No meio universitário, principalmente nos cursos de pós-graduação, é comum ouvir-se a narrativa do seguinte caso: “Um estudante brasileiro cursava pós-graduação em Paris em busca do título de doutor em direito constitucional comparado. Depois de consultar uma extensa lista das teses já tratadas anteriormente, conversando com seu professor orientador, fixou o seu trabalho na área do direito constitucional latino-americano. Como toda tese inicia-se pela pesquisa, o estudante brasileiro saiu em busca do material básico, ou seja, textos das constituições dos países latino-americanos em várias livrarias. Porém, nada encontrava. Resolveu então questionar ao gerente da maior livraria parisiense o porquê da dificuldade e, ouviu a seguinte frase: ‘Nós não vendemos periódicos’”.
O caso acima destaca como é que somos vistos pelos países desenvolvidos em relação ao respeito e a estabilidade que a nossa Constituição possui. A marca que carregamos é a de que tudo aqui é transitório, pois a interpretação que se dá em certo momento e o que está em vigor no dia de hoje poderá não ser interpretada nem vigorar na manhã seguinte.
As diferentes interpretações dadas pela nossa mais alta corte ao texto constitucional, as edições sucessivas de emendas constitucionais, fazem com que nossa Carta Magna seja comparada a um periódico, sendo a nossa marca maior perante a comunidade internacional e também pela classe jurídica e operadores do direito, pois nem sabemos mais qual é a verdadeira linha decisória para casos semelhantes, ou seja, estamos em meio a uma instabilidade jurídica permanente.
O que nos angustia é vermos que a comunidade jurídica, juízes, promotores, procuradores, defensores, advogados, professores, pesquisadores acadêmicos etc., não se manifestam de forma clara na busca de cessar tais arbitrariedades e resgatar a credibilidade de todo o sistema jurídico nacional, que está em declínio. Até décadas atrás, sabíamos perfeitamente os ritos processuais, as garantias do devido processo legal, o respeito ao contraditório e a ampla defesa, o direito de acesso aos autos etc., o que não ocorre em muitos casos atualmente.
Com a Constituição são fixadas múltiplas garantias para defesa da ideologia dominante e dos institutos constitucionais fundamentais, que vão da proibição da revisão constitucional às garantias oferecidas pelas sanções penais, a um sistema orgânico de controles jurisdicionais, processual e à organização da administração militar e civil. Não contém somente normas organizativas, mas sobretudo princípios de orientação, que servem de base a todos outros ordenamentos. São, portanto, os princípios constitucionais fundamentais, que se revestem de essencial importância na compreensão de uma Constituição.
Caro leitor, para sairmos desse “marasmo” no qual se encontra o país, efetivamente são necessárias mudanças, porém as mesmas devem ocorrer ordenadamente, é necessário que as nossas autoridades respeitem os preceitos básicos de um Estado Democrático de Direito, onde todos, e não só alguns, devem se sujeitar às normas positivadas. E para alterar qualquer norma, principalmente a Constituição Federal necessário se faz cumprir rito processual dificílimo. Assim, não pode o Poder Judiciário ser legislador constituinte, o que não está em suas competências.
Não podemos mais aceitar que tenhamos que conviver numa insegurança jurídica constante. Não podemos mais aceitar que o Congresso Nacional seja serviente e submeta-se às manobras, cada qual (senadores e deputados) pensando em si mesmo, nos seus processos judiciais particulares e não nos interesses coletivos, a propósito, para os quais foram eleitos.
O Estado é a nação política e juridicamente organizada. E o Governo é o instrumento político, previsto na Constituição, para conduzir e realizar as ações que reflitam os interesses e aspirações da maioria de seus cidadãos, resguardando-se os direitos das minorias.
O que nos interessa é o respeito pelos preceitos e princípios básicos de nosso ordenamento constitucional, onde o interesse público deve sempre prevalecer e não os interesses políticos partidários e individuais.
Como professor de direito, é muito triste quando assistimos aos verdadeiros “malabarismos jurídicos” na busca de tentar justificar o injustificável. Quando a redação constitucional é cristalina e independe de interpretações para alcançar o verdadeiro “espírito da lei”, mas, porém, contudo, todavia, vemos longas argüições no sentido de dar novas interpretações aos dispositivos normativos legais.
Enfim, com razão, internacionalmente e mesmo em nosso país, nossa Constituição está se assemelhando a um periódico!
Toninho Menezes é mestre em direito público, advogado e professor universitário.
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