CRÔNICA

The Beatles e um coração de vitrola nos tempos de inteligência artificial

Com tecnologia de ponta, maior banda de rock da história aponta para o futuro e volta às paradas de sucesso após mais de 50 anos. A chave? A voz humana, vulnerável, de Lennon

Por Guilhermo Codazzi | 13/11/2023 | Tempo de leitura: 2 min
Editor-chefe de OVALE

Reprodução

John, George, Paul e Ringo
John, George, Paul e Ringo

Nesta rolagem sem fim, no feed que não fede e nem cheira, no vazio compartilhado das redes sociais, no mergulho raso na imensidão deste oceano com alma de poça d’água, com náufragos aprisionados a ilhas que carregam na palma da própria mão, há quem acorde com o acorde doce que, free as a bird, desafia o tempo e desperta, com nova roupagem, o sonho que não acabou.

O que há lá (menor)? Real love?
Depois do mi menor, vem o sol, com sua luz que nos guia por entre os corredores sinuosos desta colossal biblioteca de orelhas de livro, ensurdecidas pelo grito incendiário da voz de quem é incapaz de ouvir o próprio silêncio. O farol, com o seu feixe de amarelo outonal, leva-nos até Old Dock, o porto de Liverpool, em um submarino amarelo que singra pelas ondas de folhas caídas durante a primavera de Vivaldi, nas quatro estações que nos conectam, agora, aos Fab Four -- The Beatles.

John, Paul, George and Ringo.
Juntos, uma última vez, mais de 50 anos depois do final da banda, graças a uma ajudinha da controversa inteligência artificial.  Now and then foi originalmente gravada por John Lennon, de forma caseira, na intimidade de seu apartamento no edifício Dakota, em Nova York, na década de 70 --   o registro permaneceu incólume até os anos 90, quando Yoko Ono entregou a Paul McCartney uma fita k7, com as músicas inacabadas de seu antigo parceiro.

Guiados pela voz de John, em um triunfo da arte sobre a finitude, Paul, Ringo e George deram vida a duas belas canções -- Real Love e Free as a Bird -- em 1995, sem, porém, finalizarem uma terceira, Now and Then. Havia nela um problema técnico -- a tecnologia da época não conseguia separar a voz de John e o áudio do piano, que estava com baixíssima qualidade. Mas isso mudou.

A inteligência artificial, nos tempos de hoje, separou o canto encantador de Lennon, que pode ser ouvido de forma clara e cristalina 43 anos após a morte do roqueiro. Com a gravação das guitarras de Harrison, morto em 2001, preservada, Paul e Ringo voltaram aos estúdios e, numa parceria entre o passado e o presente, entre quem foi e quem ficou, os Beatles voltaram ao topo das paradas.

Nada de LPs ou CDs. Streaming, redes sociais, Youtube...
Engana-se, porém, prezado leitor, quem pensa que esta crônica é sobre a maior banda de rock da história. Neste tempo em que somos cada vez mais máquina e que a máquina se parece cada vez mais conosco, é a voz tão vulnerável e humana de John, não a IA, que toca fundo como uma agulha de vitrola. É o coração analógico ié-ié-ié-ié.... iééééééééééééé!

Veja e ouça Now and Then:
https://www.youtube.com/watch?v=Opxhh9Oh3rg

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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