Esta é uma ode ao texto escrito à mão. Tal qual este, por exemplo. Minhas experiências mais recentes rememoram a magia da infância de quando escrevia à mão. Aliás, tem sido uma jornada de encontro entre mim e a minha criança interior. Recomendo! Escrever à mão. Este hábito quase vintage desde a ascensão dos smartphones e de uma série de aplicativos que prometem mais praticidade no dia a dia.
A caligrafia conta-nos tanto a respeito de quem somos. Da figura vaidosa que puxa um elegante laço na letra “R” ao metódico que prefere escrever em letra de forma de modo que cada caractere seja minimamente homogêneo.
Eu mesma desisti da simetria no abecedário manuscrito. Logo após a terceira linha já observo uma falta de padrão nas letras que, juro!, inserem no texto acabado um padrão próprio. Digamos que a heterogeneidade de meus rabiscos imprimem uma harmonia no todo. Sim, é complexo!
Escrever à mão. É só você e o papel em branco num ato contínuo em que as palavras brotam à medida que você movimenta a ponta da esferográfica na página. Quanta beleza, por exemplo, mora no gesto de quem acabou de aprender a escrever. A emoção de não se perder nas curvas do “s” e de aplicar corretamente o til e o circunflexo, vulgo chapeuzinho.
E o que a escrita nos ensina sobre o erro? Anotar recados e escrever cartas à mão expõem em primeiro plano a nossa própria imperfeição. Fica ali no papel o rasurado, o rabiscado ou até a vã tentativa de cobrir o mal traçado com corretivo. Mesmo quando o instrumento é o lápis, a borracha não oculta por completo o que inicialmente fora escrito. A sombra do grafite aparece como se fosse a prova de um crime.
Errar no papel é cura. A escrita com fim terapêutico é o processo de libertar as palavras que nunca foram ditas. Escrever à mão é se perceber ao mesmo tempo criatura e criador. E como já falaram, no papel cabe tudo! Donos de um pedaço de papel, somos agentes ativos num solo fértil tal qual um agricultor que cuida do seu alqueire.
Quando escrevemos de próprio punho assumimos a complexidade de não sermos perfeitos, seja naquele “o” mais fechado que parece um “i” mas se sabe que não o é pelo contexto do que ali está escrito, seja pelo “t” que ficou aberto demais mas se sabe que não é um “l” pelo traço maroto que lhe corta o corpinho.
É só mesmo no computador com o recurso do Backspace (tecla que deleta o último caractere digitado) que seu escrito estará completamente à salvo. Ninguém sabe quantas vezes eu errei na digitação deste texto – sim, passei a limpo do manuscrito para a tela! Este é um segredo entre mim e o teclado. Para quem me lê, o texto nasceu pronto. Mas, eu simplesmente deletei os erros e retornei a digitar como se jamais houvesse errado. É isso. Acho Acredito que precisamos escrever mais as nossas vidas com a nossa própria caligrafia. De preferência, sem rascunho.