BIOGRAFIA

Francana na TransArte


| Tempo de leitura: 4 min
Janaína Leão é pessoa que parece sempre em movimento
Janaína Leão é pessoa que parece sempre em movimento

Estudiosa desde os primeiros anos escolares, curiosa em relação ao mundo, instigada pelos fatos da vida, Janaína Leão é pessoa que parece sempre em movimento. Entrou e saiu de vários cursos, de Filosofia a História, até se decidir por Psicologia. Mas tem sido na Arte o verdadeiro encontro consigo. A escrita foi sua tábua de salvação, desde cedo, quando reagiu ao bullying escrevendo. Ela é autora de três livros e de mais de uma centena de textos para o caderno Nossas Letras deste Comércio. Por outro lado, seus dons para o artesanato tem lhe permitido criar peças originais. À literatura e ao artesanato soma-se a fotografia. Quando decidiu comprar uma câmera, descobriu-se, como define, “artesã da luz”. Fotografar lhe ensejou uma vida que nunca havia tido e ela percebeu que se libertava nesse ofício. Da fotografia para o cinema foi um pulo. Hoje em dia concilia todas essas atividades. Há poucos dias, teve um documentário escolhido para fazer parte do Festival TransArte, que acontece no Rio de Janeiro nos dias 12, 13 e 14 próximos, na já célebre Escadaria Selarón. Para falar sobre o evento e questões ligadas à sexualidade, o Comércio a entrevistou na quarta-feira.

O que é a TransArte?
É um evento que reúne pessoas Lgbti a fim de aprofundar questões como identidade de gênero e mostrar a produção artística delas.

O que são pessoas Lgbti?
Vamos à sigla: lésbica- mulher que se sente atraída por outras mulheres; gay- homem que se sente atraído por outros homens; bissexual- pessoa que sente atração por homens e mulheres; transexual/transgênero - pessoa que busca transição pois não se identifica com o gênero que lhe designaram. Existem aí infinitas possibilidades de ser e a noção de que trans é a pessoa que busca “trocar de sexo” é ultrapassada. Existem trans que não se identificam com nenhum dos dois gêneros; existem pessoas que se identificam com os dois; então fica claro que não dá para enquadrar tudo numa caixinha. Travesti é muito mais uma denominação política e uma maneira de se posicionar no mundo. Intersexo é a pessoa que nasceu com características dos dois gêneros, masculino e feminino, e sua luta é para que uma redefinição não seja feita até que ela possa decidir por si mesma. Pessoa cisgênero é aquela que se identifica em todos os aspectos com o gênero que lhe foi designado.

Como tomou conhecimento do festival?
Uma amiga transexual viu um edital de chamada de curta metragens. Como ela já havia visto o meu curta quando o apresentei no I Fórum da Mulher de Franca, me incentivou a enviar o trabalho. Eu já tinha conhecimento do Festival, pois ele está na sua 4ª edição. Foi uma alegria receber o e-mail dizendo que meu trabalho tinha sido selecionado entre tantos outros do Brasil.

Desde quando trabalha com cinema?
Desde os quinze anos sonhava em fazer cinema. Quando comprei a máquina fotográfica passei a captar imagens e tomei gosto por isso. Há três anos criei um projeto fotográfico chamado Libertes – o registro da diversidade do ser – e desde então tenho filmado as pessoas que posam para minhas lentes – todas elas Lgbti. Surgiu disso a necessidade de um curso de edição de vídeos. Passei o ano de 2018 estudando no Senac para conseguir produzir sozinha tanto o documentário do meu projeto quanto este que fiz sobre minha vida.

Então o documentário a ser apresentado no TransArte é uma autobiografia?
Janaína- Sim, é minha biografia, pois sempre me pareceu que as pessoas não acreditam que a opressão sofrida por Lgbti pode ser fatal. Decidi falar sobre minha vida como pessoa “não binária”, com a intenção de revelar as opressões que sofremos. Uma mulher que não performa feminilidade e que não se dobra ao patriarcado apanha muito, por variados motivos. Contei minha história e como enfrentei tudo, como renasci diversas vezes e como aprendi a contornar situações. Criei o vídeo para inspirar outras mulheres e recebi um feedback excelente quando o apresentei no Forum da Mulher, na Unifran.

Qual será sua contribuição ao TransArte?
Mostrar o que o Viktor Frankl definiu tão bem numa frase:“Quem tem um porquê, enfrenta qualquer como.” Usarei meu curta para inspirar quem precisa de forças, quem assim como eu já esteve desamparado e sozinho no mundo e teve que se reinventar, se aceitar e peitar a sociedade de forma criativa. Eu acho a criatividade a maior ferramenta de sobrevivência que existe.

Como vê o movimento LGBT no mundo?
Está na pauta do momento. Fui às lágrimas quando o Supremo Tribunal Federal criminalizou a homofobia. Senti que fomos justiçados. O Brasil é um dos países que mais mata transexuais e travestis no mundo, só perde para o México. É muito ódio. Conflitantemente aqui também é o país que mais consome pornografia com estes corpos. Como sou pessoa que vive na pele tudo isso, me dói muito saber que ainda existem países que condenam à morte pessoas homossexuais. Nós vivemos num planeta que tem realidades muito discrepantes, mas vejo a internet e a globalização como uma rede de proteção. 

As pessoas estão trabalhando melhor seus preconceitos?
Vejo que meus amigos e pessoas próximas a mim e meus projetos, sim. Não tenho informação além disso, mas percebo que é uma tendência, como se quem não acompanhar as mudanças fosse ficando para trás. O mundo tem seu próprio ritmo, as pessoas aceitando ou não nós estamos aqui e vamos cada vez mais ocupar nossos espaços de existência, de fala. 

Fale com o GCN/Sampi!
Tem alguma sugestão de pauta ou quer apontar uma correção?
Clique aqui e fale com nossos repórteres.

Comentários

Comentários