OPINIÃO

Feriados

Por Lúcia Brigagão | Especial para o GCN
| Tempo de leitura: 3 min

Há bons anos, considerava festa qualquer feriado. Particularmente quando trabalhava como substituta no Grupo Barão da Franca. O sistema ajudava as recém-formadas que, sem cadeira efetiva, substituíam as professoras sempre que havia feriados que dava para emendar com o final de semana. Aí a gente fazia a festa. Novembro, por exemplo.  Dávamos aula na quinta, folgávamos sexta, sábado, domingo, trabalhávamos na segunda e ganhávamos uma bolada no final do mês, que nos permitia poupar, viajar, vestir-nos, passear. Professores eram bem remunerados. Tinham salário digno e eram tratados como profissionais decentes pelo governo, pelos pais dos alunos, pelos próprios alunos e pela sociedade em geral. Quando havia a possibilidade de alguma substituição mais longa – casamentos e lua-de-mel, nascimentos, principalmente aí, as professorinhas recém-formadas faziam a festa...

Tínhamos orgulho de nossa profissão. Por esta época já havia espertalhonas e conchavistas que ficavam de olho nas conversas entre as professoras efetivas aguardando um téco de informação que lhes acenasse ou sugerisse encaixe na cobiçada lista de substituições. E aí se reviravam para se colocarem na escala de forma adequada para tirar vantagem. Doenças dos filhos, parentes, essas coisas trágicas lhes permitiam aproveitamento. Mais ou menos como fazer discurso político no velório da esposa.

Lá no Barão éramos três mosqueteiras. Tinha outras, claro, mas Tereza Cristina, Wilma e eu éramos o Trio Parada Dura... Calouras da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Franca, conseguimos as vagas para substitutas no Barão da Franca. Ícones da educação trabalhavam naquela escola: Aparecida Casarotti, Ruth Blóis, Dorotéia, minhas protetoras... Foi muito bom. Tirando os foras provocados pela ignorância e prepotência da juventude, daquela que se julgava a nova Piaget, ou seja, eu, foi tempo de alegria e muito divertimento, experiências. Lecionar era maravilhoso; entrar em contato com os alunos – pouco mais novos que as substitutas – participar de eventos, ajudar no preparo deles... foi muito bom.

Até que lá pelo segundo ano de trabalho no Grupo, as coisas começaram a mudar. Wilma começou a ficar mais quieta, calada, ainda sorria muito, mas lentamente perdia o pique. E ela nos contagiava, de uma maneira ou outra. Antes, alegre, falante, levava a gente no seu sorriso. Agora, calada, calada, se fechava, já não falava do namorado bonitão. Seus olhos embotaram. Caiu à frente deles como que catarata de dor. Wilma morreria no ano seguinte, deixando-nos devastados, pois impotentes diante daquela dor sem cura. Foi quando entendi que pancada de amor dói sim... e que sim, é possível, mesmo depois de séculos ou tantos de Isolda e Tristão; Marco Antônio Cleópatra, Eva Braun e Hitler (os brutos também amam), Inês de Castro e D. Pedro I, Katharine Hepburn e Spencer Tracy, Malínche e Cortéz e claro, Julieta e Romeu - a primeira dupla que vem à memória - casos exemplares de como se morre por amor. E que amor não tem lógica, muito menos explicação. Não tem sentido, mas existe... Ah se existe! Lembro Cortázar: "Como si se pudiese elegir en el amor, como si no fuera un rayo que te parte los huesos y te deja estaqueado en la mitad del patio." Ilógico, e devastador.

Não acompanho mais os feriados no meu país. Mas fico me perguntando que tipo de homenagem se faz nos feriados de novembro, por exemplo. Feriados dias 2, 15, 20 e 29 – respectivamente quarta-feira, terça-feira e domingo e terça novamente. Com boa vontade – coisa que o brasileiro tem de sobra – os feriados de novembro são esticados, aproveitados. Cansaço geral nas pessoas, elas emendam dias de trabalho, dias de férias, férias não gozadas e acabam por fazer de novembro o mês de folga do calendário.

Longe de implicar... só comentando folgas neste país que precisa de trabalho.

Fale com o GCN/Sampi!
Tem alguma sugestão de pauta ou quer apontar uma correção?
Clique aqui e fale com nossos repórteres.

Comentários

1 Comentários

  • José Américo Braia Taveira 21/11/2022
    MINHA MESTRA QUERIDA, hoje mais do que nunca, você lembrou do nosso tempo bom. Estudávamos eu, Wilsinho seu irmão e toda galera, VOCÊ nossa Profe de Matemática, super na nossa Alegre, conversando conosco por igual, gente fina. Foi dar aula de pé quebrado, engessado, sem crise. Já namorava o Grandão, cheio do dinheiro. Lembranças, lembranças muito boas. Não perco nenhum texto seu, MARAVILHOSOS. FIQUEM COM DEUS.