OPINIÃO

Afinal, existe tratamento precoce contra a covid?

Da Pré-História até os dias de hoje, passando por curandeiros, alquimistas, sacerdotes e feiticeiros, a humanidade levou muito tempo para encontrar uma forma de comprovar seus conhecimentos e validar suas descobertas. Deu-se a ela o nome de “método científico”, um conjunto de etapas para aferir e comprovar diversas vezes se uma determinada ideia está correta

Por Guilherme Cortez | 11/04/2021 | Tempo de leitura: 4 min
Especial para o GCN

Enquanto a pandemia bate recordes diários de mortes no Brasil (que se tornou responsável por mais de um quarto dos óbitos por covid-19 no mundo), milhões aguardam a tão sonhada vacina e a fome volta a ameaçar os lares de famílias brasileiras, cada vez mais pessoas buscam maneiras de se proteger contra o vírus.

Com patrocínio e propaganda direta do governo federal e do próprio presidente, muita gente recorre ao chamado “kit covid”, também apelidado de “tratamento precoce”, um conjunto de medicamentos que supostamente preveniriam as pessoas contra a contaminação. O problema: comprovadamente, nenhuma dessas substâncias apresenta qualquer efeito contra o coronavírus. Quem diz isso não sou, mas especialista, estudiosos, pesquisadores e estudos científicos de instituições respeitadas, após intensos testes.

Essa moda ganhou tanta força que chegou até o prédio da Prefeitura de Franca, de onde o atual prefeito Alexandre Ferreira determinou, ainda no seu primeiro mês de governo, a compra “emergencial” de cloroquina, azitromicina e ivermectina (medicamentos que integram o “kit covid”) para serem usadas na prevenção ao coronavírus na cidade. Como resultado, a Justiça atendeu à uma ação popular e proibiu a compra e divulgação de medicamento sem eficácia comprovada pela ciência e pelos profissionais da área da saúde no tratamento contra a covid.

É justo que as pessoas se perguntem: mas se o corpo é meu, se a saúde é minha, eu não posso usar o remédio que bem entender? Bom, ninguém pode fazer nada se uma pessoa quiser passar a vida inteira tomando dipirona ou bebendo café cinco vezes ao dia com o objetivo de se prevenir contra um câncer. O problema é que nem o uso de dipirona e nem a ingestão de cafeína surtem qualquer efeito real na prevenção ao câncer. Na prática, a pessoa vai continuar vulnerável, enquanto pensa estar protegida, e talvez até deixe de se atentar para outras medidas e cuidados que poderiam resguardar sua saúde – como uma alimentação saudável, o hábito de fazer exercícios e a realização de exames regulares. No pior dos casos, o uso exagerado de determinadas substâncias sem necessidade pode trazer sequelas para a saúde, levar ao adoecimento e até mesmo à morte. Não à toa, os registros de reações adversas ao uso da hidroxicloroquina, medicamento mais recomendado pelo presidente da República (que não é médico e nem profissional da área da saúde), subiram 558% em 2020 em comparação ao ano anterior e a Anvisa já registrou 9 óbitos causados por conta desses efeitos.

No caso da covid, a situação é ainda mais preocupante, porque o coronavírus se espalha com muita facilidade entre a população. Dessa forma, se alguém acha que está protegido, deixa de seguir as medidas que comprovadamente surtem efeito na prevenção e se expõe ao vírus, não está colocando em risco apenas a sua saúde, mas a de muitas outras ao seu redor, inclusive familiares e pessoas queridas. E ainda mais no caso de um prefeito, que é responsável por administrar o orçamento de uma cidade inteira, não é adequado que invista o suado dinheiro dos contribuintes em empreendimentos que não possam trazer os resultados esperados.

Da Pré-História até os dias de hoje, passando por curandeiros, alquimistas, sacerdotes e feiticeiros, a humanidade levou muito tempo para encontrar uma forma de comprovar seus conhecimentos e validar suas descobertas. Deu-se a ela o nome de “método científico”, um conjunto de etapas para aferir e comprovar diversas vezes se uma determinada ideia (por exemplo: que determinado medicamento tem efeito contra a covid) está correta. Foi por essa série de testes que as vacinas aprovadas, o uso de máscaras de proteção facial e o distanciamento social passaram e tiveram resultados satisfatórios. E que os medicamentos do “kit covid” foram rejeitados.

Até agora, o “tratamento precoce” com eficácia comprovada contra a covid é: uso de máscaras, higienização frequente, distanciamento entre as pessoas e vacinação. Parece pouco, mas é o que temos de mais significativo na luta contra o vírus nesse momento. Infelizmente, não basta querermos para que outras soluções possam cair dos céus.

Mas não acredite em mim: pesquise por sua própria conta em fontes confiáveis e veja o que estão dizendo os principais conhecedores do assunto, o que está sendo produzido e pesquisado no Brasil e no mundo. E enquanto somos bombardeados pela propaganda de placebos, perdemos mais brasileiros na espera pelas vacinas que o governou boicotou a compra.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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