NOSSAS LETRAS

Deus está na chuva

Qual profeta isolado numa caverna esquecida, como se esperasse ouvir Deus ou a verdade derradeira entre raios e trovões (...). Leia a crônica de Baltazar Gonçalves.

Por Baltazar Gonçalves | 17/09/2022 | Tempo de leitura: 2 min
especial para o GCN

Qual profeta isolado numa caverna esquecida, como se esperasse ouvir Deus ou a verdade derradeira entre raios e trovões, inesperadamente aconteceu com Elias o que se conta.

Uma árvore foi assassinada, e por um instante maior que o primeiro passo, Elias compreendeu o mecanismo da sua inquietação revelada - quem diria? - no silêncio de uma árvore derrubada. Deus, metamorfoseado em tronco de casca grossa, teria dito na agonia do corte a Elias: não pode mudar o mundo nem chover, mude o hábito e mudará o monge, mudará muito se uma semente florescer. 

Incapaz de render-se à impotência de mudar o mundo, Elias resignado sentiu migrar da árvore morta filamentos verdes invisíveis para a ponta de seus dedos, a verdade [pedra filosofal para a mudança definitiva e a derradeira solução para os problemas da humanidade] estava dentro dele, ninguém ouviu a resposta exata assertiva [os raios e os trovões]. Justamente. Elias intuiu alívio para a desesperança paralisante e o vazio crescente que também nos consome.

Por toda parte, não adianta produzir necessidades e consumir desejos desenfreadamente. Nada pode preencher do que falta ao espírito humano inquieto. Controlar pessoas lugares e coisas possuindo-as pode sufocar por dentro quando a intenção seria o contrário. Quando a engenharia do consumo se abriu clarividente, Elias sentiu-se liberto das necessidades supérfluas criadas em sua volta [e por ele mesmo] para o distrair. Então ele saiu para fora de si, deixou mínimo seu ego calado. Para fora feito chuva, Elias concluiu o que tínhamos esquecido: Deus está na chuva!

Qual poeta atônito feito raio, Elias alcançou a derradeira casa da última rua da Vila e plantou capim mimoso nas encostas, plantou e um pé de Flamboyant nos quintais e nas esquinas plantou ipês. Elias plantou árvores dentro e fora dos hospitais, nas delegacias e nas escolas tristes no trecho do Mira Montes onde quem devia plantar árvores transforma pátios em campo de troncos mortos. No lugar do estacionamento para os carros e outros desejos de consumo imediato - Eliah! surgiu jardins eternos.

Para saudar a primavera entre os lábios chove, e tudo fica mais claro e limpo. Deus maior que deus faz o que ninguém pode: chover caminhos claros dentro e fora de nós. Aqui, no hemisfério sul da Vila Franca do Imperador, a primavera rasga o bojo da sequidão e neblina-maná alguma alegria.

Porque choveu manso em nossas consciências, alunos professores, doentes aflitos, prisioneiros entre grades reais ou imaginadas, todos ganhamos da chuva sementes de alegria em flor.

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