OPINIÃO

Futuro

Que mulher eu quero ser daqui a três meses? Eu mesma. Não sei se terei condições ou tempo de mudar alguma coisa. Leia o artigo de Lúcia Brigagão.

Por Lúcia Brigagão | 24/07/2022 | Tempo de leitura: 3 min
especial para o GCN

Mania antiga, anoto no caderno, na caderneta, na lousa, no livro que estou lendo no momento, onde quer que encontre papel, lápis, caneta, carvão, giz, qualquer coisa, para que possa registrar específico pensamento que subitamente me ocorra. Achei três especiais perguntas que registrei, perguntas que não sei de onde surgiram, que me fiz em não sei em qual data, o de certo é que não consegui descobrir o motivo da angústia ou sentimentos que me levaram a questionar e até prospectar o futuro, que devia me parecer sóbrio, sombrio ou absolutamente impreciso naquele momento. A bem da verdade, me soou como momento de desespero. As perguntas eram, primeira, “Como eu quero estar daqui a três meses?”. Segunda, “Onde quero estar daqui a três meses?”. Terceira, “Que mulher eu quero ser daqui a três meses?”.

Pode ser que amanhã mesmo eu mude as respostas, mas no momento, eu acho que responderia sem hesitar o seguinte: daqui a três meses eu quero estar viva. Simplesmente viva. Respirar sem aparelhos, aferir a pressão arterial e notá-la dentro dos conformes. Tomar banho sozinha, preparar minha comida, sair para fazer compras, usar computadores e celulares – com autonomia. Encontrar amigos, assistir e rever filmes, além de escolhê-los segundo meus gostos e critérios pessoais. Ter a liberdade de ir e vir, dirigir meu carro. Planejar viagens para onde bem entender. Tomar sorvete. Fazer novas amizades, deixar gente nova entrar no meu coração. Cantar muito no chuveiro. Ser autônoma para decidir o que quero, o que não quero mais, se vou continuar querendo ou se vou mudar tudo. Deixar tudo de ponta-cabeça.

Onde quero estar daqui a três meses? Em algum canto do mundo, em cima da Terra. Pode ser na minha casa ou na de amigos ou parentes, mas em frente a uma taça do melhor vinho tinto que eu puder pagar. Não quero que ninguém pague os pileques, que hei de tomar! Quem sabe, numa montanha, ou em frente ao mar. Não quero estar em lugar de choro, muito menos de vela. Quero desfrutar da alegria dos netos perto de mim. Quero ter um bom livro nas minhas mãos. Quero continuar decidindo com autonomia o que é melhor para mim, sem deixar que alguém dê pitacos ou tenha a ousadia de oferecê-los, caso não concorde com o que decidi. Tenho idade e discernimento suficiente para fazê-lo. Até para errar, já que sei hoje da minha incapacidade, das minhas fragilidades e não me julgo mais a infalível, a poderosa, a indefectível e perfeita Mulher Maravilha. Quem me dera!

Que mulher eu quero ser daqui a três meses? Eu mesma. Não sei se terei condições ou tempo de mudar alguma coisa. Não sei se terei vontade de me reformar, acho que gosto de mim como sou: sem invasões de procedimentos, de cabelos brancos, esquentada de gênio, mas sincera até os ossos. Gosto, gosto, não gosto, não gosto. Quero continuar adorando comida japonesa, a usar pulseiras e detestando indiscrições. Sou sincera, não passo confissões adiante. Sou confiável. Não sou hipócrita. Acho que tenho fibra. Acho que sou corajosa. Acho que sei lutar contra a adversidade. Acho que sou impetuosa. Quero continuar assim, com estas e tais preferências.

Você já se fez estas três perguntas? Não? Pois vá onde tenha visão privilegiada do pôr-do-sol, escancare seu coração e tente respondê-las. Não minta e poderá se deparar com tremenda surpresa. 

Dias atrás achei bilhete amoroso das netas: “Vovó, adoramos seu perfume forte; respeitamos seu medo de lagartixas, achamos lindos seus vestidos longos, sua risada sincera. Se um dia encontrarmos você com perfume fraquinho, sem medo de répteis, de vestido curtinho, seu rosto anuviado por alguma tristeza, pode crer, não a reconheceremos.” 

Elas delinearam, embora pequenas e de tenra idade, o meu futuro.

Lúcia Helena Maniglia Brigagão é publicitária e escritora.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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