
Imagine viver em um mundo onde a realidade se dissolve pouco a pouco. Você não lembra o nome dos seus filhos, se alimentou há pouco tempo ou se já tomou os remédios do dia. Aos poucos, perde a capacidade de tomar decisões simples, de se reconhecer no espelho e, por fim, até mesmo de entender que está vivo. Essa é a dolorosa realidade de milhões de pessoas ao redor do mundo que convivem com a Doença de Alzheimer.
Recentemente, a tragédia envolvendo o renomado ator Gene Hackman trouxe à tona a brutalidade dessa doença. Ele e sua esposa, Betsy Arakawa, foram encontrados mortos em sua casa em Santa Fé, no Novo México, em fevereiro de 2025. Mas o que choca não é apenas a morte do casal, e sim a forma como ela aconteceu.
A história de Gene Hackman: quando a memória se torna o maior inimigo
Gene Hackman, vencedor de dois Oscars, sofria de Alzheimer avançado, uma doença que compromete progressivamente a memória, a cognição e a autonomia do paciente. Sua esposa, Betsy, faleceu dias antes devido a uma doença rara transmitida por roedores, chamada síndrome pulmonar por hantavírus. Hackman, em sua condição debilitada, aparentemente não percebeu a morte da esposa e permaneceu sozinho na residência, sem buscar ajuda, até também falecer uma semana depois.
O isolamento e a vulnerabilidade de Hackman escancaram uma dura realidade: o Alzheimer não apenas rouba as memórias, mas pode custar a vida de uma pessoa se não houver suporte e assistência adequados. Esse caso trágico nos faz refletir sobre quantos idosos vivem em condições similares, sem o amparo necessário.
E no Brasil? Quais são os direitos de um paciente com Alzheimer? Como garantir que ele tenha qualidade de vida e dignidade? Se você ou alguém próximo enfrenta essa batalha silenciosa, é fundamental conhecer os benefícios previdenciários, tributários e o direito à saúde garantido pela Justiça.
Direitos previdenciários para pacientes com alzheimer no Brasil
1. Isenção de Carência no INSS
- Auxílio-doença: pago ao segurado que ainda trabalha, mas fica temporariamente incapacitado.
- Aposentadoria por invalidez: concedida quando o segurado não pode mais exercer qualquer atividade laboral devido à doença.
Atenção! Se a pessoa já era portadora da doença antes de começar a contribuir ou retomou os pagamentos já doente, de um modo geral, não terá direito aos benefícios. A única exceção é se houver agravamento da condição ou surgirem novas doenças incapacitantes.
2. Acréscimo de 25% na Aposentadoria
- Pode ser solicitado a qualquer tempo.
- Vale mesmo que a aposentadoria já tenha sido concedida há anos e até por outro motivo. Exemplo: O segurado aposentou-se por invalidez por possuir problemas de coluna e, anos mais tarde, descobriu-se um Alzheimer.
- Gera direito a valores retroativos caso o paciente já necessitasse de auxílio se terceiros antes da solicitação, pode fazer jus ao recebimento dos respectivos valores desde o início, limitada aos últimos 5 anos.
3. Isenção do Imposto de Renda
- Laudos médicos que comprovem a doença
- Exames que atestem a evolução da condição
- Relatórios médicos detalhados sobre a incapacidade
Direito à saúde: o que fazer quando o governo não cumpre seu papel?
Um direito fundamental garantido pela Constituição Federal de 1988 é o direito à saúde, o que significa que o Estado tem a obrigação de fornecer tudo o que for necessário para o tratamento do paciente. No caso do Alzheimer, isso inclui:
- Medicamentos de alto custo
- Exames, consultas especializadas e internações
- Home care (internação domiciliar, inclusive com o fornecimento de cuidador, enfermeiro, nutricionista etc), se houver necessidade comprovada.
No entanto, muitas vezes o governo nega o fornecimento desses itens, deixando o paciente e sua família desamparados. Nesses casos, é possível recorrer à Justiça através de uma Ação de Obrigação de Fazer.
Como funciona a ação de obrigação de fazer?
Essa ação judicial tem o objetivo de obrigar o Estado ou o plano de saúde a fornecer tudo o que for necessário para o tratamento do paciente. Para isso, é essencial apresentar:
- Laudos médicos detalhados que comprovem a necessidade dos tratamentos, medicamentos ou home care.
- Pedidos formais feitos ao SUS ou ao plano de saúde, e suas respectivas negativas
- Orçamentos de fornecedores particulares, se houver recusa da rede pública ou privada
Se o caso for urgente, é possível solicitar uma tutela antecipada, o que pode garantir o fornecimento imediato do tratamento enquanto o processo ainda está em andamento.
Isenção de tributos para melhor qualidade de vida
Além dos benefícios previdenciários e do direito à saúde, existem isenções tributárias para facilitar a vida dos pacientes e seus cuidadores.
1. Isenção de IPVA
- Essa isenção varia conforme o estado, então é importante consultar as regras locais.
2. Isenção de Impostos na Compra de Veículos
Atenção! Esse direito também exige documentação médica detalhada e pode variar conforme a legislação estadual.
A lição da história de gene hackman: não espere a situação piorar
O caso de Gene Hackman é um alerta sobre a importância do suporte adequado para pacientes com Alzheimer. A ausência de um cuidador, a falta de acompanhamento médico e a demora na busca por ajuda podem custar vidas.
No Brasil, muitas pessoas deixam de buscar seus direitos por desconhecimento ou burocracia. Mas esses benefícios existem para garantir dignidade, conforto e segurança aos pacientes e suas famílias.
O que fazer agora?
- Se você tem um familiar com Alzheimer, certifique-se de que ele esteja recebendo todos os benefícios a que tem direito.
- Se você é aposentado e foi diagnosticado com a doença, busque a isenção do Imposto de Renda e revisão da aposentadoria.
- Se precisa de medicamentos, exames ou home care e houve recusa do SUS ou do plano de saúde, entre com uma Ação de Obrigação de Fazer para garantir o tratamento.
- Se precisar de apoio jurídico, consulte um advogado especialista de sua confiança.
O Alzheimer pode apagar lembranças, mas não pode apagar direitos. A informação é a chave para garantir dignidade, justiça e um futuro melhor para quem você ama.
Tiago Faggioni Bachur é advogado, especialista e professor de direito previdenciário e autor de obras jurídicas.
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Comentários
1 Comentários
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Luiz Gonzaga Ferreira 6 horas atrásMuito esclarecedor , dr. Tiago, as pessoas muitas vezes não tem esse conhecimento. Parabéns