Com faturamento de R$ 4,9 bilhões por ano, o sistema de tráfico de drogas comandado pelo PCC (Primeiro Comando da Capital) opera como uma indústria, capaz de produzir a mercadoria que será distribuída para as 'lojas' ou 'biqueiras', como são conhecidos na gíria do crime os pontos de venda de entorpecentes vinculados à facção criminosa, nascida no Vale do Paraíba, em 1993.
'Berço' do PCC, a região com a maior taxa de homicídios de São Paulo e já é palco da distribuição de uma das marcas mais recentes da indústria da droga ligada à organização criminosa: é a cocaína a vácuo. A droga, que é um dos carros-chefes, é produzida com maquinário industrial e tem embalagem à vácuo.
De acordo com a polícia, essa é uma 'assinatura', uma espécie de 'rótulo' do entorpecente vendido pelo PCC, que atua tanto no atacado (ou seja, grandes volumes de droga) quanto no varejo (a facção também é dona de pontos de venda, em suas 'quebradas', possuindo uma rede de franquias do tráfico). Cocaína à vácuo foi apreendida pela Polícia Civil de Taubaté nesta última terça-feira.
Documentos já apreendidos pelas polícias e Ministério Público mostram que o domínio no mercado doi tráfico foi se consolidando ao longo dos anos. Atualmente, no estado de São Paulo, ainda que o traficante não pertença ao grupo, só pode comercializar drogas fornecidas por integrantes do PCC.
Na prática, isso significa que todos os territórios de venda de entorpecentes, as chamadas lojas, são do PCC. Esses pontos, por serem considerados da "Família", são vendidos ou arrendados para criminosos parceiros como uma espécie de franquia, a exemplo do que ocorre em redes de restaurantes fast food --comparação usada por delegados e promotores. Esse domínio limita a concorrência entre os traficantes ligados à facção e afasta "autônomos".
Para o procurador Marcio Sergio Christino, especialista em crime organizado, essa estrutura empresarial do PCC extinguiu a figura do pequeno traficante. Para ele, quem vende drogas nas "biqueiras" é como um funcionário de uma loja de departamentos.
"Dá para afirmar, com toda certeza, que hoje em dia não existem traficantes independentes, não existem pequenos traficantes. São todos empregados de uma empresa chamada PCC", diz o autor do livro "Laços de Sangue", sobre o PCC, publicado pela editora Matrix.
Ainda conforme o procurador, esse monopólio no estado de São Paulo, em especial para a cocaína, começa já na Bolívia, onde o PCC tornou-se o único comprador oficial, após acordo com os produtores locais. "Não é que vão falar: 'você não pode vender [em SP o que comprou na Bolívia]'. Vão dar duas escolhas: ou você vende nos termos deles ou vai para o 'saco'", conta.
IMPÉRIO.
A lógica por trás da violência é a do mundo corporativo. O PCC adota práticas empresarias e criou um Estado paralelo, com regras rígidas, código de conduta e justiça própria. As principais diretrizes estão na ‘Cartilha de Conscientização’, documento criado pelo grupo em 2007, um ano após a série de ataques a autoridades. São normas e condutas para orientar os integrantes e seus familiares.
A existência da cartilha foi revelada pela primeira vez pelo repórter Guilhermo Codazzi, editor-chefe de OVALE. As reportagens feitas em 2007 sobre o documento foram citadas em alguns livros sobre o PCC.
Entre outras coisas, a cartilha pregava a expansão do PCC para todo o Brasil, a luta para que os presos tivessem direito a voto e a importância do monitoramento das autoridades. “Aposte e acredite no aperfeiçoamento e na conscientização para diminuir as perdas nas lutas, para vencer procurem estudar, procurem conhecimento e principalmente procurem aprender essa nova mudança, essa nova era”, diz trecho do documento.
Desde então, a facção lucra milhões com o tráfico de drogas, um dos principais meios econômicos do grupo. Mas não só.
O PCC expandiu seus negócios para aluguel de armamentos, roubo de carga, financiamento de quadrilhas e diversas outras atividades criminosas, além de investimentos em imóveis, carros e outros bens. Estima-se que o PCC fature mais de R$ 5 bilhões por ano.
A facção ampliou seus tentáculos por todo o Brasil e no exterior, sendo o principal grupo criminoso em diversos países da América do Sul. Há alguns anos, o PCC passou a buscar aumentar também a influência política, por meio da cooptação de parlamentares e da formação de seus próprios quadros políticos.