OPINIÃO

Contagem regressiva: começou o último ano do governo Bolsonaro

Só o tempo cobrará o preço desses quatro anos de marcha à ré na história do Brasil.

Por Guilherme Cortez | 02/01/2022 | Tempo de leitura: 5 min
especial para GCN

No 2º turno das eleições de 2018, quando grupos bem-intencionados, majoritariamente formados por jovens e estudantes – dentre os quais estava o autor desta coluna –, montaram banquinhas com bolo e café nas ruas e bateram de porta em porta para convencer seus vizinhos de que a vitória do então deputado Jair Bolsonaro representaria uma tragédia para o país, ninguém poderia imaginar que essa previsão seria levada a máxima potência.

Três anos se passaram desde que Bolsonaro vestiu a faixa presidencial em frente ao Palácio do Planalto. Seu histórico como um deputado federal improdutivo e caricato, que ganhou notoriedade por proferir baixarias contra seus desafetos – como xingar uma outra deputada de ‘vagabunda’ depois de dizer que não a estupraria porque ela não merecia e homenagear, no plenário da Câmara, um torturador conhecido por inserir ratos nas vaginas de suas vítimas –, já prenunciavam maus bocados para o povo brasileiro.

O primeiro ano de seu governo foi o que se podia esperar. Bolsonaro montou um ministério de pessoas desqualificadas, muitas delas fanáticas e extremistas. Para falar só dos mais notáveis: colocou um acusado de crime ambiental para comandar o Ministério do Meio Ambiente, uma fundamentalista religiosa a frente do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos (antes apenas Ministério dos Direitos Humanos), um conspiracionista debilóide para ser responsável pelas relações internacionais do país e, para coroar, premiou o juiz que tirou seu principal oponente da eleição com o superpoderoso Ministério da Justiça. Vira e mexe, o Brasil descobre outra personalidade macabra que faz parte dos altos escalões do governo, como o secretário de Cultura que, no começo de 2020, imitou uma peça de comunicação nazista ou o assessor presidencial que, em uma sessão filmada do Senado, fez um gesto associado aos supremacistas brancos dos Estados Unidos.

Não podia dar certo e não deu. Logo o Brasil começou a chamar a atenção do mundo pela onda de incêndios e desmatamento que devastaram a Floresta Amazônica, o Pantanal e outros biomas nacionais. Sob a batuta de ministros aloprados, a educação se tornou um terreno de batalha ideológica, com ameaças de intervenção em livros didáticos e no ENEM e de cortes de verbas em universidades públicas. Mas nada poderia nos preparar para o que veio em seguida.

No começo de 2020, o planeta foi surpreendido por um novo e perigoso vírus, que se disseminava muito rapidamente através do contato entre as pessoas. Países do mundo inteiro paralisaram suas atividades e mandaram seus cidadãos ficarem em casa para evitar o contágio. Na contramão, Bolsonaro foi em rede nacional de rádio e TV menosprezar os riscos da nova doença, o que logo se transformou em uma campanha sistemática do seu governo contra as medidas de prevenção. Sempre que pôde, o presidente promoveu e incentivou aglomerações, evitou o uso de máscaras, minimizou os números de casos e mortes causados pelo coronavírus e desacreditou ora o isolamento social, ora a vacina.

Não parou por aí. Não fosse suficiente a cifra de 600 mil brasileiros mortos pela covid-19, o país mergulhou em uma profunda crise econômica. Sob o comando de Paulo Guedes – o admirador do ditador chileno Augusto Pinochet que Bolsonaro dizia ser seu “posto Ipiranga” –, o Brasil bateu recorde de desemprego, com 14,8 milhões de brasileiros fora do mercado de trabalho no primeiro trimestre de 2021, a inflação atingiu o maior índice desde o começo do Plano Real e o brasileiro viu a gasolina passar de R$6,00 o litro.

Com a aprovação popular em queda livre e acuado por denúncias de corrupção envolvendo sua própria família – como a denúncia de ‘rachadinha’ no mandato do senador Flávio Bolsonaro e a mal explicada história dos cheques depositados na conta da primeira-dama –, o presidente teve que radicalizar para manter sua estreita base de apoiadores fanáticos. Assim, proferiu bravatas contra o Supremo Tribunal Federal, ameaçou descumprir decisões judiciais, colocou em dúvida as eleições do ano que vem e flertou com iniciativas golpistas. Sem força para levar a cabo seus intentos autoritários, recuou humilhado.

A distribuição de recursos públicos através de emendas parlamentares e do recém-revelado “orçamento secreto” permitiram ao governo afastar a ameaça dos mais de 100 pedidos de impeachment contra o presidente até agora. Embora ostente uma longa lista de violações à Constituição, o afastamento de Bolsonaro antes do fim de seu mandato parece pouco provável.

Mas se a chave do cofre permitiu ao presidente completar três anos de mandato, não conseguirá evitar o encontro com o calendário eleitoral. No dia 2 de outubro deste ano, os brasileiros vão votar no 1º turno das eleições presidenciais. Segundo o instituto de pesquisas Datafolha, se a votação fosse hoje, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva seria vitorioso, com 48% das intenções de voto contra menos da metade (22%) de Bolsonaro. Lula, aliás, também liderava as pesquisas para as eleições de 2018 quando foi afastado da disputa por uma condenação judicial – depois anulada –, abrindo caminho para a vitória do atual presidente.

Ajudado pela ausência de seu principal adversário, Bolsonaro ganhou as eleições passadas em cima de uma campanha de desinformação, alimentando mentiras e preconceitos da população. Conseguiu convencer muita gente de que estava em jogo a derrota de um projeto de perversão moral e sexual da sociedade. Agora, com milhões de brasileiros desempregados, passando fome e/ou com familiares perdidos para a covid-19, vai ter mais dificuldade para repetir esse feito. Teorias da conspiração bizarras não enchem o prato de ninguém.

Enquanto a população do sul da Bahia sofre com intensas chuvas que causaram deslizamentos de terra, destruíram casas e arruinaram cidades inteiras, o desalmado presidente tirou férias e se divertiu em Santa Catarina, andando de jet-ski, posando em frente a bares e visitando parques. Não apenas um mal governante, Bolsonaro também é um péssimo ser humano. Só o tempo cobrará o preço desses quatro anos de marcha à ré na história do Brasil, mas uma coisa é certa: 2022 será o último ano de seu governo.

Guilherme Cortez é advogado

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

Fale com o GCN/Sampi! Tem alguma sugestão de pauta ou quer apontar uma correção?
Clique aqui e fale com nossos repórteres.

Receba as notícias mais relevantes de Franca e região direto no seu WhatsApp
Participe da Comunidade

COMENTÁRIOS

A responsabilidade pelos comentários é exclusiva dos respectivos autores. Por isso, os leitores e usuários desse canal encontram-se sujeitos às condições de uso do portal de internet do Portal SAMPI e se comprometem a respeitar o código de Conduta On-line do SAMPI.