentos para enfatizar o óbvio: os direitos das mulheres tem de ver com os direitos humanos. Nós somos humanas e não objetos.
As minhas escolhas de explorar as potências do meu corpo me fizeram perder amizades, chances de me recolocar no mercado formal de trabalho e também me levaram a ser vítima de violência doméstica. Eu vejo rastros da violência no meu corpo e no meu aparelho psíquico até hoje.
O filósofo Deleuze diz que o poder requer corpos tristes, pois é mais fácil ser dominado, eu penso que essa colonização do corpo da mulher como objeto a ser explorado sem remuneração passa por esse lugar de uma grande melancolia e mal estar social que estamos vivendo.
As mulheres são objeto de fetiche e descarte (etarismo). Acho que essa é a questão que mais incomoda. Não é o fetiche, a fantasia. Isso é inerente do desejo de todos nós. O que ocorre é que há um inconsciente coletivo que nós mulheres devemos prestar serviços e não sermos remuneradas por isso, ou então, “menos remuneradas”, sobretudo no campo da produção de conteúdo erótico.
Estou exausta de trabalhar e ler: “eu preciso pagar pra te ver nua?”
Sim, precisa. Meu corpo não está numa vitrine pra ser manipulado de forma gratuita e sem alma.
A nudez me custa muito caro. Ela me leva ao sagrado de mim mesma. Me traz a ancestralidade, quebra tabus, portanto deve ser glorificada. Eu tenho
Orgulho do meu trabalho e da fonte de prazer que eu usufruo com ele.
* Vanessa Alves é escritora, poeta, atriz, jornalista e autorretratista. Publicou 'Peguei meu coração e comi', pela editora Patuá. Também participou de antologias pelo selo Off Flip, Chiado Books e como escritora do V Festival de Poesia de Lisboa. Sua literatura está vinculada ao autorretrato cru e contemporâneo que a artista produz.