'MÃES DA SÉ'

'Nós não vivemos, nós sobrevivemos', diz mãe de filha desaparecida há 25 anos

Por Heloísa Taveira | da Redação
| Tempo de leitura: 3 min
Estadão Conteúdo
Ivanise segura fotos de sua filha. Uma, feita quando a menina tinha 13 anos. Outra, uma simulação que mostra como ela estaria hoje
Ivanise segura fotos de sua filha. Uma, feita quando a menina tinha 13 anos. Outra, uma simulação que mostra como ela estaria hoje

A fundadora e líder do grupo "Mulheres da Sé", uma ONG que ampara milhares de famílias pelo país que sofreram com o desaparecimento de algum de seus membros, participou nesta segunda-feira, 5, do programa A Hora é Essa!, da rádio Difusora AM 1030 khz. Em entrevista ao jornalista Corrêa Neves Júnior, Ivanise contou sua história e o trabalho que desenvolve há 24 anos. A iniciativa começou um ano depois do desaparecimento de Fabiana, sua filha, aos 13 anos.

Ivanise sente a mesma dor que Camila Alves, mãe de Wesley. O drama que Camila vive há 38 dias, Ivanise vive há 25 anos. Tudo começou em 1995, em Pirituba, bairro da zona Oeste de São Paulo. A filha de Ivanise, Fabiana, tinha 13 anos e saiu no final da tarde de uma sexta-feira. Ela foi até a casa de uma das colegas de escola, que fazia aniversário no dia, para dar um abraço. Fabiana não foi sozinha. Uma outra colega a acompanhou durante a ida, e na volta. AMbas se despediram para prosseguir até o caminho de suas casas. Fabiana estava a 120 metros de sua casa. Depois disso, nunca mais foi vista.

“Eu já comecei a procurar imediatamente e em todas as ruas próximas da minha casa. Perguntei para muitas pessoas, mas ninguém sabia de nada. Isso foi até umas 2h30 da manhã. Quando eu esgotei as minhas buscas, fui na delegacia e para a minha surpresa, o delegado mandou eu voltar para casa e disse ‘volta para casa, mãe. Até amanhecer a sua filha já voltou’. Já se passaram 25 anos e esse dia não chegou. Eu vivo um luto inacabado”, disse Ivanise.

Desde então, Ivanise não teve mais nenhum dia de descanso. Apesar dos muitos anos, ela segue confiante. “Eu prefiro confiar na minha intuição de mãe. A minha intuição e meu coração de mãe dizem que minha filha está viva em algum lugar deste planeta. É em cima disso que eu tenho sobrevivido ao longo desses 25 anos”.

A ONG “Mães da Sé” foi criada com o objetivo de acolher outras mães e famílias que passam pela mesma angústia. “Tenho mais de 10 mil pessoas que já passaram por aqui. Eu resolvi me juntar às outras mães, porque quando eu vivi a minha dor isoladamente, eu cheguei à beira da loucura. A partir do momento em que eu resolvi compartilhar a minha dor com outras mães, eu fui aprendendo a conviver com essa dor de uma forma mais amena”, disse. A ONG já ajudou a solucionar 5.016 casos de desaparecimento ao longo de todos esses anos.

Entre todos os casos já presenciados, a fundadora do projeto percebe uma semelhança em quase todos eles: a omissão das autoridades diante um caso de desaparecimento. “Para o estado os nossos filhos são números. O estado é ausente, negligente. Os nossos filhos fazem parte apenas de uma estatística. A mãe chega na delegacia e o delegado já tem na ponta da língua o que ele acha que aconteceu. Se é menino, fugiu de casa porque é viciado em drogas ou porque foi para a balada. Se é menina, está com o namoradinho”. Somente no ano de 2019, mais de 24 mil pessoas desapareceram no estado de São Paulo.

Para Camila, mãe de Wesley, Ivanise deixou um recado. “Que não perca a fé. Nós, como mães, não podemos desistir do bem mais precioso que Deus nos deu, que são nossos filhos. Que ela continue procurando, buscando e cobrando as autoridades. Não perca a esperança, porque é a esperança que nos mantêm vivas. Nós mantemos acesa a esperança de um reencontro único, mesmo não sabendo o dia e o horário que isso vai acontecer".

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