Delações, confissões e muito mais

Nesta última semana, ironicamente quando o Brasil comemorava seus 195 anos muita coisa veio à tona.

10/09/2017 | Tempo de leitura: 4 min

Não podia ter sido mais constrangedor — e nem, pior. Nesta última semana, ironicamente quando o Brasil comemorava seus 195 anos de independência, uma sucessão de revelações serviu para deixar claro que quando se trata de roubalheira e falta de escrúpulos muitos políticos e empresários brasileiros desconhecem quaisquer limites, ignoram noções básicas de civilidade, eximem-se do mais elementar respeito por quem quer que seja.
 
Tome-se o exemplo de Geddel Vieira Lima. Baiano, ex-deputado federal, ex-vice-presidente da Caixa Econômica, ex-ministro de Estado e, agora, neo-presidiário, Geddel conferiu nova dimensão ao conceito de “guardar dinheiro em casa”. Num apartamento emprestado por um empresário ao irmão de sua antiga Excelência, a polícia encontrou inacreditáveis R$ 51 milhões. Para ser exato, 42.643.500 em reais e 2.688.000 em dólares, divididos em oito caixas e seis malas espalhadas desmazeladamente pela sala. Queria muito ouvir a versão do “emotivo” baiano sobre a origem — e o destino — daquela dinheirama. O que será que ele vai inventar para justificar a posse de um prêmio da Mega-Sena esparramado no chão de um apartamento? Tudo em espécie, sem declaração no Imposto de Renda, sem mínimo lastro. Não duvido que o baiano, que desembarcou em Brasília disfarçado de pai-de-santo, vá apelar a alguma “mandinga” para justificar o injustificável.
 
Teve também o áudio do goiano Joesley “Friboi” Batista, a primeira voz da dupla com Wesley, o bilionário rei da carne que, muito em breve, deve ocupar um trono na Papuda. Joesley tinha conseguido um feito. Corrupto serial, armou um conluio com um procurador para gravar o presidente da República e outras autoridades em diálogos comprometedores. De posse de gravações indecorosas, conseguiu um acordo com o Ministério Público Federal tão bom que ficava perdoado por qualquer crime cometido e ainda garantia que não seria processado no futuro. Estava livre para viver onde quisesse, sustentado pelos bilhões da empresa construída com dinheiro farto generosamente subsidiado pelo BNDES, sua linda mulher a tiracolo e toda sorte de confortos que se possa imaginar, sem que os brasileiros, pasmos, pudessem fazer qualquer coisa além de demonstrar indignação.
 
Mas Joesley, além de bandido, é estúpido. Gravou, aparentemente sem perceber, mais de quatro horas de uma desavergonhada conversa com um diretor de sua empresa, um certo Ricardo Saud. Nos diálogos, regados a bebida (muita), picanha (de aperitivo) e lagostim (de prato principal), Joesley se gaba de sua “esperteza”, diz que para conseguir explodir todo mundo e se safar só ele mesmo, ridiculariza a presidente do Supremo Tribunal Federal e outros ministros da Corte, o Procurador Geral da República, um sem número de autoridades e ainda fala calmamente sobre adultérios cometidos e a cometer, reservando seu apurado estilo narrativo para compartilhar com o colega de trabalho sua tara por “velhinhas de 50 anos” e outras pérolas mais. 
 
Um dos homens mais ricos do país muito mais por conta de suas conexões do que por sua inteligência, como resta agora comprovado, Joesley se desesperou quando surgiram informações que apontavam a recuperação de alguns arquivos daquele dispositivo onde ele tinha gravado o presidente Michel Temer. Temendo comprometer o acordo do perdão desavergonhado, apressou-se em entregar o arquivo original. Sim, foi o próprio Joesley quem passou a gravação que enterrou seu futuro para as autoridades. Bom para o Brasil, péssimo para ele. Não consigo deixar de pensar no que ele deve ter dito para a sua mulher sobre suas confissões de própria voz.
 
Houve ainda na mesma semana o depoimento do quase conterrâneo Antônio Palocci Filho, homem de muitos adjetivos e nenhum caráter. Fundador do PT, amigo de Lula há 30 anos, ex-prefeito de Ribeirão Preto, ex-deputado federal, ex-ministro de dois governos e, mais recentemente, o “italiano” das planilhas da corrupção da Odebrecht. Em depoimento ao juiz Sérgio Moro, Palocci foi tão direto que, num primeiro momento, choca quem assiste à gravação. De bate-pronto, diz que “procedem” as acusações de corrupção do Ministério Público. Sem rodeios, sem firulas, sem desculpas.
 
Perguntado pelo advogado de Lula sobre os detalhes de uma suposta reunião que envolveria o ex-presidente, Palocci foi na jugular. “Suposta, não. Eu estava lá (...) Constava da agenda do presidente, (aconteceu) no Palácio”, vociferou Palocci, num cala-boca já histórico. Foi neste encontro que, segundo o ex-ministro, soube-se que havia uma propina de R$ 300 milhões pactuada para Lula/Dilma. Isso mesmo, nada menos do que 6 Geddeis — só neste esquema, e só para o criador e a criatura. Não sem razão, Palocci disse que Lula tinha um “pacto de sangue” com Emílio Odebrecht. Fico imaginando o resto.
 
Claro, Palocci não vale nada. Sua dimensão moral tem a estatura de uma sarjeta. No mesmo depoimento, em outra resposta ao advogado de Lula, que queria saber porque só agora o ex-ministro e, arrisco dizer, também ex-amigo, resolvera falar, Palocci disse o óbvio. Porque, depois de 30 anos de roubalheira, quer aproveitar os benefícios da lei para quem dedura. Arrependimento? Se tem, não disse. Cá entre nós, duvido muito. É mera questão de sobrevivência.
 
Geddel, Joesley e Palocci conseguiram surpreender todo mundo pela extensão de seus crimes, a podridão dos respectivos comportamentos e a nulidade absoluta de qualquer vestígio de decência que pudesse neles subsistir. No país do mensalão e do petrolão, da Odebrecht e da OAS, conseguir um impacto desta magnitude, uma reunião de predicados desta natureza, é proeza para poucos. Muito poucos. 

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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