EDITORIAL

Pelé, Bolsonaro e Lula

Antes símbolo de união, camisa da Seleção é uma fratura exposta da divisão do país, após Maracanaço e 7 a 1 políticos

19/11/2022 | Tempo de leitura: 3 min

Azul.  Conhecida em todo o mundo como a ‘Amarelinha’,  a camisa da Seleção Brasileira começou a escrever a sua história de conquistas e glórias com outra cor primária, anos e anos atrás, em uma época ainda em preto e branco. Corria o ano de 1958, Copa do Mundo na Suécia.  O Brasil -- que oito anos antes, vestindo camisas brancas e calções azuis, havia sido derrotado pelo Uruguai no Maracanã, por 2 a 1, em uma peleja que levou o país às lágrimas e fundou a preconceituosa tese do ‘complexo de vira-lata’,  expressão inventada pelo tricolor Nelson Rodrigues  (1912-1980) --  estava de volta à decisão do Mundial, e desta vez contra os suecos.
 

O Brasil iria amarelar?

Pelo contrário, quem amarelou foi o time da casa e, por isso, os craques brasileiros se desesperaram. Calma, OVALE explica.


Após o Maracanaço, em 1950, a Seleção deu um cartão vermelho  para o uniforme branco e passou a usar camisas amarelas, para se livrar da ‘zica’. Quando a Suécia foi sorteada para disputar a decisão com o seu uniforme amarelo, o elenco do Brasil logo sentiu que era um mau presságio. 


Psicologicamente, a Seleção já estava perdendo, antes da partida começar. Foi então que Paulo Machado de Carvalho, que hoje dá nome ao Pacaembu e foi chefão da delegação brasileira, teve uma ideia divina -- literalmente.


Ele foi até uma loja e comprou camisas azuis, que foram bordadas com o brasão da CBD no peito e os números nas costas. Aos jogadores, Paulo Machado disse que estava radiante, muito feliz com o sorteio, pois agora a Seleção jogaria com a cor do manto de Nossa Senhora Aparecida.


Com muita fé no pé e na camisa azul, o Brasil derrotou a Suécia -- por 5 a 2, com um show de Pelé e Garrincha -- e, no dia 29 de junho, em pleno no Estádio Råsunda, se sagrou campeão do mundo pela primeira vez. Uma festa que teve a fé no manto da Padroeira, símbolo da união nacional. 


De lá para cá, muita bola rolou, muitos craques surgiram, muitas vitórias foram conquistadas, nós acrescentamos outras quatro estrelas à camisa amarela -- a mais emblemática da história.


É verdade, a camisa também foi o uniforme de derrotas amargas, como o 7 a 1, em casa, para a Alemanha, na semifinal da Copa de 2014, disputada aqui no Brasil.


A amarelinha acompanhou o torcedor ainda em fases dramáticas da história brasileira, quando a democracia travava uma partida duríssima, desleal, sombria e violenta contra a Ditadura.


Em Brasília, após uma espécie de ‘MaracanAço’ ético na ‘Casa do Povo’, com uma pra lá de indigesta sopa de letrinhas políticas -- PT, PSDB, PL, MDB, PP, PSD e outras dezenas de partidos -- em escândalos de corrupção nos governos Lula, Dilma e Temer, a democracia brasileira quase assistiu a um 7 a 1, com a ascensão de Jair Bolsonaro, que flertou reiteradamente com um golpe de Estado. 


Hoje, após anos de uma disputa fratricida, a camisa da Seleção -- a exemplo de outros símbolos do país -- virou uniforme de uma só ideologia. Espera-se que, com a Copa, o Brasil entenda: na democracia, o respeito a todas as cores é a maior das conquistas.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

Receba as notícias mais relevantes de Vale Do Paraíba e região direto no seu WhatsApp
Participe da Comunidade

COMENTÁRIOS

A responsabilidade pelos comentários é exclusiva dos respectivos autores. Por isso, os leitores e usuários desse canal encontram-se sujeitos às condições de uso do portal de internet do Portal SAMPI e se comprometem a respeitar o código de Conduta On-line do SAMPI.