Minha infância foi uma "época de ouro"

Há algum tempo venho efetuando comparações entre a infância e juventude de outrora com os tempos de hoje e, as diferenças são assombrosas, em razão dos poucos anos decorridos. Olhando para trás e comparando-se às regras atuais, é difícil acreditar que a nossa geração esteja viva até hoje, pois nós tivemos a sorte de sermos a última geração a viver ainda como crianças.

Por Toninho Menezes | 07/03/2021 | Tempo de leitura: 4 min
Especial para o GCN

Em 11/09/2003, escrevemos no Jornal Comércio da Franca, esse mesmo artigo, que agora na época das redes sociais, sempre vemos replicados, com algumas mudanças. Assim pedimos licença para republicar o que escrevemos há dezoito anos atrás.

Há algum tempo venho efetuando comparações entre a infância e juventude de outrora com os tempos de hoje e, as diferenças são assombrosas, em razão dos poucos anos decorridos. Coincidentemente, recebemos recentemente e-mail de um amigo que direcionava o assunto exatamente para tal linha de raciocínio. Hoje gostaríamos de aqui abordar tal tema, para que todos nós que vivemos em tal período de ouro, refletíssemos a respeito das dificuldades de ser criança e adolescente nos dias de hoje.

Olhando para trás e comparando-se às regras atuais, é difícil acreditar que a nossa geração esteja viva até hoje, pois nós tivemos a sorte de sermos a última geração a viver ainda como crianças.

Na minha infância, saíamos de casa após as aulas, pois em casa não tínhamos TV a cabo com mais de cem canais, vídeo games, surround sound, computadores com internet etc. Assim aproveitávamos o resto dia despreocupadamente, pois a violência nas ruas era coisa rara. A maior violência era entre nós mesmos quando brigávamos por desentendimento no campinho de futebol às margens do córrego dos Bagres, porém aprendemos cedo a superar isto, pois passado o desentendimento, a amizade continuava a mesma e, até era reforçada.

Nós vivíamos correndo, brincando, inventando e improvisando coisas com restos de materiais. Gastávamos muito tempo tentando construir nossos carrinhos de rolimã para testá-los na descida da Rua General Telles, e só então perto do Calçados Francano percebíamos que tínhamos esquecido de um pequeno detalhe, não havia freios. Assim, depois de vários erros, colisões e esfolados, aprendíamos por nós mesmos a resolver os problemas surgidos.

Apanhávamos e comíamos frutas, compartilhávamos os mesmos copos e recipientes, comíamos doces, balas e outras guloseimas ricas em açúcar, corantes artificiais, produção artesanal. Imaginem que bebíamos água direto dos riachos, córregos e minas, e não de garrafas e em copos descartáveis e, embora nos dissessem, nunca passamos mal, ou tivemos dor de barriga para sempre, ou uma contaminação fatal, enfim ninguém morreu por isso. Muito pelo contrário, estávamos sempre ao ar livre, não éramos crianças obesas e doentias, com crescimento à base de medicamentos.

Imaginem que loucura! Pois andávamos de bicicleta, sem capacete, passeávamos nos carros sem cinto de segurança. Não tínhamos telefone celular para nos localizar, não possuíamos tênis importados, não nos importávamos com as marcas de nossas roupas, quando muito sonhávamos com uma calça “Lee”, mas não éramos mais felizes ou menos se não possuíamos tal “luxo”. Não tínhamos vergonha de possuir somente uma roupa de “ir à missa”, como chamávamos nossa roupa mais nova, pois a situação não era fácil, porém a vida era cheia de perspectivas e esperanças, bastava lutar e ser persistente para alcançá-las.

Na escola tínhamos competições interclasses e de conhecimento e, olha que absurdo, aqueles alunos com mais dificuldades eram reprovados e repetiam o ano. Ainda não haviam “solucionado o problema da educação” inventando o fantástico e o revolucionário método da aprovação automática, utilizada nos dias de hoje, que atraso não!

Nós aprendemos a respeitar os mais velhos e a resolver os nossos próprios problemas, tínhamos a liberdade de ação mas arcávamos com as conseqüências de nossos atos. Nossos pais eram cidadãos que respeitavam as leis e, exigiam que assim fizéssemos também.

Na minha geração nós tivemos amigos mesmo e, não amizades de interesses como as de hoje, e cultuamos essas amizades sinceras que persistem apesar do tempo.

Hoje refletindo sobre a minha geração, acredito que fomos os últimos ainda a crescer como crianças. Em razão de nossa capacidade de enfrentar problemas, por nós mesmos, sem o auxílio de equipamentos e outras “geringonças”, que a propósito induzem as crianças de hoje a uma “preguiça mental”, podemos dizer que: nos últimos 50 anos surgiram alguns dos melhores desafiadores de riscos, negociadores, pesquisadores, inventores e criadores, numa explosão de inovações e idéias. Houve liberdade, fracasso, sucesso e principalmente responsabilidade, numa esplendorosa criatividade humana.

Comparando-se gerações, hoje, falta dar à criança “um pouco de tempero”, um “pouco de cor” à sua vida. Perdemos a qualidade das canções, das danças, da literatura, da pintura, da arquitetura, dos esportes, da educação etc. A vida atual é tão somente destinada a fazer dinheiro rapidamente. A qualidade das coisas foi deixada de lado por ser trabalhosa e não trazer retorno financeiro imediato.

Apesar disto acreditamos que sempre é tempo de suceder, tenho esperanças que as crianças possam encontrar alguém que lhes dê uma orientação sobre a verdade da vida, o amor, o sentimento, a evolução e a morte. Talvez nesse momento voltem a se dedicar a ter amigos, a ouvir música, a cantar, a pintar, a ler, a escrever e, até a cometerem algumas travessuras sadias.

“É mais fácil construir um menino do que consertar um homem” (Charles Chick Govin).

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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