IDEIAS

Por que precisamos de juízes?

Por Carolina Nabarro Munhoz Rossi | 12/08/2023 | Tempo de leitura: 3 min

Arquivo Pessoal

Ao optar por viver em sociedade, o ser humano percebeu que precisaria de regras. Regras definidas pelo próprio grupo e válidas para todos, independentemente da aceitação ou não dessas regras porque seu descumprimento colocaria em risco toda a sobrevivência do próprio grupo e, acontecendo, precisaria haver alguém responsável por restabelecer a ordem. Em caso de conflito, alguém precisaria decidir quem estaria com a razão.

Viver em grupo envolve conflitos e a necessidade de alguém para solucionar estes conflitos. Desde que o ser humano percebeu as vantagens de viver em grupo, a figura de alguém que pudesse dirimir estas questões que surgiam por conta dessa convivência tornou-se necessária.

Montesquieu, filósofo francês, em seu Do Espírito das Leis, depois de afirmar que embora seja uma lei natural o desejo dos homens de viver em sociedade, conclui que essa reunião faz surgir um estado de guerra entre eles, o que torna necessário o estabelecimento de leis.

Pois bem. Estabelecidas as regras que vão reger determinada sociedade, não significa que serão cumpridas e, se descumpridas, será necessário que alguém declare isso e aplique essas regras aos casos concretos.

Inicialmente, nas sociedades mais primitivas, essa função era exercida pelo ancião, uma pessoa mais velha e experiente, conhecedora do grupo, dos seus costumes, da sua forma de se organizar e capaz de analisar cada caso considerando esse conhecimento para decidir com imparcialidade e sabedoria.

Surgia aí o primeiro juiz. Por muito tempo, associou-se a figura deste juiz a este homem mais velho e sábio, que tudo e a todos conhecia, e em virtude de sua experiência e saber não só sobre as regras que moviam a sociedade, mas também sobre as pessoas da comunidade, tinha condições de bem decidir e resolver qualquer controvérsia.

Conforme o Estado foi se estruturando, as pessoas foram renunciando a parte de sua liberdade, autonomia e independência, em prol deste Estado. Dele viria a proteção e a defesa de seus direitos, deixando de ser permitida a realização da justiça com as próprias mãos.

A Justiça passou a ser aplicada pelo monarca, alguém que ditava as regras, as aplicava e ainda declarava o direito.

O Estado foi se tornando mais complexo e liderado por alguém que muitas vezes concentrava o poder de ditar e aplicar as regras, o que, com o tempo, mostrou-se muito perigoso, levando a governos autoritários e sem grande apreço pelas liberdades individuais.

A necessidade de separar as funções do criar as leis e declará-las ao caso concreto tornou-se inevitável para uma melhor organização das sociedades modernas e para evitar o despotismo. Montesquieu, na obra já citada, conclui: “Quando em uma só pessoa, ou em um mesmo corpo de Magistratura, o Poder Legislativo está reunido ao Poder Executivo, não pode existir liberdade, pois se poderá temer que o mesmo monarca ou o mesmo Senado criem leis tirânicas para executá-las tiranicamente”.

Podemos concluir, portanto, que, desde que os homens se relacionam em grupos, fez-se necessário um julgador. O nome que se dava a esta figura mudou ao longo do tempo, mas para bem viver, sempre houve a necessidade deste julgador, este terceiro, estranho ao conflito, conhecedor das regras aplicadas ao caso e dos fatos envolvidos e capaz de decidir com sabedoria e de forma justa quem tinha razão.

Esta é a função básica de um juiz.

O juiz, portanto, se tornou necessário a partir do momento em que houve o primeiro conflito.

A regra seria as pessoas viverem bem, sabedoras das regras, que cumpririam sem a necessidade da intervenção deste poder.

A atuação do juiz deveria ser a exceção e não a regra. Termos um juiz aplicando o direito ao caso concreto seria raro, porque as pessoas, sabedoras de seus direitos e deveres, das regras que elas mesmas considerariam justas e tornadas leis pelo Legislativo e aplicadas pelo Executivo, aplicariam elas mesmas o direito às suas vidas, sem a necessidade de um terceiro intervindo em nome do Estado.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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