NOSSAS LETRAS

De braços abertos

Somos uma enorme família vivendo nesta casa que ainda é maravilhosa e se chama Terra. Leia o artigo de Sonia Machiavelli.

Por Sonia Machiavelli | 24/12/2022 | Tempo de leitura: 3 min
Especial para o GCN

Somos uma enorme família vivendo nesta casa que ainda é maravilhosa e se chama Terra. Deveríamos estar mais desenvolvidos nesta altura da história. Mas quando olhamos para o mundo fica claro que não nos evoluímos o bastante para usufruir com respeito, paz e igualdade das maravilhas oferecidas pela natureza e das conquistas alcançadas pela inteligência humana. Marcas de disputas, violência, guerras, indiferença, preconceitos, abusos desvelam situações onde alguns tentam de todas as formas defender a condição privilegiada que herdaram ou conquistaram, enquanto a maioria sobrevive a duras penas, sem as mesmas oportunidades de crescimento da minoria, e não raro sem o reconhecimento da sua dignidade humana. O império da desigualdade avança sem parar separando os homens.

No entanto, se mergulhamos numa reflexão verdadeira, constataremos que cada um ao nosso lado é semelhante a nós, pois em comum temos sangue e alma, alegrias e tristezas, áreas de luz e sombra e a preciosa condição de interagir, o que nos define como sociais. Pelo menos na teoria nenhum homem, nenhuma nação mostraram-se até hoje autossuficientes, seja na realização do bem, seja nas consequências dos malfeitos. Somos todos responsáveis, inclusive pelas escravidões e injustiças.

 O Papa Francisco, na encíclica “Somos todos irmãos”, abordou de forma contundente este tema, elegendo a fraternidade como projeto comum, com exigência de esforço, lucidez e contínua coragem de todos: “sejamos capazes de reagir com um novo sonho de fraternidade e amizade social (...) Sonhemos com uma única humanidade, como filhos desta mesma Terra que alberga a todos, cada qual com a riqueza de sua fé ou das suas convicções, cada qual com sua própria voz, mas todos irmãos.”

Estas palavras são mais que oportunas quando os cristãos celebram o Natal anunciando que Deus é pai da humanidade inteira e de cada ser humano, o que significa que está atento às angústias, anseios, esperanças de todos. Foi por amar as criaturas de maneira infinita que o Criador enviou à Terra seu filho para reunir em paz- sentimento tão mencionado no Novo Testamento-a grande família humana.

Dom Odilo Scherer, arcebispo de São Paulo, escrevendo sobre o protagonista da festa cristã, lembrou que “Jesus não veio com demonstrações de poder e força para intimidar ou impor sua vontade. Nasceu pobre e despojado, pequenina e indefesa criança que só desperta sentimentos de ternura e admiração. Não veio dividir, mas buscar o que está disperso e unir o que está dividido. Veio ao encontro de todos e de todos se fez irmão. A representação do menino Jesus, de braços abertos na manjedoura do presépio, é um convite a acolher e se deixar acolher. Ninguém precisa ter medo de se aproximar nem se sentir excluído deste abraço fraterno restaurador da paz.”

Estamos vivendo mais um Natal sob o signo do consumismo, da agitação das festas, dos encontros de amigos visíveis e invisíveis. Nada contra, até porque as confraternizações do período não deixam de realçar o significado profundo da festa do nascimento de Jesus. É tempo de alegria. As pessoas ficam naturalmente mais leves, querem partilhar seu sentimento de alguma forma; e por algum tempo, breve que seja, acreditam que o mundo possa ser melhor, que os humanos consigam ser bons uns com os outros. Há um mistério contagiante no ar e ele vai muito além das luzes, dos presentes, das canções, de todos os símbolos.

A fim de que a festa não se desvirtue de seu sentido primordial, que é de esperança e amor ao próximo, haja em cada um de nós algum sentimento de fraternidade e reencontro da família humana, pois raças, etnias e culturas diversas não conseguem esconder que somos uma única humanidade. Nossas diferenças não devem ser excludentes, e sim mostrar as enormes riquezas e capacidades que o ser humano traz em si e expressa nas suas maneiras de existir. Mas para que consigamos alcançar este ideal, para estarmos realmente inteiros com o outro, sem animosidades, sem disputas, sem comparações, precisamos sair de nós, de nosso narcisismo às vezes doentio, e estar com ouvidos abertos para acolher aquilo que busca nosso entendimento. Porque no princípio é sempre o verbo...

Feliz Natal, leitora e leitor destas palavras.

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