OPINIÃO

O que muda no INSS em 2024

Por Tiago Faggioni Bachur | Especial para o GCN/Sampi Franca
| Tempo de leitura: 10 min

Imagine que você está se preparando para uma mudança. Você já sabe o endereço da sua nova casa, mas ainda não sabe como vai transportar os seus móveis e objetos pessoais. É preciso contratar um caminhão de mudanças, contudo você não sabe qual é o melhor custo-benefício. Você pesquisa na internet e encontra várias opções, cada uma com suas vantagens e desvantagens. Algumas são mais baratas, mas exigem que você faça todo o trabalho de carregar e descarregar. Outras são mais caras, mas oferecem um serviço completo, com embalagem, montagem e desmontagem. E ainda há aquelas que têm preços intermediários, mas cobram taxas extras por quilometragem, pedágio ou tempo de espera.

Agora imagine que essa mudança é a sua aposentadoria. Você já sabe que tem direito a receber um benefício do INSS, mas ainda não sabe qual é a melhor forma de requerer. É necessário escolher uma regra de transição, no entanto não se sabe qual é a mais vantajosa. É possível consultar o site do INSS e encontrar várias opções, cada uma com seus requisitos e fatores de cálculo. Algumas são mais fáceis, mas resultam em um benefício menor. Outras são mais difíceis, mas garantem um benefício maior. E ainda há aquelas que têm condições intermediárias, mas sofrem descontos por fator previdenciário ou outro redutor. Isso, sem mencionar, que nem sempre as informações no banco de dados podem estar fidedignas com a realidade do trabalhador.

Quem está nessa situação é preciso estar ciente de que o ano de 2024 traz algumas mudanças importantes no INSS que podem afetar a sua escolha. Vamos explicar o que muda e o que não muda no INSS em 2024, e como isso pode impactar a sua aposentadoria.

O que muda no INSS em 2024
a) Salário-mínimo em 2024
Uma das principais mudanças que afetam o INSS em 2024 é o aumento do salário-mínimo. O valor passa de R$ 1.320,00 para R$ 1.412,00, com um aumento acima da inflação (3,85% + 3% de ganho real, chegando a quase 7%). Apenas para ilustrar, a Constituição Federal determina somente o repasse da inflação. Isso quer dizer que se não fosse para dar esse aumento acima da inflação, o novo salário-mínimo seria algo em torno de R$ 1.370,00. De outra sorte, quem ganha acima do salário-mínimo receberá apenas o aumento da inflação. Em outras palavras, aqueles que contribuíram com mais ou tiveram um desconto maior de INSS quando estavam na ativa, tendo a oportunidade de ganhar um pouco mais do que o mínimo, terão menos de 4% de aumento, enquanto aqueles que pagaram pouco o INSS (ou, em determinados casos, nem pagaram) e recebem benefício de salário-mínimo terão quase o dobro do aumento percentual. Alguns especialistas dizem que isso pode ser um “desincentivo” a contribuir para o INSS. Apenas para exemplificar melhor a questão, imagine dois segurados que se aposentaram no início de 2023. O primeiro, que pouco contribuiu para o INSS e sempre com valores em torno do salário-mínimo, foi aposentado por idade com um salário-mínimo (na época, R$ 1.320,00). O segundo segurado, que contribuiu por mais, aposentou-se por idade com R$ 1.420,00. Em 2024, o primeiro passará a receber R$ 1.412,00 enquanto o segundo receberá R$ 1.474,00. A diferença que era de R$ 100,00 entre um e outro, diminuiu para pouco mais de R$ 60,00. Se em 2025 for repetida essa mesma política de reajustamento de benefícios, é provável que tenhamos uma igualdade social (ou seja, ambos passarão a ganhar um salário-mínimo).

A conclusão é de quem pode se aposentar em 2024, mas sempre contribuiu com valores baixos, pode não ser interessante esperar, pois não encontrará um benefício muito maior no futuro. Nessa hipótese, em regra, seria melhor aposentar já. No entanto, para não correr riscos é preciso fazer cálculos antes.

b) Aumento dos pontos na regra de transição da Reforma Previdenciária
Outra mudança importante que ocorre em 2024 é o aumento dos pontos na regra de transição da Reforma Previdenciária. Essa regra é uma das opções para quem quer se aposentar por tempo de contribuição, mas não se enquadra nas regras antigas. Ela consiste em somar a idade e o tempo de contribuição do segurado, e atingir uma pontuação mínima, que varia de acordo com o ano. A partir de 1º de janeiro de 2024, a pontuação exigida para as mulheres é de 91. Para os homens, 101. No entanto, essa regra de transição do sistema de pontos, que veio com a Reforma Previdenciária de 2019, estabelece um aumento progressivo até 2028 para homens (chegando ao teto de 105 pontos) e 2033 para mulheres (100 pontos).

c) Regra de Transição da idade mínima mais tempo de contribuição
Uma terceira mudança que acontece em 2024 é o acréscimo de meio ponto na regra de transição da idade mínima mais tempo de contribuição. Essa regra é outra alternativa para quem quer se aposentar por tempo de contribuição, mas não se encaixa nas regras antigas. Ela exige uma idade mínima e um tempo de contribuição mínimos, que aumentam gradualmente a cada ano. Em 2024, as mulheres vão precisar ter 58 anos e 6 meses de idade e um mínimo de 30 anos de contribuição para o INSS. Os homens precisarão atingir 63 anos e 6 meses de idade e pelo menos 35 anos de contribuição, para poderem se aposentar. Em 2023 os homens precisavam ter 63 anos de idade e as mulheres 58.

O que não muda no INSS em 2024
Apesar das mudanças que acabamos de ver, há algumas regras do INSS que não mudam em 2024, e que podem ser interessantes para alguns segurados. Veja quais são elas:

a) Homens se aposentam com 65 anos de idade e mulheres aos 62 anos, ambos com 15 anos trabalhados: essa é a regra geral da aposentadoria por idade, que vale para quem começou a contribuir depois da Reforma Previdenciária ou não se enquadra em nenhuma regra de transição. Ela não sofre alterações em 2024, e continua sendo uma opção para quem não tem tempo de contribuição suficiente, mas já alcançou a idade mínima.

b) Pedágio de 50%: por esta regra, quem estava com dois anos ou menos para aposentar-se em 13 de novembro de 2019 (data da Reforma Previdenciária), deverá cumprir um pedágio de 50% do tempo restante. Exemplo: se faltava um ano para o homem alcançar os 35 anos, deverá trabalhar por mais um ano e seis meses do pedágio. Essa regra também não muda em 2024, e pode ser vantajosa para quem estava perto de se aposentar antes da Reforma, pois não exige idade mínima.

c) Pedágio de 100%: por esta regra, quem estava com mais de dois anos para aposentar-se em 13 de novembro de 2019, deverá cumprir um pedágio com o dobro do tempo restante. Exemplo: se faltavam três anos para o homem alcançar os 35 anos, deverá trabalhar por mais três anos do pedágio, totalizando seis anos. Essa regra também não muda em 2024. Vale destacar que nessa regra de transição é necessário também uma idade mínima para o segurado, que é 57 anos para mulheres e 60 anos para homens.

d) Direito adquirido a regras anteriores: essa não é uma regra específica, mas um princípio jurídico que garante que quem já cumpriu os requisitos para se aposentar antes da Reforma Previdenciária pode optar pela regra mais benéfica, seja ela antiga ou nova. Isso significa que, se o indivíduo já tinha direito a se aposentar em 2019, por exemplo, ele pode escolher entre as regras antigas ou as novas, e ver qual delas resulta em um benefício mais vantajoso.

e) Aposentadoria com “barreira”: essa é uma regra especial para quem tem alguma limitação física, mental, intelectual ou sensorial que dificulta ou atrapalha o exercício da atividade profissional. Não significa que o cidadão não possa trabalhar (muito pelo contrário, pois um cadeirante, por exemplo, apesar de ter uma “barreira” não é, necessariamente, incapaz para o trabalho). Ela permite que essas pessoas se aposentem com menos tempo de contribuição e/ou menos idade, dependendo do grau da barreira. Essa modalidade de aposentadoria, que existe desde 2013, não entrou na Reforma Previdenciária. Quem possui alguma “barreira” pode aposentar por tempo com até 10 anos a menos (ou seja, a partir dos 20 anos de tempo de contribuição para as mulheres, e a partir dos 25 anos de tempo de contribuição para os homens – pouco importando a idade). No caso da aposentadoria por idade da pessoa que possui alguma “barreira”, é 55 anos para mulheres e 60 anos de idade para homens. A “barreira” aqui não deve ser confundida com incapacidade, mas, como ressaltado, como uma limitação que não impede (mas pode atrapalhar no dia a dia do segurado). Assim, pode ser considerado como “barreira” quem possui algum tipo de dor (em braços, pernas, coluna, ombros, mãos, pés, fibromialgia etc.), problemas vasculares ou circulatórios, quem teve alguma fratura e ficou com alguma sequela (colocou placa, pino, parafuso, prótese, órtese, ficou com o braço torto, perna torta etc.)., tem alguma limitação de movimentos, tem problemas sensoriais (perda auditiva, visual etc.), possui alguma doença psiquiátrica (TOC, síndrome do pânico, depressão, ansiedade, insônia, autismo etc.). Enfim, qualquer situação traga alguma limitação física, mental, intelectual ou sensorial que dificulta ou impede o exercício da atividade profissional. Essa regra que pode antecipar a aposentadoria também não muda em 2024, e pode ser uma ótima opção para quem se enquadra em alguma dessas situações.

Conclusão
Como você pode ver, o INSS em 2024 traz algumas mudanças que podem influenciar a sua decisão sobre quando e como se aposentar. Por isso, é importante estar atento às regras e aos cálculos, e comparar as diferentes opções disponíveis. Mas cuidado: assim como na hora de contratar um caminhão de mudanças, nem sempre o que parece mais fácil ou mais barato é o melhor para você. Às vezes, o sistema do INSS não reconhece algumas situações que poderiam antecipar a sua aposentadoria e/ou trazer um cálculo melhor, como por exemplo: a consideração de atividades especiais/insalubres (que são aquelas que expõem o trabalhador a agentes nocivos à saúde ou à integridade física, e que podem até dobrar o tempo de contribuição, dependendo do caso), ou de quem trabalhou sem registro como empregado (onde há situações em que é possível contar esse período, mesmo que não tenha havido pagamento para o INSS), ou quem trabalhou na zona rural com a família (ainda que tenha sido na infância e sem recolhimento previdenciário), quem se encaixa nas regras da aposentadoria da pessoa com “barreira” etc.

Mas é importante ficar atento... Aquele caminhão de mudanças que você contratou pode ter que enfrentar algo inesperado, como uma mudança de planos (tipo, uma greve dos caminhoneiros no dia da sua mudança). Isso mesmo! Pois se a categoria está insatisfeita com o aumento do preço dos combustíveis e das tarifas de pedágio, pode querer paralisar as estradas do país em algum momento desse carreto. Em outras palavras, as regras do INSS podem ser alteradas. Assim, essa situação surpreendente de alteração de regras pode atrasar ou inviabilizar a sua mudança, e causar prejuízos para você, segurado.

Portanto, quem pensa em se aposentar em 2024, deve ficar atento às notícias e às eventuais mudanças que podem ocorrer no INSS, bem como no cenário econômico e social do Brasil. Lembre-se: a sua aposentadoria é um direito seu, e você deve buscá-lo da melhor forma possível. Por isso, é importante, em caso de dúvida, procurar um advogado especialista em Direito Previdenciário da sua confiança, que poderá analisar o seu caso e orientá-lo sobre a melhor forma de se aposentar e, a qualquer sinal de alteração, realinhar o caminho provocado por essa eventual mudança.

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Tiago Faggioni Bachur é advogado e professor de direito. Especialista em direito previdenciário

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