Grupos radicais de extrema direita, identificados com pautas bolsonaristas, radicalizaram o discurso e já ameaçam a prática de assassinato de ‘esquerdistas’ no Vale do Paraíba. “Se tiver que dar um tiro num ‘esquerdista’ no meio da noite, eu vou dar”, afirmou um radical.
Em áudio, OVALE registrou as ameaças durante uma manifestação convocada via WhatsApp ‘para combater o comunismo e a ditadura’, em frente ao Parque Vicentina Aranha, no centro de São José dos Campos, por volta das 9h do último domingo.
A reportagem foi perseguida, ameaçada e agredida dentro do parque. A ANJ (Associação Nacional de Jornais), por meio de nota, condenou o ataque, que é uma violência contra a liberdade de imprensa e a democracia.
Nos áudios gravados durante a manifestação por OVALE, os radicais planejam atentados à democracia. Em um dos trechos, um dos radicais diz que é capaz até de matar alguém da própria família para combater o ‘comunismo’.“Você quer saber cara? Já falei pro meu pai e pra minha mãe, eu não tenho medo não, dou até um tiro no meu irmão se for preciso”, disse o radical flagrado por OVALE.
Ouça áudios gravados pela reportagem de OVALE https://youtu.be/UfpkIpKG5Gk
‘TIRO NO MEIO DA NOITE’.
Durante a manifestação, uma mulher se aproximou dos radicais e mostrou-lhes um abaixo-assinado para pedir o voto impresso ao Congresso Nacional, pauta defendida pelo ex-presidente e seus apoiadores. Um dos manifestantes declarou que a proposta não daria em nada. Outro retrucou: “Não vai dar nada? Beleza, vamos tentar de novo, você vai desistir?”. Então, a mulher questionou sobre qual seria o método que funcionaria. “Não, não [vou desistir], eu só vou mudar meus meios. Não existe mais meio pacífico. Se tiver que dar um tiro num esquerdista no meio da noite eu vou dar”, disse o radical. Outro participante da conversa, então, completou: “Chama eu”.
A conversa evolui para uma espécie de ‘esboço’ de como a violência seria aplicada. Os manifestantes continuaram a revisar o que chamam de “outros meios” que pretendem praticar. “Se cada um de nós desse um tiro em um [‘esquerdista’], acaba”, disse um bolsonarista. Outro radical, então, perguntou: “Você vai querer aderir?”. E veio a resposta: “Eu tô estudando outras formas de fazer a coisa. Só papelzinho, na verdade o que está acontecendo, nós só tá se expondo, a gente se expôs e os esquerdistas...”. Ao que é cortado por outro membro do grupo radical, que disse: “A esquerda quer isso, é a gente se expor, nosso nome aí”. “Quem são os ratos?”.
ANÁLISE.
Para a mestre e doutora em Antropologia Social, Isabela Kalil, os episódios de violência são sinais da “direita antidemocrática” que ascendeu sob Bolsonaro e que se mantém agora “para além do bolsonarismo”, mas inspirada nele. “Temos um campo de disputa e não é homogêneo. Tem que entender as disputas nesse campo, para análise mais correta”, disse Isabela, que coordena o OED Brasil (Observatório da Extrema Direita), em webinário com a participação de OVALE.
Na tentativa de golpe em 8 de janeiro, segundo ela, viu-se um “recorte geracional de pessoas mais velhas, que viveram período da ditadura e da transição, e a subjetividade está marcada”. “É esse bolsonarismo mais visível que culminou no 8 de janeiro. Mas há camada mais jovem que não aparece, e o perigo está aí”, afirma Isabela.
PÓLVORA.
Episódios como o registrado em São José dos Campos, mesmo que pareçam isolados, repercutem nas redes sociais e aplicativos de mensagens e podem funcionar como fogo em meio à pólvora do radicalismo. “Se o bolsonarismo fosse uma fogueira, a manutenção pode ser feita por qualquer episódio que vire combustível”, disse a antropóloga.
Na avaliação de Isabela, as redes sociais têm um papel ainda mais central no meio bolsonarista: o de dar veracidade a ideias e teorias, mesmo às mais esdrúxulas e conspiratórias.
“Redes têm capacidade de resolver a questão dessa dissonância cognitiva. Quando a realidade fica inexplicável, muda-se a explicação, mudando a realidade. A máquina bolsonarista trabalha nisso.”
POLARIZAÇÃO.
No mesmo webinário, o economista e cientista social Maurício Moura, pesquisador da George Washington University (EUA), avaliou que a polarização entre direita e esquerda está estabelecida no cotidiano dos brasileiros. Ele também vê as redes sociais como protagonista para ampliar a tensão.
“Redes sociais enviam conteúdo que retroalimenta a mesma posição política e há pouco ambiente de discussão consensual. Voto majoritário binário colabora para polarização”, afirmou.
Moura disse que o bolsonarismo está alojado principalmente na camada de maior renda e escolaridade do país, tendo avançado por cidades pequenas e médias. Tal perfil facilita o engajamento a grupos mais violentos.
VIOLÊNCIA.
A violência contra jornalistas bateu recorde no país nos dois últimos anos da gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL): 806 casos em 2021 e 2022, segundo a Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas).
Marcelo Rech, presidente da ANJ (Associação Nacional de Jornais), condenou a violência sofrida pela reportagem de OVALE. “A Associação Nacional de Jornais condena veementemente a agressão contra o repórter do jornal OVALE. Tais violências são inaceitáveis em regimes democráticos e evidenciam apenas a manifestação de posturas autoritárias, intolerantes e violentas. A ANJ espera das autoridades policiais uma atitude firme na identificação dos agressores, bem como a devida punição judicial contra este atentado a um jornalista e à liberdade de imprensa.”
Comentários
4 Comentários
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Carlos Henrique Xavier Endo 17/07/2023Devemos denunciar e processar estas pessoas nefastas, mas temos de nos proteger também. Temos de criar grupos de auto-defesa, porque as polícias são de extrema-direita também.
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ROGERIO APARECIDO PEREIRA DOS SANTOS 17/07/2023Ou a democracia dá um basta nesses extremistas ou teremos um problema crônico. Tratar o Bolsonaro como uma piada durante anos no parlamento foi um erro, como presidente ele deu voz e alimentou um discurso violento e de intolerância.
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Demostenes Sobrinho 16/07/2023São terroristas e bosolides mesmo.
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Demostenes 16/07/2023São terroristas e devem ser tratados assim.