SINDICATO

Fraude: MP denuncia ex-vereador de Taubaté, ex-diretor da Prefeitura e sócias de empresa

Por Julio Codazzi | Taubaté
| Tempo de leitura: 7 min
Montagem com fotos de Guará Filho e Daniel Bueno
O ex-vereador e o ex-diretor de Administração da Prefeitura
O ex-vereador e o ex-diretor de Administração da Prefeitura

O Ministério Público ajuizou uma nova ação de improbidade administrativa em meio ao inquérito que apura um suposto esquema fraudulento relacionado ao convênio em que o Sindicato dos Servidores intermediava o plano de saúde dos funcionários da Prefeitura de Taubaté.

Clique aqui para fazer parte do canal de OVALE no WhatsApp e receber as principais notícias da região. E clique aqui para participar também na nossa comunidade no WhatsApp

Dessa vez, foram denunciados o ex-vereador Guará Filho (Republicanos), que é ex-presidente do sindicato; o ex-diretor de Administração da Prefeitura Daniel Bueno; Rejane Aparecida Lapolli Bressan e Tatiane Lapolli Bressan, que eram sócias da empresa Bressan – Assessoria e Consultoria Empresarial; além do próprio sindicato.

A ação tramita em sigilo na Vara da Fazenda Pública de Taubaté, mas OVALE teve acesso ao processo. Tanto a Vara da Fazenda Pública quanto o Tribunal de Justiça negaram a liminar em que o MP solicitava que os réus tivessem os bens bloqueados. Mas a 7ª Câmara de Direito Público do TJ atendeu um pedido da Promotoria e determinou que seja feita a averbação premonitória - nesse caso, a informação da existência do processo judicial passa a constar nas matrículas dos imóveis dos acusados, já que os bens poderão ser utilizados posteriormente caso a sentença determine reparação de eventuais danos causados aos cofres públicos.

ESQUEMA.
O sindicato passou a intermediar o plano de saúde dos funcionários da Prefeitura de Taubaté em 2013, mas a investigação do MP na esfera cível teve início após OVALE mostrar, em junho de 2017, o descontentamento de servidores que pagavam valores superiores aos cobrados pelas operadoras - embora cada empresa cobrasse de acordo com a faixa etária dos funcionários, a entidade sindical adotou preço médio para todos os servidores, independentemente da idade de cada um.

Na época, o sindicato alegou que a medida era necessária para suavizar os valores que os funcionários mais velhos teriam que pagar. No entanto, uma análise contábil parcial, que foi feita pela Promotoria com base nos meses de fevereiro, março, setembro e outubro de 2016 e de janeiro a junho de 2017, apontou que a entidade sindical recebeu R$ 1,358 milhões a mais do que deveria apenas nesse período de 10 meses.

O MP apontou que em 78,22% dos casos os valores recebidos pelo sindicato eram superiores aos cobrados pelas operadoras dos planos de saúde. E que em 16,44% dos casos os valores descontados dos salários dos servidores já eram suficientes para custear integralmente a mensalidade, mas que mesmo assim ainda havia subsídio pago pela Prefeitura, o que configurou sobrepreço de R$ 301 mil no período analisado.

AÇÕES.
Uma primeira ação de improbidade administrativa foi proposta pelo MP em outubro de 2019. Nela, apenas o sindicato foi denunciado: a Promotoria pede que a entidade seja condenada a devolver todo o valor recebido indevidamente por meio do convênio. Esse processo, que também tramita em sigilo, ainda não foi julgado pela Vara da Fazenda Pública. Atualmente, aguarda-se a conclusão de uma perícia que irá fazer a análise contábil de todo o período da parceria entre sindicato e Prefeitura, que se encerrou em agosto de 2020.

Em julho de 2020, o caso ganhou outra proporção, após o MP deflagrar uma operação na esfera criminal -- esse inquérito, que apura uma série de crimes como lavagem de dinheiro, falsidade ideológica, organização criminosa, fraudes contratuais e peculato, corre sob sigilo e ainda não foi concluído. Nele, são investigadas cinco pessoas físicas - Guará Filho, Daniel Bueno, Rejane Bressan, Mara Marques (atual presidente do sindicato, que era diretora da entidade na gestão de Guará) e Marcelo Pinto Fagundes (ex-funcionário do sindicato, que atuou como assessor parlamentar de Guará) - e quatro pessoas jurídicas - o sindicato, a Bressan, a Qualiconsult (empresa de Guará Filho) e a Controller Auditoria (que prestava serviços de contabilidade para o sindicato e para a Qualiconsult).

Nessa nova ação de improbidade, ajuizada no fim de fevereiro, o MP pede que Guará Filho, Daniel Bueno e as sócias da Bressan sejam condenados à "perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio", além de suspensão dos direitos políticos por até 12 anos e pagamento de multa equivalente ao valor do dano - o valor foi inicialmente fixado em R$ 1,659 milhão (soma dos valores recebidos indevidamente e do sobrepreço nos 10 meses analisados), mas poderá ser atualizado quando a perícia da primeira ação for concluída. Em relação ao sindicato, a Promotoria pede que a entidade seja condenada ao "perdimento dos bens, direitos ou valores que representem vantagem ou proveito direta ou indiretamente obtidos da infração", além de ficar impedida de receber subsídios de órgãos públicos por até cinco anos.

GUARÁ FILHO.
Sobre Guará Filho, que no inquérito criminal é classificado como "líder e mentor do esquema de desvio de dinheiro público", o MP cita nessa nova ação que foi ele o responsável, como presidente do sindicato, por contratar a Bressan para atuar no convênio do plano de saúde - terceirização essa que era proibida no contrato firmado com a Prefeitura. O dinheiro excedente teria sido desviado por meio da empresa.

A Promotoria aponta ainda que "os recursos desviados dos cofres públicos" foram utilizados por Guará "na aquisição de bens móveis e de bem imóveis, em aplicações financeiras, compra de barco". Em 2020, na época da operação criminal, a Justiça chegou a sequestrar três imóveis e uma lancha, avaliados em pelo menos R$ 1,75 milhão, mas essa medida já foi suspensa.

Para o MP, os rendimentos do ex-vereador "não condizem com sua evolução patrimonial". A Promotoria aponta ainda que Guará Filho teria investido em criptomoedas parte dos valores obtidos por meio da suposta fraude.

DANIEL BUENO.
Sobre Daniel Bueno, o MP ressalta que a fiscalização do convênio com o sindicato cabia ao então diretor de Administração da Prefeitura, mas que ele "agiu de forma deliberadamente desidiosa, mediante indesculpável omissão no desempenho da responsabilidade que lhe foi atribuída, fruto da sua conivência com a prática dos ilícitos".

Para a Promotoria, Bueno "deixou de adotar as mínimas providências necessárias a possibilitar a fiscalização da execução do contrato".

Na esfera criminal, foi identificada uma troca de mensagens entre o então diretor de Administração e Guará Filho, que teria como objetivo retardar apuração interna sobre o caso.

BRESSAN.
Sobre as sócias da empresa, o MP aponta que "Rejane e Tatiane experimentaram enriquecimento ilícito", e que Rejane também teria investido parte dos valores obtidos por meio da suposta fraude em criptomoedas.

A Promotoria destaca também que somente em 2019, quando ainda prestava serviço para o sindicato, a empresa teria obtido uma receita de R$ 1,392 milhão.

A Bressan foi extinta em maio de 2021 - para o MP, isso ocorreu "tão logo as investigações" cível e criminal "avançaram, com a quebra de sigilos fiscais e financeiros inclusive", numa "demonstração evidente de que sua função de 'lavanderia contábil' já não se fazia mais necessária".

SINDICATO.
Sobre o sindicato, a Promotoria afirma que a entidade "patrocinou a prática dos atos ilícitos" citados na ação, "na medida em que cedeu sua estrutura não somente para a constituição do negócio jurídico com a Prefeitura", como "também acobertou as condutas dos demais demandados, porquanto seus órgãos de fiscalização interna se omitiram quanto à ocorrência das fraudes, permitindo que os demandados Augusto César [Guará Filho] e Rejane estruturassem uma contabilidade paralela destinada exclusivamente a administrar os assuntos relacionados aos planos de saúde".

Além das ações movidas pelo MP, o sindicato também é alvo de processos de servidores que reclamam de valores abusivos que foram descontados de seus salários para o custeio do plano de saúde.

Segundo levantamento feito pela reportagem, já passou de R$ 2,97 milhões o valor que o sindicato foi condenado a pagar para esses servidores. Ao todo, são cerca de 330 processos. Em ao menos 238 deles, o sindicato perdeu. Nos demais, ainda não há sentença.

OUTRO LADO.
Guará Filho, que deixou a Câmara no fim de 2020 e a Prefeitura em março de 2021 (ele era agente de trânsito concursado), nega qualquer irregularidade no caso. "Fui e estou sendo vítima de perseguição política", afirmou. "Estou feliz com essa propositura de ação porque agora, depois de tantos anos, vou ter a condição de me defender da falsa tese apresentada a meu respeito. Tenho dezenas de provas que desmontam toda a narrativa feita contra mim e elas serão apresentadas no momento certo".

Daniel Bueno, que também já deixou a Prefeitura e é o atual vice-presidente do PSD de Taubaté, disse que nunca houve "nenhuma decisão judicial desfavorável a minha conduta e assim será mais uma vez provada".

Rejane Aparecida Lapolli Bressan e Tatiane Lapolli Bressan não foram localizadas pela reportagem nessa quarta-feira (20). Enquanto esteve em atividade, a empresa Bressan nunca se manifestou publicamente sobre a suspeita de fraude.

O Sindicato dos Servidores informou que "não irá se manifestar porque não teve ainda acesso ao referido processo". Em manifestações feitas nos últimos anos em meio a processos movidos por funcionários da Prefeitura, a entidade alegou que teria sido vítima de "atos de terceiros".

Comentários

Comentários