DIA DAS MÃES

'Fui mãe e pai': conheça Dona Olímpia, faxineira e mãe heroína

Por Giovanna Attili | da Redação
| Tempo de leitura: 10 min
Arquivo pessoal
Olímpia e seus sete filhos, em seu aniversário de 80 anos
Olímpia e seus sete filhos, em seu aniversário de 80 anos

O Dia das Mães, celebrado neste domingo, 11, é uma data marcante, é o dia em que se pode lembrar e comemorar a vida e os feitos de uma pessoa muito especial. Em Franca, muitas histórias podem ser contadas sobre exemplos de mães; uma delas é a de Olímpia Maria de Sousa, de 81 anos, mãe de oito filhos e que, desde nova, teve de criá-los sozinha.

O início da história de Olímpia como mãe 

Olímpia teve seu primeiro filho, segundo ela, muito nova, por volta dos 20 anos. Conta que essa experiência, apesar de ser uma felicidade, trazia muito medo, pois nunca tivera condições para se manter e agora teria que manter seu filho.

“Foi um motivo de alegria, mas ao mesmo tempo de medo, porque eu não sabia. Era muito nova, tinha 20 anos. Por um lado, estava feliz, mas por outro, muito pensativa, porque sabia das dificuldades que enfrentaria”, contou.

Nascida em Itiúba, na Bahia, em 17 de dezembro de 1943, Olímpia nunca teve muitas condições. Sequer conseguiu terminar os estudos, fazendo apenas até a quinta série, pois, desde nova, a vida lhe exigia maior responsabilidade para ajudar a família; a chegada de um filho, então, a assustou.

Por conta do trabalho, o filho acabou sendo criado pela mãe. Logo depois, ela se separou do marido e conta o quanto sofreu por não poder mais ter seu menino por perto.

“Foi uma vida muito difícil para mim, porque aí me separei do pai do meu primeiro filho. A batalha foi grande; o menino foi criado por minha mãe, não por mim, e isso foi um sofrimento. Porque fiquei com esse trauma de não ter criado meu filho”, relatou.

O segundo casamento de Olímpia 

Em seu segundo casamento, com João Moura, Olímpia teve cinco filhos: Eduardo, Elenilson, Erinaldo, Egnaldo e Eliane, do mais velho ao mais novo. Além desses, tinha um filho, Edimilson, e outro filho, Ederaldo.

Dos cinco filhos, dois são nascidos na Bahia: Eduardo e Eliane. Os outros três nasceram em Minas Gerais, numa cidade chamada Morada Nova, onde ela passou um tempo da vida com o marido antes de voltar para Itiúba. Infelizmente, pouco tempo após o seu retorno, o marido morreu, deixando-a com os filhos para criar.

“Ele faleceu e eu fiquei com todos os pequenos. Aí entra a fase em que fiquei sem ter como viver, porque não tinha nada, não tinha casa. Ele não me deixou nada; eu não tinha nem como alimentar os filhos. Tinha o mais velho com 11 anos, a mais nova com 2 anos”, explica.

A vinda a São Paulo em busca de uma vida melhor

Em busca de melhores condições de vida, Olímpia embarcou rumo a São Paulo para trabalhar como faxineira. Junto consigo, trouxe sua filha caçula, de apenas 2 anos. Seus outros filhos foram deixados com parentes e amigos de confiança. Após trabalhar e conseguir juntar dinheiro, voltou à Bahia e buscou mais três de seus filhos: Ederaldo, Eduardo e Erinaldo. Elenilson e Egnaldo ficaram lá por mais dois anos.

O sofrimento dos filhos mais velhos

Infelizmente, Olímpia não esperava que seus filhos sofressem tanto. Não esperava que as pessoas de confiança com quem havia deixado seus filhos os maltratassem.

Ederaldo fugiu da casa em que havia ficado após as dificuldades enfrentadas e passou a viver na rua. Curiosamente, pessoas que conheceu na rua acolheram-no melhor do que as pessoas que deveriam cuidar dele.

Já Eduardo, que ficou com uma família de então amigos de Olímpia, foi tratado como escravo, chegando a ser chicoteado para cumprir ordens. Não tinha roupas, exceto a que vestia, e sua refeição se resumia a uma lata com farinha e um pedaço de carne.

Seu irmão mais velho, Ederaldo, às vezes vinha visitá-lo. Juntos, dividiam o pouco que tinham — um pouco de farinha e carne, que era a única refeição do dia. Mesmo sem ter nada, Ederaldo partilhava o que havia, e assim os dois iam levando a vida.

Em São Paulo, Olímpia tentava juntar dinheiro para buscar os filhos, trabalhando numa fábrica e, ao mesmo tempo, como faxineira. Sua rotina se estendia de domingo a domingo, em diversos lugares. Um dia, recebeu uma carta dizendo que deveria buscar seus filhos; caso contrário, teria que buscar seus corpos.

“Cheguei lá para buscá-lo; um estava doente, à beira da morte. O outro andava pelas estradas porque, onde estava, apanhava muito; então saía, dormia até nos matos, pedindo comida nas casas”, relata.

A criação dos filhos em São Paulo 

Ao chegar a uma nova cidade, a vida mudou. Uma mulher sozinha criava seus seis filhos e sabia que mais um estava a caminho: Elaine.

Os meninos, vindos do Nordeste brasileiro, tiveram dificuldades para se adaptar à capital paulista, visto que foram vítimas de muita discriminação e preconceito. Sem a presença do pai, Olímpia saía de casa de manhã cedo para trabalhar e voltava à noite. Por isso, muitas vezes, não podia estar presente o tempo todo para seus filhos, e os menores acabaram passando por muitas situações em que eram humilhados e diminuídos.

“Nós tivemos dificuldade em tudo, porque eles eram nordestinos e as pessoas não os aceitavam bem. Como eles não tinham pai, eu tinha que sair de manhã e só voltava à noite. Eles passaram por muita humilhação”, afirma Olímpia.

Segundo o relato da mulher, as pessoas na cidade grande não chamavam seus filhos pelo nome; eram chamados apenas de 'baianos'. Ela também relata que tudo de errado que acontecia no bairro onde moravam era atribuído aos garotos, que eram chamados de "trombadinhas", termo informal usado para se referir a jovens, geralmente em grupos, que cometem pequenos delitos.

“Eles não tinham nome, o nome deles era ‘baianos’, sendo que cada um tinha seu próprio nome. Queriam desmoralizá-los. Eles passaram por muita humilhação — a cada dia, era uma coisa diferente, pediam ajuda a muitas pessoas (...) tudo que se fazia de errado na rua, mesmo que estivessem com outras pessoas, a culpa sempre recaía sobre eles. Chamavam meus filhos de trombadinhas", contou.

Durante muitos anos, a vida seguiu assim para a família, mas sem nunca desistirem. Quando os filhos atingiram a maioridade, a vida passou a ser menos complicada. Cada um buscou seu emprego, pois sabiam da dificuldade da mãe; a partir daí, tudo finalmente mudou. Olímpia passou a dar atenção às necessidades domésticas, enquanto os filhos buscavam o sustento e o trabalho nas ruas da capital paulista.

“Toda essa batalha eu passei durante muitos anos, até que eles atingiram a maioridade. Chegava do trabalho, tinha que preparar a roupa da escola para eles, fazer comida, lavar roupa à noite e secá-la no varal. Foi tudo uma luta, uma luta muito grande e algo muito difícil, mas eu consegui”, afirma.

Como passou a ser sua vida após o crescimento dos filhos?

Olímpia conta que, após os filhos crescerem, sua preocupação comum de mãe ainda existia em relação ao bem-estar deles, mas não a afligia tanto. Já que, depois de todo o sofrimento, os meninos aprenderam a se defender e passaram a defender a mãe, que já passava grande parte do dia em casa cuidando das tarefas.

Eduardo, que começou a trabalhar aos 15 anos, quase perdeu a mão trabalhando com máquinas de corte, algo que abalou profundamente sua mãe.

“Foi uma coisa muito triste para mim, porque ele quase perdeu a mão. Ele só tinha 15 anos e isso aí foi uma parte bem preocupante", afirmou.

“Eu ensinava muito. Sempre conversava com eles sobre o modo de agir, de se darem respeito e de saberem como entrar em lugares. Eu ensinei muito isso; foi algo que aprenderam comigo. E eles começaram a se defender; me defendiam em muitas coisas”, acrescentou.

A mulher comemora que, na vida adulta, seus filhos foram muito bem aceitos na sociedade. As pessoas finalmente passaram a vê-los por quem eles são, e não pelos preconceitos e discriminações existentes.

“O pessoal aprendeu a gostar deles. Que não era aquilo que eles pensavam que iria ser. Como todo mundo que achava e dizia que eles seriam 'trombadinhas'. E não foi nada disso. Eles começaram a procurar trabalho cedo, todos com muita honestidade e respeito. Foram educados por uma mãe. Eu fui a mãe, fui o pai. E hoje eu só agradeço a Deus, porque hoje todos eles são pessoas honestas, trabalhadoras, cumprindo seus deveres, são pais de família. E hoje eu só tenho a agradecer a Deus”, confessou.

Os ensinamentos passados de geração em geração 

Muitos dos ensinamentos de Olímpia foram transmitidos aos filhos antes mesmo de ela aprender por si mesma. Hoje, esses valores continuam a ser passados de geração em geração — dos filhos aos netos, dos netos aos bisnetos — e seguirão adiante. São lições sobre como agir, o que é certo ou errado, e como conquistar as coisas com honestidade e esforço. Tudo isso permanece vivo na família de Olímpia.

“Fui criada sem pai, com pessoas que conheci desde pequena, além de minha mãe. Muito jovem, fui trabalhar na capital e tinha minha irmã mais velha, que sempre me instruiu muito. Muitas coisas aprendi com ela, e o que aprendi com ela, passei para meus filhos."

“Eu os ensinava todos os dias em que saía de casa. Lia o ‘beabá’ para eles. Eu dizia: ‘Vocês têm que ser assim, agir assim. Nada que não nos pertença nos serve. Podemos ser pobres, mas temos que ter palavra e ser honestos.’ Ensinava direitinho como deviam fazer. E nisso, eles foram me ouvindo”, completou.

A vinda a Franca

Olímpia tinha enteados, filhos do seu segundo marido, e pôde conviver e cuidar de alguns deles como se fossem seus. Foi por meio desses laços familiares que a mudança para Franca aconteceu. O primeiro filho chegou à cidade, se casou e formou sua família. Aos poucos, os outros filhos também decidiram seguir o mesmo caminho. Em 2003, Olímpia se mudou para Franca, onde viveu por mais de 20 anos.

“Aí era tudo de bom, era felicidade, porque eu ficava olhando e pensava: ‘Como eu consegui?’. Depois de tanto sofrimento, tanta humilhação e tudo, eu vejo meus filhos todos criados, reunidos, casados, com seus filhos, meus netos, todos reunidos; para mim era motivo de muita alegria e agradecimento.”

“Todo mundo se admirava: “Como criei sete filhos sem pai numa cidade como São Paulo? Tudo isso, eu digo que foi por Deus, porque, se não fosse Deus na minha vida, eu não teria conseguido”, contou.

A vida nos dias de hoje 

Nos dias de hoje, Olímpia conta com sete filhos, 14 netos e três bisnetos, e pode-se dizer que teve a oportunidade de ser mãe dessas três gerações. Vários de seus netos foram criados com ela ou, por muito tempo, em sua presença. São eles: Bruna, Daniela, Tamires, Beatriz, Guilherme, Giovanna, Isabela, Thiago, Rodrigo, Davy, Ana Júlia, Matheus, Daniel e Gabriel. Todos tendo como exemplo a história de luta e superação da avó, que foi refletida na criação dos pais, implementada na criação dos filhos e repassada ao futuro.

“É uma sensação de dever cumprido. Sinto muita alegria por tudo o que passei na juventude; tenho tudo o que posso ter, tudo o que preciso para uma pessoa da minha idade. Tenho meu canto para morar, tudo o que preciso. Sou uma pessoa feliz, muito feliz. Tudo o que fiz valeu muito a pena; tudo o que passei valeu a pena”, confessou.

Uma lição para outras mães

Como maior lição para outras mães, Olímpia procura incentivar sempre o cuidado com os filhos. Ela recorda que teve de deixar um filho quando mais nova e, por isso, cita que nunca se deve desistir de um filho, por maiores que sejam as dificuldades.

“A mãe, em primeiro lugar, precisa ter amor ao filho. Esse amor filial não pode ser deixado de lado por nenhum motivo. Ser mãe é amar. Não se deve abandonar o filho por nada na vida. Deve-se criá-lo com amor, ensiná-lo o caminho a seguir, sem deixar que seja influenciado por outras pessoas. Dá trabalho? Dá! Mas é uma benção de Deus; nunca desista de seu filho, concluiu.

Aos 81 anos, Olímpia continua sendo um exemplo de superação. Mesmo sem morar fixamente em Franca — já que costuma passar temporadas com cada um de seus filhos, em diferentes cidades —, alguns deles vivem na cidade e se tornaram pessoas conhecidas e admiradas. Suas trajetórias refletem os valores e ensinamentos que receberam da mãe.

Um Feliz Dia das Mães a todas as mães que, assim como Olímpia, lutam todos os dias para que seus filhos possam ter um futuro admirável e de sucesso.

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Comentários

2 Comentários

  • Eliane Aparecida Sousa de Oliveira 16/05/2025
    Essa é a minha mãe, dona Olímpia! Te amo ??
  • ira 12/05/2025
    que linda historia, digna de divulgaçao,.parabens a sra e todos os filhos,