Ainda, mulher...

Por Lúcia Brigagão | Especial para o GCN
| Tempo de leitura: 3 min

Quando lhe pediam algo, perguntavam o óbvio ou algo também difícil de explicar, tia Fia começava a resposta com “Ara, gente!”. “Ara, gente! Claro que pode!”, “Ara, gente! Que importância tem?”. “Ara, gente!” isso e aquilo... Pediram-me para definir Mulher. Mulher? Pensei, pensei e nada. Saiu dos confins da memória a expressão da tia Fia e respondi: “Ara, gente!” E eu lá sei?”

Difícil definir. Definir significa “determinar a extensão e os limites de determinado objeto ou coisa ou ser”. Assim, responda – obviamente sem usar o “Ara, gente!” da tia Fia - alguém consegue determinar quando ela começa a ser ou em que momento a mulher deixa de ser mulher ou de ter características próprias? (Com três anos, enquanto o menino abre e fecha as portas do seu carrinho, ela já escolhe o que pôr no cabelo, o que vai vestir, passa batom e pinta os olhos...) Certo: definir é demarcar. Diz: quem conseguiria pegar régua, compasso, ou mesmo esquadro e traçar retas e curvas em torno dela, configurando seu perfil, enquadrando-a? Mulher é ser ilimitado, com demarcações que não obedecem ao senso comum e vão além do óbvio!

Definir significa “enunciar os atributos essenciais e específicos de (uma coisa), de modo a torná-la inconfundível”. Vamos lá: mulher é aquele ser que possui sexto sentido; é capaz de perceber (e apontar) detalhes manifestos de forma sub-reptícia, despercebidos pelo mais atento dos observadores ... principalmente se o alvo é outra mulher e, claro, mais bonita que ela, o que finge desconhecer e não admite nem para si, nem para ninguém. Tem faro para perceber o perigo apenas sugerido e é capaz de desempenhar mais de uma tarefa simultaneamente: atende telefone, prepara mamadeira, anota recado, abre porta, desliga a luz e ainda faz careta, pedindo para que deixem a televisão ligada... (Tem alguma outra “máquina” assim?)

Definir é explicar o significado de; é indicar o verdadeiro sentido de; é dar a conhecer de maneira exata; expor com precisão; explicar, esclarecer... Esforcemo-nos; pensemos: de onde vem a Mulher? Ara! de outra mulher, claro! Que outro ser conseguiria descrever a extensão e profundidade da emoção que a mulher experimenta ao saber que tem um outro ser boiando dentro dela? Ara! Só outra mulher, que tiver vivido a mesma experiência! Quando uma mulher se faz mulher: quando menstrua? Quando tem sua primeira relação sexual? Quando escolhe seu primeiro sapato de salto? Usa um sutiã? Não. E nenhum homem vai entender o momento: é quando ela descobre nova utilidade para objetos comuns. Vi minha neta pegar flor de seda, se olhar de viés no espelho, lentamente prender o adereço nos cabelos levantando uma mecha, se analisar refletida de um lado, de outro, aprovar o que viu, pegar o batom vermelho da avó, pintar a boca. Acompanhei o brilho do olhar, o leve sorriso nos lábios e principalmente a aprovação final da visão estática no espelho: ela havia se descoberto mulher ... embora tivesse apenas seis anos. Mulher que é mulher já nasce feita e basta ser incentivada por fugaz instante de feminilidade que sai do casulo e se transforma. (Poucas vezes vi um momento tão lindo.)

Por tudo isso, dizer que Mulher é o “ser humano do sexo feminino” é muito pouco. Reduzí-la a “parceira sexual do homem”, é restringir sua função e utilidade. Dizer que é o ser possuidor de “qualidades e sentimentos femininos” é o mesmo que admitir que homens são brutos e insensíveis, quando eles não o são. Ara, gente! Que definir, que nada! Mulher é “bicho esquisito, todo mês sangra” ... e sobrevive. Mulher é fonte de vida. Mulher é ... ara, gente! mulher é aquele ser especial que é homenageado todo dia 8 de março.

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