OPINIÃO

O Prédio da Mogiana

Em 1887, uma locomotiva a vapor com um carro de passageiros e vagões de lastro inaugurava a linha ferroviária da Mogyana e o prédio da estação. Leia o artigo de Toninho Menezes.

Por Toninho Menezes | 02/04/2022 | Tempo de leitura: 3 min
especial para o GCN

Em 5 de abril do ano de 1887 –outra fonte cita ter sido no dia 11 de abril de 1887–, uma locomotiva a vapor com um carro de passageiros e alguns vagões de lastro inaugurava a linha ferroviária da Mogyana e o prédio da estação. Na ocasião, em seu entorno, existiam apenas duas casas, a de Antonio Nicácio e a de Simão Caleiro, e o restante da área, como dito na época, podia ser comparado a um deserto.

Passados quase 135 anos, no último dia 28 de março foi anunciado pelo governo municipal projeto para obras, reformas e modificações em vários pontos da cidade. Dentre as modificações consta o prédio da Estação Mogiana, tombado pelo Decreto nº 7420, de 11/08/1997, que prevê algumas limitações.

Abordando as questões jurídicas superficialmente, nesse momento, ocorre que, em nosso humilde entender, não foram observadas todas as limitações impostas para o projeto que foi apresentado.

A Constituição Federal de 1988 no artigo 23, incisos III a V, estabelece que: “É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: ...IV – impedir a evasão, a destruição e a descaracterização de obra de arte e de outros bens de valor histórico, artístico ou cultural; V – proporcionar os meios de acesso a cultura, a educação e a ciência...”. A Constituição acrescenta ainda no artigo 30, inciso IX que: “compete aos municípios promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual”. Também no artigo 216, parágrafo primeiro da Constituição, temos que: “O poder público, com a colaboração da comunidade, promoverá e protegerá o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros, vigilância, tombamento e desapropriação, e de outras formas de acautelamento e preservação”.

Não adentrando aqui às questões aquisitivas pela prefeitura no ano de 1986, ocorre que às formas aquisitivas e aos seus termos deveriam e devem ter total transparência e publicidade. As legislações normatizadoras para o patrimônio ferroviário divergem de outros bens tombados, pois as antigas ferrovias são revestidas de um grande valor cultural, uma vez que muitos municípios brasileiros surgiram e muitas regiões se desenvolveram em função das ferrovias e de suas estações.

Gostaríamos de saber, de ver, de analisar as autorizações dadas pelo Condephat (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico e Turístico) do município de Franca, documento necessário para qualquer intervenção em patrimônio tombado e principalmente na questão ferroviária que deve observar no mínimo a Constituição Federal, a lei nº 11483/2007, Estatuto das Cidades etc., que objetiva orientar, informar e estabelecer procedimentos a serem utilizados no âmbito do Patrimônio Cultural Ferroviário, sob a observação e fiscalização do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional).

No que tange ao Estatuto das Cidades e à Lei 11483/2007, para nós administrativistas, estas estabeleceram um novo instrumento de proteção aplicável aos bens do Patrimônio Cultural Ferroviário, que difere dos tombamentos comuns, instituído pelo Decreto-Lei nº 25/1937.

A propósito, o ato público anunciado pela prefeitura sequer respeitou entidade que foi criada décadas atrás, estava paralisada e que agora está novamente sendo reativada, cujo objetivo é exatamente preservar a memória cultural (sequer foi consultada).

Em síntese, entendemos e somos favoráveis à necessidade de se tomar providências nesse momento quanto à manutenção e revitalização do prédio da antiga Estação Mogiana, porém há a necessidade do cumprimento de algumas etapas que não foram efetivamente cumpridas ou informadas no presente caso, que devem ser esclarecidas e a elas dada publicidade, o que é requisito essencial para a prática do ato.

Talvez, enquanto se toma tais providências burocráticas, por que não cercar todo o entorno da Estação Mogiana, como foi efetuado na Igreja Matriz? Assim, evitaria a aglomeração de moradores de rua e a dilapidação do patrimônio público de relevância cultural.

Toninho Menezes é mestre em direito público, advogado e professor universitário.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

Fale com o GCN/Sampi! Tem alguma sugestão de pauta ou quer apontar uma correção?
Clique aqui e fale com nossos repórteres.

Receba as notícias mais relevantes de Franca e região direto no seu WhatsApp
Participe da Comunidade

COMENTÁRIOS

A responsabilidade pelos comentários é exclusiva dos respectivos autores. Por isso, os leitores e usuários desse canal encontram-se sujeitos às condições de uso do portal de internet do Portal SAMPI e se comprometem a respeitar o código de Conduta On-line do SAMPI.