A luta de um grupo de mães de Franca e região para tirar as altas habilidades/superdotação (AH/SD) da invisibilidade resultou na criação de um Projeto de Lei na Câmara Municipal. A proposta, apresentada pelo vereador Bombeiro Walker (PL), institui o "Programa Municipal de Atenção Integral às Pessoas com Superdotação" e a campanha de conscientização "10 de Agosto - Dia da Superdotação".
A mobilização, que hoje une cerca de 25 famílias, nasceu da dificuldade diária de mães que não encontravam amparo ou compreensão para os desafios de seus filhos. Os relatos descrevem crianças com desenvolvimento intelectual precoce, mas que sofrem com questões sociais, emocionais e sensoriais severas.
'Não é gênio, é desafio'
Os depoimentos das mães revelam que a superdotação está longe do estereótipo do "gênio" de cinema. Edna, mãe de João Eduardo, de 12 anos, explica o que é a "assincronia": o cognitivo da criança está muito acima da idade, mas o emocional está compatível ou até abaixo.
A busca pelo diagnóstico, segundo ela, não foi pela inteligência, mas pelas "dificuldades de lidar com o filho", que incluíam um enorme desgaste para fazer lição de casa. "Eu pensava que o profissional ia falar pra mim ou ele é superdotado ou ele é autista, de verdade", relatou.
Os relatos sobre os filhos
Davi, 12 anos (Pedregulho): Aline, mãe de Davi, relata que ele foi diagnosticado com AH/SD nas áreas acadêmica, intelectual, criativa e de liderança. Com 1 ano e meio, falava frases complexas; aos 3, já falava inglês e aprendeu a ler sozinho. Apesar de amar xadrez e sonhar com engenharia genética, "não gosta de atividades repetitivas, tradicionais e às vezes se recusa a ir a escola".
Raul, 6 anos (Franca): Kênia, mãe de Raul, descreve um desenvolvimento físico precoce (firmou o pescoço horas após nascer, ficou de pé no balde com 2 meses, andou com 10 meses), mas com atraso na fala. Os maiores desafios são o transtorno sensorial e a seletividade alimentar. "Tem uma alimentação muito restrita: macarrão apenas de um modelo, de uma marca específica, não mistura nada". Raul não gosta de som alto, sente cheiros "a quilômetros", tem olhos sensíveis à luz e "não aceita beijo em nenhuma parte do corpo". Kênia resume: "Ouvi uma frase que dizia que a tradução de Altas Habilidades deveria ser Altas Sensibilidades e é isso. Tudo é muito intenso". Nos estudos, Raul se destaca em matemática, conseguindo realizar cálculos avançados em relação à sua idade.
Bullying e falta de CID
Um dos problemas mais graves relatados é o bullying. O filho de Edna sofreu com "bullying de uma forma muito velada, debaixo do pano", a ponto de pedir para mudar de escola. Outra mãe do grupo tem um filho de 16 anos afastado da escola há um mês, "especificamente por conta do bullying".
A maior barreira institucional, segundo Edna, é a falta de compreensão diagnóstica. "É um ponto muito importante: o superdotado não é uma doença, não é patologia, não é um transtorno. Então ele não tem CID". Isso gera um impasse, pois, segundo ela, escolas e até a Diretoria de Ensino cobram um CID para oferecer suporte, o que não existe. Além disso, faltam na cidade profissionais especialistas no tema.
Com o tema ganhando visibilidade, as mães esperam que Franca possa se tornar um exemplo para outras cidades, tirando o tema da invisibilidade.
O Projeto de Lei
O PL, de 30 de junho de 2025, visa preencher a lacuna de políticas públicas consistentes. A justificativa do projeto aponta que pessoas com superdotação "sofrem com a invisibilidade, falta de acolhimento, ausência de políticas públicas direcionadas, preconceitos e barreiras no processo de inclusão".
O programa proposto tem o objetivo de fomentar a identificação precoce, garantir atendimento educacional especializado, promover a capacitação permanente de profissionais de educação, saúde e assistência social, apoiar as famílias e combater estigmas.
"Estou montando como se fosse um dossiê psra apresentar a importância da gente debater esse tema e ter os profissionais nas escolas", disse o vereador.
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Comentários
1 Comentários
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Neidelly Faustino 17/11/2025Em ano de eleições, criam projetos que deveriam ter sido aprovado a muitos anos atrás! Lamentável! Enquanto isso.... O FEMINICIDIO CONTINUA AUMENTANDO NO PAÍS!