IMPROBIDADE

Agência que teve bens bloqueados junto com Saud é ligada ao deputado estadual Dr. Elton

Aorta, que tem sede em São José, foi criada por esposa de Dr. Elton e por assessor do parlamentar; empresa e prefeito de Taubaté tiveram bens bloqueados até limite de R$ 1,8 milhão

Por Julio Codazzi | 23/05/2023 | Tempo de leitura: 7 min
São José dos Campos | Taubaté

Reprodução

Registro de live feita por Dr. Elton em 2020 para pedir voto para Saud
Registro de live feita por Dr. Elton em 2020 para pedir voto para Saud

A agência de publicidade Aorta Comunicação, que tem sede em São José dos Campos e teve os bens bloqueados junto com o prefeito de Taubaté, José Saud (MDB), tem ligação com o deputado estadual Dr. Elton (PSC), que também é de São José e está no primeiro mandato na Assembleia Legislativa.

Criada em fevereiro de 2019, a Aorta teve como sócios, inicialmente, a médica Regina Lúcia de Assumpção Carvalho, que é esposa de Dr. Elton (que também é médico), e Guilherme Osnan Silva, que atuou como assessor de Dr. Elton tanto na Câmara de São José dos Campos quanto na Assembleia Legislativa.

Regina só deixou a empresa em maio de 2022. Ou seja, ela era sócia da Aorta em julho de 2021, quando a agência foi contratada sem licitação pela Prefeitura de Taubaté, por R$ 1,8 milhão, para a produção de peças relacionadas à vacinação contra a Covid-19 durante seis meses. Para o Ministério Público, o contrato foi irregular. É nessa ação de improbidade administrativa que o Tribunal de Justiça determinou o bloqueio dos bens de Saud e da Aorta, até o limite de R$ 1,8 milhão.

MDB.
Dr. Elton não é citado na ação do MP, mas a Promotoria usa, entre os argumentos da acusação, que a contratação da Aorta foi motivada por "nepotismo político", já que a empresa prestava serviços para o diretório municipal do MDB de São José dos Campos - mesmo partido de Saud.

À época do contrato, Dr. Elton era vereador em São José e ainda estava filiado ao MDB, partido que ele deixou apenas em abril de 2022. Na eleição de 2020, por exemplo, o então vereador chegou a fazer postagens nas redes sociais para pedir voto em Saud, que foi eleito prefeito naquela disputa - em uma das postagens, que foi uma transmissão ao vivo em vídeo, Dr. Elton estava ao lado de Saud.

Tanto nas campanhas de 2020, quando foi eleito vereador, quanto em 2022, para deputado, Dr. Elton contratou os serviços da Aorta - pagou R$ 4,5 mil à empresa em 2020, por "impulsionamento de conteúdos", e R$ 30 mil em 2022, para "eventos de promoção da candidatura".

EX-ASSESSOR.
Guilherme Osnan foi assessor de Dr. Elton na Câmara de São José até agosto de 2021 - deixou o cargo dias após o contrato firmado entre a Prefeitura de Taubaté e a Aorta. Depois, voltou a atuar como assessor do parlamentar esse ano, já na Assembleia Legislativa, mas apenas entre os dias 15 e 19 de março.

No período em que era assessor de Dr. Elton na Câmara, Guilherme também figurou como secretário-adjunto do MDB de São José - ele exerceu a função de agosto de 2019 a agosto de 2021. Na eleição de 2020, o diretório municipal joseense pagou R$ 10 mil à Aorta para a "criação e inclusão de páginas na internet". É esse o contrato citado pelo MP na ação para sustentar a alegação de "nepotismo político" na parceria entre a agência e o governo Saud.

Desde que a esposa de Dr. Elton deixou a empresa, em maio de 2022, Guilherme Osnan é o único sócio da Aorta.

REPERCUSSÃO.
Procurado pela reportagem nessa terça-feira (23), Dr. Elton alegou que "nunca fez parte do quadro de sócios da agência" e que, "portanto, não mantinha qualquer comando nas questões relativas à empresa". O deputado argumentou ainda que não teve influência nem na contratação da Aorta pelo MDB em 2020 e nem na contratação da empresa pela Prefeitura de Taubaté em 2021.

A agência alegou que "Dr. Elton foi cliente da Aorta" e, nesse período, "teve acesso apenas aos trabalhos técnicos da agência, referente à sua conta pessoal, sem qualquer decisão na empresa". Sobre os contratos eleitorais, a Aorta argumentou que realizou "serviços para diversos partidos, não só no âmbito municipal, mas estadual e nacional" tanto em 2020 quanto em 2022, com "todas as prestações de contas" consideradas "regulares e aprovadas pela Justiça Eleitoral".

O governo Saud negou que a proximidade do prefeito com Dr. Elton tenha influenciado a contratação da Aorta sem licitação em 2021. "A empresa foi contratada através de processo administrativo com dispensa de licitação e com aprovação justificada, conforme determina a lei, tendo apresentado, entre as convidadas para a prestação do serviço, o melhor preço e capacidade de execução", alegou a Prefeitura.

BLOQUEIO DOS BENS.
A ação de improbidade administrativa tramita em primeira instância desde abril de 2022. O bloqueio dos bens havia sido negado inicialmente pela Vara da Fazenda Pública de Taubaté, em maio do ano passado. O MP recorreu e a apelação foi aceita pela 1ª Câmara de Direito Público do TJ na semana passada. No recurso em que insistiu no bloqueio dos bens, a Promotoria alegou que duas novidades ocorreram desde que a medida havia sido negada em primeira instância. Uma delas foi que órgãos técnicos do TCE (Tribunal de Contas do Estado) confirmaram a ocorrência de irregularidades no contrato. A outra foi que a empresa Aorta estaria em situação financeira "precária", e que enfrentaria até uma ação judicial pelo não pagamento de aluguel de sua sede.

A apelação foi aceita por unanimidade pela 1ª Câmara de Direito Público do TJ, que é composta por três desembargadores. Na decisão, o desembargador Danilo Panizza, relator do processo no TJ, destacou que seria perigoso não determinar o bloqueio dos bens, já que o contrato teve um valor altíssimo e a Aorta possui precário patrimônio.

Ao fim do processo, o MP pede que Saud seja condenado ao pagamento de uma multa de até 24 vezes seu salário, o que poderia chegar a R$ 446 mil. A Promotoria solicita ainda que a Aorta seja condenada à devolução do valor do contrato, de R$ 1,8 milhão.

PUBLICIDADE.
Em janeiro de 2021, no primeiro mês do governo Saud, a Prefeitura deu início a um processo administrativo interno para abrir uma licitação para contratar uma agência que ficaria responsável pela publicidade institucional – finalizado em maio, o edital previa gasto de R$ 7 milhões a cada 12 meses; o certame acabou vencido posteriormente pela RP Propaganda, de Mogi das Cruzes (SP), que assinou contrato em novembro de 2021.

Paralelo a isso, em março de 2021, entrou em vigor uma lei federal que autorizava "medidas excepcionais" para a contratação de bens e serviços relacionados ao Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19. Dentre essas medidas estava a possibilidade de dispensa de licitação para a contratação de serviços de comunicação social e publicitária.

Em 12 de julho, já com o processo licitatório da publicidade em andamento, a Prefeitura decidiu, com base na lei federal, dar início a um segundo processo de contratação dos serviços de publicidade – nesse caso, com dispensa de licitação e voltado apenas para campanhas relacionadas à pandemia. Esse segundo processo, que contou com a participação de três empresas, resultou na contratação da Aorta, em 27 de julho de 2021, por R$ 1,8 milhão, para um período de seis meses.

DENÚNCIA.
Na ação, o MP aponta supostas irregularidades na contratação da Aorta. Uma delas é que, embora a Prefeitura tenha tratado a contratação como emergencial, citando “aumento substancial do contágio da população do município pelo coronavírus”, a dispensa de licitação ocorreu em período em que o número de casos e de mortes já estava em queda. Outra irregularidade, de acordo com a Promotoria, é que, com base nas duas regras previstas no termo de referência, teria havido empate entre duas agências, mas a Prefeitura se baseou em apenas um dos critérios para definir a vitória da Aorta.

O MP também aponta que, ao contrário do que estabelece a legislação para esse tipo de contratação, “não foi composta subcomissão técnica e nem a comissão permanente de licitação se manifestou no feito, de modo que não havia quem avaliasse a viabilidade das propostas”. A Promotoria afirma que, “mesmo sem possuir competência administrativa, que no caso seria da subcomissão técnica ou da comissão permanente de licitação”, Saud “pessoalmente julgou e definiu a empresa vencedora” da contratação por dispensa de licitação.

O MP cita ainda que a Aorta prestava serviços para o diretório municipal do MDB de São José dos Campos – mesmo partido de Saud – e que a empresa foi desclassificada pela Comissão Permanente de Licitações no processo principal, do contrato de R$ 7 milhões, por não atender todas as exigências do edital.

Receba as notícias mais relevantes de Vale Do Paraíba e região direto no seu WhatsApp
Participe da Comunidade

2 COMENTÁRIOS

A responsabilidade pelos comentários é exclusiva dos respectivos autores. Por isso, os leitores e usuários desse canal encontram-se sujeitos às condições de uso do portal de internet do Portal SAMPI e se comprometem a respeitar o código de Conduta On-line do SAMPI.

  • Toniolo Neto
    24/05/2023
    Saud faz festa com dinheiro público, está há quase 3 anos usando a máquina pública pra bancar seus acolunhados e em benefício próprio, é mais que um atraso é um sabotador, um Zé ninguém na política que não tem noção do cargo mas sempre soube bem como direcionar o dinheiro público
  • Sergio do Prado
    23/05/2023
    E para desespero de todos, zero surpresa.