KELMA JUCÁ

De tanto pensar

Por Kelma Jucá | Jornalista
| Tempo de leitura: 2 min
OVALE

Eu pensava outro dia sobre o poder que detemos de pensar sobre a própria existência. À revelia do que dissera Nietzsche – para quem nada é mais nosso do que nossos sonhos –, parece-me que nada é mais nosso do que nossos pensamentos. Somos o que pensamos.

Não que eu discorde completamente do filósofo alemão, mas é que existem sonhos que jamais saem do pensamento e ganham vida fora da nossa mente. Ou melhor, existem devaneios não publicáveis – seja por serem íntimos, seja por serem imorais do nosso atual ponto de vista histórico, seja por serem simplesmente vergonhosos – que não alcançam o patamar de sonhos, mas que são exclusivamente nossos.

“O seu problema é que você pensa demais”, diagnosticou-me um médico não ortodoxo ao examinar as írises de meus olhos e a minha pulsação. Isso me pôs a pensar.

O pensamento é um espaço-tempo em que não cabe ninguém além de você mesmo em plenitude. É quando eu penso que eu posso ser inteiramente eu. No meu mundo particular de ideias não há julgamento, senso crítico ou condenação. Quando penso, posso ser autêntica, genuína e voraz. Nas coordenadas de minha mente, sou rainha e súdita, donzela e meretriz, letrada e perdida.

No conforto do que é mais meu, que são meus pensamentos, passo incólume à tirania alheia que se apresenta com quatro pedras na mão no instante em que apareço com uma ideia contra-hegemônica, diferente. Quando estou comigo mesma, pensando, me acolho e me nutro de minha própria essência.

Pensando, sou fiel a mim mesma. Dentro de meus pensamentos não há mentiras, ironias, indiretas; não que eu as reproduza no meu dia a dia, mas as ouço, as leio, as percebo. Quando estou comigo mesma, me preservo dos outros e, assim, me fortaleço. “A palavra é prata e o silêncio é ouro”, diz um provérbio árabe.

Em meus pensamentos, me preencho de mim. Dentro da minha imaginação, respiro aliviada. Encontro paz e morada. É aqui, “dentro”, que me liberto da rotina extenuante de mais um dia de trabalho tresloucado ou até da realidade delirante de alguns que comigo compartilham o mesmo tempo e a mesma pátria, mas não os mesmos valores.

Quando penso, me entendo como único exemplar de minha espécie. Sinto-me especial. E, de fato, sou ímpar em meu mundo de ideias singulares. Pensando bem... Tudo o que penso é reflexo do que conheço à beira de mim, no “lado de fora”. De tanto pensar, até concluo que a hora em que eu mais evoluo é quando me coloco no mundo e compartilho parte de quem eu sou. Talvez pensar seja só um ensaio para ser humano.

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