
No Brasil, cerca de 2 mil livros são lançados mensalmente pelas editoras nacionais; e no âmbito do continente norte-americano, o país é responsável por 50% da produção. Não é pouca coisa: são 24 mil livros por ano, chegando a leitores de todas as regiões.
Tecnicamente compreende-se por livro um produto impresso ou eletrônico contendo no mínimo 50 páginas, publicado por editora pública ou privada. Pela Lei do Livro, de 30 de outubro de 2003, deve obrigatoriamente conter ISBN, ISSN, que poucos leigos sabem o que significa. O ISBN é como um RG exclusivo para cada livro, identificando-o de forma específica. O ISSN, por sua vez, abrange publicações seriadas, como revistas e jornais.
Os algarismos revelam que há muitos brasileiros publicando livros de todos os tipos. A maioria dos autores conhece as peripécias que precedem o lançamento de um título, o preço de se debruçar sobre o papel ou a tela. No caso das obras de ficção, a inspiração é só o primeiro estímulo, porque depois dela vem o trabalho de recorrer à memória, administrar emoções, criar personagens e enredos, organizar a narrativa e buscar verossimilhança. Quando se trata de livro que contempla a poesia, torna-se desafiador eleger no rol de textos produzidos ao longo do tempo os que ofereçam coesão e unidade, garantindo um ponto de vista singular sobre o modo de sentir a vida.
Assim, se lançar um livro é custoso, imagine-se dois ao mesmo tempo. E é exatamente isso que está fazendo o francano Roberto Nunes Rocha, autor do romance ‘Fio de Barba’, que aqui comentamos há alguns meses. No próximo agosto, em sessão de autógrafos marcada para o dia 11 no auditório da OAB, o autor vai apresentar ao público seus novos livros. Um de contos, cujo título é ‘Contos Sóbrios’; outro de crônicas e poemas, chamado ‘Fogo no Peito’.
Três gêneros diferentes espelham o mundo tal como o vê o escritor. Nos contos, a estrutura narrativa corresponde ao adjetivo do título. Ela se mantém na singeleza de apresentar um enredo sem apelos mirabolantes, com linha do tempo respeitando a cronologia e personagens recortados na maioria das vezes do contexto rural, onde a natureza também desempenha seu papel através de histórias onde animais e plantas têm seu lugar.
O tom de crítica social aparece de forma velada em ‘O caboclo e a lei’; algum romantismo pontua ‘O Busão’; a personificação como figura de linguagem singulariza ‘O carro e a moto’. O final feliz destes e de todos os outros relatos expõe a cosmovisão otimista do autor expressa na sua ‘Apresentação’: ‘A variedade imensurável de situações com que nos defrontamos expõe a riqueza da vida, a satisfação alegre de termos vencido algo que, à primeira vista, era impossível (...) Pretendo, com este pequeno trabalho, que o leitor se sinta agraciado pelo deslinde favorável de cada um destes contos, pelo que me sentirei honrado’.
No prefácio conciso e certeiro de ‘Contos Sóbrios’, Luiz Cruz de Oliveira usa metáfora bela para aproximar dois ofícios, o de escritor e o de retratista. Depois de lembrar este último, que veio se apagando com o avanço da tecnologia, ele registra: ‘Fotógrafos, hoje, após invenção de máquinas modernas e possantes, captam, em segundos, imagens com perfeição espantosa. O literato, porém, não dispõe do beneplácito dos avanços científicos. Seus instrumentos continuam palavras e ainda tinta e papel.’
Essa característica pictórica, ou plástica, que se define no dom de compor de forma sensorial paisagens e personagens, reaparece em ‘Fogo no Peito’, cujas crônicas tematizam assuntos atuais como a violência contra a mulher, a pena de morte no trânsito, a transformação ocorrida nas cerimônias de velório no pós- Covid. Um clima de espiritualidade banha ‘A mensagem do Natal’ e ‘A Viagem’. Fatos e pessoas do cotidiano francano são reconhecíveis em ‘Coragem e Medo’, ‘Os dois Hélios’, ‘Quermesse’. Um resgate de cena bíblica atualiza-se em ‘Honrar a palavra’.
Sobre os poemas que fazem parte deste segundo livro, Ibrahim Haddad se expressa no prefácio de forma interessante ao avaliar que ‘algumas vezes a linguagem, o estilo e os temas do Autor remetem-nos à literatura romana, cujos autores tinham suas obras voltadas ao campo: vegetais, animais vacum, equinos, caprinos e aos seus pastores; ainda voltados ao preparo da terra; à colheita das frutas e do trigo (...)’ E se mostra crítico, talvez por não apreciar os versos brancos que desde o Modernismo dominam a cena poética nos idiomas do Ocidente, ao considerar que, no que tange à forma, os poemas ‘estão carentes de métrica; isto é, os versos flutuam sem igual número de sílabas’. Controvérsias à parte, seriam mesmo esperáveis rimas e métricas dentro da tradição das quadrinhas brasileiras, de grande aceitação popular, sobretudo na tradução do universo rural. Mas isso é de menos.
Porque há que se louvar sempre quando livros como estes de Roberto Nunes Rocha são publicados. Porque a vida pulsa, os acontecimentos não cessam, o coletivo se mostra, o tempo transforma as comunidades, as pessoas protagonizam histórias que merecem ser contadas, sob risco de, tal não ocorrendo, serem esquecidas, apagadas. Publicados, os relatos (e no caso também os poemas) mostram realidades e seres que talvez não tivéssemos observado e, ao fazê-lo nas páginas de um livro, somos convidados também a nos ver e nos considerar de forma até então impensada.
‘Contos sóbrios’ e ‘Fogo no Peito’ estão entre os dois mil novos livros a serem lançados no próximo mês no Brasil. Ambos saem pela Ribeirão Gráfica Editora, responsável pela publicação de centenas de autores francanos e da região que nas últimas décadas puderam concretizar o sonho de ter em mãos seus próprios livros. A revisão dos originais leva a assinatura de Regina Bastianini; as capas e a diagramação, de Fernanda Oliveira Ribeiro Andrade.
Sonia Machiavelli é professora, jornalista, escritora; membro da Academia Francana de Letras.
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