OPNIÃO

Quantas advertências serão necessárias?

Na sessão da Câmara da última terça-feira (1º), a Comissão de Ética e Decoro Parlamentar advertiu por escrito e verbalmente a vereadora Lurdinha Granzotte (PSL) pelo compartilhamento de postagens de teor homofóbico em suas redes sociais. Leia mais no artigo de Guilherme Cortez.

Por Guilherme Cortez | 06/02/2022 | Tempo de leitura: 4 min
especial para GCN

Na sessão da Câmara da última terça-feira (1º), a Comissão de Ética e Decoro Parlamentar advertiu por escrito e verbalmente a vereadora Lurdinha Granzotte (PSL) pelo compartilhamento de postagens de teor homofóbico em suas redes sociais. Ávida disseminadora de conteúdos duvidosos em seu perfil pessoal, a vereadora replicou mensagens de apoio ao jogador de vôlei Maurício Souza, demitido do time em que jogava no ano passado após insinuar uma suposta degeneração moral por trás da representação do novo Superman como bissexual, e criticando a “lacração”. Em outra postagem, compartilhada das redes do deputado federal bolsonarista Carlos Jordy, ironiza que o personagem tenha se tornado ativista contra as mudanças climáticas numa edição das histórias em quadrinhos.

Filha do ex-vereador José Granzotte, Lurdinha foi eleita em 2020 para seu primeiro mandato com a menor quantidade de votos entre seus pares e é a única vereadora do PSL na Câmara. Sua principal base eleitoral são os servidores municipais de Franca, com quem trabalha desde 1984. Na Secretaria de Recursos Humanos da Prefeitura, Lurdinha se tornou a porta de entrada para os problemas diários de milhares de funcionários municipais, se tornando uma referência para a categoria.

Mas, em apenas um ano na Câmara, tem colecionado polêmicas, sendo o compartilhamento dos conteúdos que lhe renderam a advertência de seus colegas apenas a mais recente. No ano passado, a vereadora foi alvo de outros dois processos no Conselho de Ética pela sua participação pessoal em uma manifestação de rua que pedia o fechamento do Congresso Nacional e defendia a volta da ditadura militar. Na ocasião, Lurdinha foi advertida pela primeira vez, as representações foram arquivadas e sua então assessora pediu exoneração do cargo após discordar da participação no ato.

Apoiadora declarada do presidente Jair Bolsonaro, Lurdinha costuma usar suas redes para disseminar conteúdos da blogosfera bolsonarista, muitas vezes carregados de notícias falsas e conteúdos preconceituosos. Embora tenha sido votada por muitos para representar os servidores no Legislativo municipal, tem tropeçado no seu próprio fanatismo ideológico.

Na maioria das pautas discutidas na Câmara, Lurdinha se alinhou automaticamente ao governo Alexandre Ferreira, a quem apoiou no 2º turno das eleições, o que lhe garantiu continuar na Mesa Diretora pelo segundo ano consecutivo – passando de 2ª para 1ª Secretária da Casa. Em 2020, seu mandato foi um dos que votou contra o projeto de lei que pretendia instituir a Semana Municipal do Orgulho LGBT no calendário oficial de Franca sem que a vereadora tenha ao menos manifestado sua opinião e justificado as razões do veto.

Como representantes políticos legitimamente eleitos, é direito e dever dos vereadores se posicionarem de acordo com suas convicções e das ideias pelas quais foram escolhidos pela população. O problema começa quando esses posicionamentos vão na contramão das condições básicas para uma convivência democrática em sociedade. Por exemplo, não é razoável que um vereador ou vereadora, no exercício de um mandato democrático conferido pelos eleitores, participe de movimentos cujo teor é suprimir a democracia no país. Ou ainda que dissemine conteúdos de ódio, que incentive a discriminação ou afronte os direitos humanos.

A advertência recebida na última semana é o mínimo que se espera de uma Câmara cujos membros são eleitos pela população e tem o dever de exercer adequadamente suas funções. Não se pode admitir que vereadores utilizem sua posição institucional para disseminar discursos preconceituosos ou defender medidas antidemocráticas. Nenhum mandato parlamentar é um cheque em branco para se fazer o que bem entender. Não vale tudo só porque se tem um gabinete na Câmara. Pelo contrário: vereadores e vereadoras precisam ter tanta responsabilidade por seus atos quanto seus eleitores – ou até mais!

A discriminação e violência contra lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais é um problema grave em Franca e em todo país, que ostenta a vergonhosa marca de campeão mundial em mortes de pessoas da comunidade LGBT. O enterro da proposta da Semana do Orgulho no ano passado mostrou como ainda estamos atrasados em Franca nessa temática. Não podemos admitir ainda que pessoas eleitas e pagas por toda a população para defender os seus interesses e a cidadania usem dessa posição para fazer justamente o oposto. Espera-se que a nova advertência sirva para a vereadora rever suas posições e, acima de tudo, para que atitudes como essas não sejam novamente praticadas na Câmara.

Guilherme Cortez é advogado.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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