OPINIÃO

Vai ou não ter pente fino no INSS? Saiba quais os riscos para quem já recebe benefício

Vai ou não ter pente fino no INSS? Quais os riscos para quem recebe benefício e o que fazer para se proteger? Leia o artigo de Tiago Faggioni Bachur.

Por Tiago Faggioni Bachur | 24/03/2024 | Tempo de leitura: 10 min
Especial para o GCN/Sampi Franca

No último dia 06/03, em entrevista concedida aos órgãos de imprensa, Alessandro Stefanutto, presidente do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), disse que a Previdência Social vai iniciar um “novo pente-fino” e, em suas falas, assegurou que o pente-fino será “cirúrgico”, convocando apenas os beneficiários que mostrem provas de irregularidades a fim de evitar aglomeração nas agências do INSS. Ressaltou que o pente fino começará pelo auxílio-doença e depois passará para o Seguro Defeso e o BPC/LOAS (Benefício de Prestação Continuada da Lei Orgânica da Assistência Social), utilizando bancos de dados de estados e prefeituras para verificar os referidos benefícios. De acordo com a entrevista, o governo pretende cortar R$ 10 bilhões dos gastos na Previdência.

Curiosamente, nas redes sociais oficiais do INSS, no dia 09/03/2024, foi publicado que não há previsão de nenhum pente-fino do INSS.

Afinal de contas, vai ou não ter pente-fino do INSS? Se tiver, como o cidadão deverá se preparar para isso? Quais os maiores riscos de quem recebe do INSS?

1. Pente-fino perpétuo
Independentemente de ter ou não pente-fino, todo mundo que recebe algum tipo de benefício do INSS deve ficar atento. Isso porque, na lei existe a determinação que o INSS tem o PODER-DEVER de, a qualquer tempo, proceder a verificação dos benefícios que ele paga. Isso vale, inclusive, para os benefícios que foram concedidos pela Justiça.

Em outras palavras, o INSS tem a obrigação de tempos em tempos checar se aquele que está recebendo algum benefício do INSS realmente cumpre os requisitos para isso.

No tocante a benefícios por incapacidade, como o auxílio-doença e a aposentadoria por invalidez, há situações em que o segurado pode ter recuperado a sua saúde e não existir motivos para a manutenção do respectivo benefício.

É preciso ter em mente que a medicina avança. Cada vez mais, pesquisas inovadoras (como a do genoma humano, célula tronco e, agora, com o uso de inteligência artificial, por exemplo), doenças que não tinham tratamento ou cura, poderão ter. Isso quer dizer que se alguém se aposentou por invalidez porque tinha determinada doença e, caso for descoberta a cura, levando o indivíduo a ter uma vida normal, não haverá mais motivos para que ele permaneça aposentado por invalidez. Nesse exemplo, se ele passar pela perícia, terá o benefício cessado.

Raciocínio semelhante é aplicado ao BPC/LOAS, no caso de o indivíduo receber o referido benefício assistencial em razão de possuir algum problema de saúde. No entanto, o BPC/LOAS possui outro requisito: o da renda familiar. Para receber o benefício assistencial do BPC/LOAS, a renda familiar deve ser considerada baixa. Assim, por exemplo, se os membros da família estavam desempregados, por exemplo, e algum ou alguns deles arrumarem emprego e a renda for considerável, o benefício poderá ser cessado ao ser revisto. Outro exemplo, é quando o beneficiário do BPC/LOAS mora sozinho e resolve ir morar com alguém ou se casa. Se a pessoa que ele for morar ou se casar tiver uma renda que não seja baixa, o benefício poderá ser cessado. Vale lembrar, todavia, que quem recebe o BPC/LOAS deve renovar o Cadastro Único (CadÚnico) a cada 2 anos.

Já em relação ao seguro defeso, que é um benefício pago ao pescador artesanal, que fica proibido de exercer a atividade pesqueira durante o período de defeso de alguma espécie (como, por exemplo, a época da piracema), se o segurado deixar sua condição de pescador artesanal passando a exercer outra atividade, pode perder o benefício.

Para os demais benefícios (como aposentadorias, salário-maternidade, pensão por morte, auxílio-reclusão etc.), sempre que a Previdência Social detectar alguma eventual irregularidade, poderá proceder a verificação ou revisão do mesmo. No entanto, isso tem um limite: até 10 anos. Isso quer dizer, que para os demais benefícios o “pente-fino não é perpétuo”. Em outras palavras, se o segurado teve sua aposentadoria por idade concedida errada (para mais ou para menos), se passar mais de 10 anos, nem ele e nem o INSS poderão fazer mais nada. O benefício ficará como está. A única exceção é quando se tratar de fraude, pois aí não há prazo para efetuar a revisão.

Dessa maneira, em que pese durante alguns momentos o INSS realizar esses “mutirões” conhecidos como “pente-fino”, isso não significa que a Previdência Social está inerte. Ou seja, ela está fazendo isso a todo instante, pois a lei lhe incube de fazer periodicamente esse tipo de reanálise dos benefícios.

2. Como se preparar para o pente-fino e ficar atento a possíveis erros do INSS
Mesmo quando o INSS detectar eventual irregularidade ou recuperação de saúde, por exemplo, ele não pode imediatamente cessar o benefício.

Todo mundo tem o direito de se defender. Isso significa que a Previdência Social, deve convocar o segurado para a realização de perícia (quando se tratar de suspeita de recuperação da saúde, por exemplo), ou notificar o beneficiário para os demais casos, a fim de que ele preste os esclarecimentos.

Dessa maneira, se no cruzamento de dados, por exemplo, o INSS suspeitar que a renda familiar mudou de quem recebe BPC/LOAS, não poderá simplesmente suspender ou cancelar o benefício. Ele terá que notificar o indivíduo para que ele apresente a sua defesa por escrito, juntando as respectivas provas. Somente após a análise, caso seja detectada alguma irregularidade é que poderá ser feito a suspensão ou cancelamento do benefício. Afinal, como está na Constituição Federal, todos são inocentes até que se prove o contrário.

E, aqui, já cabem os primeiros alertas.

Em alguns casos o INSS tem “pulado etapas” e suspendido ou cancelado o benefício, sem dar a oportunidade do beneficiário se defender. Isso está errado! Quando isso acontece, é possível ingressar com algumas medidas na Justiça, que vão restabelecer o benefício (que pode ser, inclusive, por liminar ou tutela de urgência), até que se termine a apuração da eventual irregularidade alegada pela Previdência Social.

Contudo, é importante destacar que quem recebe algum benefício do INSS deve manter o seu cadastro atualizado junto à Previdência Social. Isso porque, se a pessoa se mudar e a convocação ou notificação chegar no endereço antigo, a Previdência Social poderá entender que o beneficiário recebeu o comunicado e não quis fazer a perícia (supondo que ele já esteja apto para retornar ao trabalho) ou que ele não quis se defender. Nesse caso, o INSS poderá suspender ou cancelar o benefício.

Outra dica importante é ficar atento em eventual convocação que a Previdência Social pode fazer por meios eletrônicos. Isso pode acontecer tanto por meio de mensagens ou até mesmo pelo terminal do banco onde é pago o benefício. Mas cuidado com golpes. Verifique se a mensagem está vindo pelos canais oficiais. Em caso de dúvida, cheque junto ao Portal “Meu INSS” ou ligue no 135.

3. Armadilhas do pente-fino
O novo pente-fino do INSS está recheado de armadilhas que vão desde a redução de valores, a suspensão de benefício, cancelamento e até mesmo processo criminal e prisão.

Por isso, fique atento para não ter dores de cabeça.

Entre as principais arapucas estão:

a) Transformação do auxílio-doença em aposentadoria por invalidez. O pente fino pode não apenas suspender ou cancelar o benefício, mas também transformar auxílio-doença em aposentadoria por invalidez. Mas calma... Não é uma boa notícia (principalmente, depois de 2019). É que com a “Reforma da Previdência” o valor da aposentadoria por invalidez pode ser menor do que o auxílio-doença. De um modo geral, o auxílio-doença corresponde a 91% da média dos salários de contribuição (SC) do segurado, mas não pode ser maior do que a média dos últimos 12 meses. Era bem parecido com a sistemática anterior à Reforma da Previdência. Já a aposentadoria por invalidez sofreu modificações no seu coeficiente. Antes de novembro de 2019, o valor era de 100% da média dos maiores salários. Agora, só será de 100% caso se trate de doença do trabalho ou acidente do trabalho, ou caso o segurado tenha 40 anos de trabalho (homem) ou 35 anos (mulher). Se não for essa a situação, o valor será de 60% da média de todos os salários, acrescido de mais 2% para cada ano que passar de 15 anos (mulher) ou de 20 anos (homem). Exemplificando: Um segurado que tem menos de 20 anos de trabalho e que estava recebendo auxílio-doença no valor de R$ 3 mil, caso passe pelo pente-fino e o perito entenda que é caso de aposentadoria por invalidez, o benefício será reduzido para R$ 1.800,00. O INSS não pode cobrar diferenças do que estava pagando a mais a título de auxílio-doença. Se ele fizer isso, caberá ação na Justiça.

b) Não se apresentar na perícia ou deixar de apresentar defesa. Dizem que quem cala consente. É o famoso efeito da revelia. Assim, na hipótese do beneficiário ser convocado e não fizer nada, pode ter não apenas a suspensão ou cancelamento do benefício, mas corre o risco de devolver o que andou recebendo (pois o INSS pode entender que o pagamento foi indevido). O INSS pode entrar com processo de cobrança, realizar penhora, inscrever na dívida ativa etc. E não é só. A Previdência também pode encaminhar essas informações para o Ministério Público, que poderá entender que o pagamento tido como indevido, caracteriza o beneficiário como fraudador e instaurar um processo criminal contra ele – sujeitando o suposto infrator a pena de prisão.  Por isso, caso receba qualquer notificação, o beneficiário deve procurar ajuda imediatamente, preferencialmente com um advogado especialista em Direito Previdenciário, que fará a defesa adequada, a fim de evitar maiores transtornos no futuro.

4. O que fazer se o benefício for cessado
a) Se realmente não preenche mais os requisitos. Quando o segurado se recupera, por exemplo, ou quando o beneficiário do BPC/LOAS não é mais hipossuficiente (isto é, a renda não é mais considerada baixa), o benefício deve ser cessado. No entanto, resta algumas alternativas para o cidadão. Na hipótese de ter ficado com alguma sequela, o segurado pode se aposentar com a aposentadoria da pessoa que tem algum tipo de barreira (veja mais em https://acesse.dev/aposentadoria-pessoa-com-barreiras). Nesse caso, é possível aposentar por tempo de contribuição a partir de 20 anos de tempo de serviço (mulheres) ou 25 anos (homens). Na aposentadoria por idade da pessoa que tem alguma barreira, pode ser aos 55 anos de idade (mulheres) ou 60 anos (homens). Contudo, o segurado pode escolher qualquer outra regra que lhe for mais vantajosa (como aposentadoria por idade tradicional, aposentadoria pelas regras de transição etc.). É possível contar todo o período que o segurado esteve em gozo de benefício por incapacidade, para completar o tempo faltante para alguma das modalidades de aposentadoria. No caso de BPC/LOAS, caso o beneficiário volte ao trabalho, pode passar a receber um benefício chamado “auxílio-inclusão”, no valor de meio salário-mínimo.

b) Se foi indevidamente cessado. Quando o INSS “corta”, porém o indivíduo tem direito de continuar recebendo, cabe algumas medidas. Dentre elas, a propositura de ação na Justiça, que pode determinar o imediato restabelecimento de benefício, além do ressarcimento pelos possíveis prejuízos e danos morais.

5. Conclusão
Do exposto, verifica-se que apesar da incerteza se vai ou não haver o “pente-fino do INSS”, resta evidente que a reanálise de benefício é um poder-dever da Previdência Social e acontece a todo o instante.

Contudo, o beneficiário deve sempre manter seu cadastro atualizados para que caso alguma convocação chegue ao seu conhecimento, ele possa evitar cortes indevidos dos benefícios, com a apresentação da respectiva defesa.

Porém, se todos os cuidados foram tomados, mas mesmo assim o INSS “bloqueou” os pagamentos, dá para entrar na Justiça e receber todos esses valores.

Quando o “corte” é devido (se houve recuperação da saúde) é possível aproveitar o tempo do segurado e/ou pleitear outros benefícios.

De qualquer maneira, a ajuda de um advogado especializado em Direito Previdenciário de sua confiança se torna primordial nessa hora, que fará com que sejam resguardados todos os direitos e evitando maiores problemas no futuro.

Se você gostou deste texto ou sabe de alguém que precisa dessa dica, compartilhe com seus amigos e familiares, para que mais pessoas possam conhecer e exercer os seus direitos.

Tiago Faggioni Bachur é advogado e professor de direito. Especialista em direito previdenciário

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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2 COMENTÁRIOS

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  • APARECIDO DONIZETE NUNES
    24/03/2024
    O Nobre Advogado Tiago Bachur parece que não acompanhou a votação no STF, acabou , não tem mais Revisão da Vida Toda no INSS.
  • Antonio Carlos
    24/03/2024
    Só que existem pentes finos e pentes finos, vc me entende, o que se vê é que o INSS, como toda instituição pública nesse país, procura mais é mostrar que está trabalhando fo que realmente trabalhar, polícia, justiça e INSS, principalmente, chorar muito pra mamar mais, entende?. Por ex., cortaram a aposentadoria do Martinho da Vila alegando que quem não provou que está vivo não pode receber aposentadoria, mas as centenas de milhares de aposentadorias e beneficios fraudulentos eles não levantam e continuam pagando. E adivinhem de quem eles tomar direitos nesse tal de pente fino, se dos velhos que contribuíram a vida inteira?, ou dos estelionatários que pululam sob os bigodes da fiscalização de benefícios do INSS?.