OPINIÃO

Retroatividade da nova Lei de Improbidade Administrativa

A Lei nº 14.230, representa uma verdadeira reforma do sistema legal de repressão à improbidade do administrador público. Leia o artigo de Toninho Menezes.

Por Toninho Menezes | 06/08/2022 | Tempo de leitura: 3 min
especial para o GCN

Valter Campanato/Agência Brasil

O STF (Supremo Tribunal Federal) iniciou na última quarta-feira, 3, as votações dos ministros da Corte Suprema no julgamento em que se discute a aplicação retroativa das alterações trazidas nas regras da Lei de Improbidade Administrativa, que vieram através da Lei 14.230, de 25/10/2021.

Mais do que uma mera alteração da Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992, a Lei nº 14.230, representa uma verdadeira reforma do sistema legal de repressão à improbidade do administrador público. Se até a ementa da lei suas finalidades e sua definição de objeto foram modificadas, é mesmo de se perguntar o porquê de o legislador ter optado por reformar a lei vigente, uma vez que as mudanças são tão profundas que podem mesmo configurar uma lei totalmente nova.

A parte que nos importa aqui abordar, porém, diz respeito especificamente ao princípio da retroatividade da lei benéfica. Em nosso humilde entendimento, de um simples professor de direito administrativo, que analisando o direito estrangeiro, a jurisprudência do Tribunal Europeu de Direitos Humanos, a posição da doutrina majoritária etc., verificamos que dentre os princípios constitucionais do direito administrativo sancionador a que se refere a nova lei, encontra-se o preceito da retroatividade da lei sancionadora benéfica ao réu, que encontra-se positivada na esfera penal, no artigo 5º, inciso XL, da Constituição Federal.

Assim, entendemos que as disposições da lei 14.230/2021 devem ser aplicadas retroativamente mesmo aos processos em curso e até transitados em julgado, desde que seja observado: 1) em relação aos aspectos materiais sancionadores (definição dos tipos e imposição de sanções), vedada a desconstituição de obrigação civil de reparar o dano (ressarcimento ao Erário); 2) a modificação seja substancialmente benéfica ao acusado, não se configurando tal situação com a mera mudança de topologia de dispositivos; 3) não esteja a sanção totalmente executada (exaurida).

Essa aplicação retroativa pode ser feita em qualquer etapa do processo e em qualquer grau de jurisdição, devendo mesmo ser declarada de ofício pelo juízo, por se tratar de norma de ordem pública.

A aplicação da retroatividade da norma sancionadora mais benéfica encontra prevista, ainda, no art. 9º do Pacto de São José da Costa Rica, do qual o Brasil é signatário, que não restringe a incidência do princípio ao Direito Penal, motivo pelo qual seria plenamente possível a sua aplicação às ações de improbidade administrativa.

Muitos nos questionam por que mudou a lei. A resposta é simples: os exageros cometidos deram base e justificativa para as alterações. Durante anos, em vários artigos, comentamos os excessos que estava cometendo, com todo respeito, o Ministério Público. Em muitos casos víamos que eram frágeis as acusações, principalmente quando se falava “haver indícios” com materialidade probatória insuficiente. Sempre comentamos com nossos alunos da importância da Lei 8429/1992, a Lei de Improbidade ora alterada, porém sempre pontuamos que os excessos cometidos poderiam levar a alteração de tão importante diploma legal, que estava sendo utilizado de maneira inadequada em muitos casos e a classe política legisladora, com certeza, frente aos inúmeros casos de injustiça demonstrados processualmente, alteraria de modo significativo o importante diploma legal, é o que está a ocorrer, infelizmente.

Em síntese, apesar de ainda estar em julgamento, no momento em que escrevemos esse artigo, deve ser admitida a retroatividade da lei de Improbidade Administrativa, não devendo ser admitida a propositura de ação de improbidade fundada em suposta culpa do acusado, em razão da extinção da modalidade culposa até então prevista na já antiga lei, bem como por condutas que não constam do rol taxativo da redação do novo diploma legal.

Toninho Menezes é mestre em direito público, advogado e professor universitário.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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