Uma tarifa absurda

A empresa São José conseguiu convencer o poder público a fixar a passagem em R$ 4,10, o que coloca a tarifa de Franca como uma das mais caras do Brasil, acima do cobrado em Ribeirão Preto (R$ 3,95).

30/07/2017 | Tempo de leitura: 4 min

A prefeitura de Franca anunciou, na última sexta-feira, o novo valor da tarifa do transporte coletivo da cidade, um petardo que começa a vigorar nesta semana. A empresa São José conseguiu convencer o poder público a fixar a passagem em R$ 4,10, o que coloca a tarifa de Franca como uma das mais caras do Brasil, acima do cobrado em Ribeirão Preto (R$ 3,95), São Paulo (R$ 3,80) e Rio de Janeiro (R$ 3,95). No comparativo com Ribeirão, o embaraço é ainda maior, especialmente por conta da coincidência de datas e dos índices aplicados. Enquanto na vizinha cidade o reajuste que começa a vigorar hoje limitou-se à reposição inflacionária (3,94%), por aqui o aumento foi simplesmente o dobro (7,89%). É um absurdo, para dizer o mínimo.
 
Não é de hoje que acompanho as venturas e desventuras do transporte coletivo em Franca. Nas últimas duas décadas, publiquei ou fui responsável pela publicação de incontáveis matérias denunciando a falta de qualidade do serviço, as condições nebulosas de algumas licitações, os tresloucados acordos que de uma hora para outra resultaram no perdão de penalidades, e claro, o exageradíssimo valor da passagem.
 
Desde a campanha que terminaria com minha eleição para o cargo de vereador, no ano passado, assumi o compromisso de lutar para fazer com que Franca tivesse um transporte público de muito mais qualidade, por um preço justo, o que nem de longe acontece hoje.
 
No meu discurso de estreia na tribuna da Câmara, ainda na primeira sessão ordinária, no começo de janeiro, apelei ao prefeito Gilson de Souza (DEM) para que decretasse o congelamento da tarifa pelo menos até o final deste ano. Justifiquei meu pedido com dois argumentos fundamentais: primeiro, em função da gravidade da crise econômica. O segundo, por conta da necessidade de um amplo estudo que analisasse o contrato vigente com a empresa São José e o serviço por ela prestado. Para isso, apresentei aos meus colegas o pedido para instalação de uma CEAR (Comissão Especial de Assuntos Relevantes) que, composta por três vereadores, teria exatamente esta missão.
 
A comissão foi aprovada, criada e instalada. Presidida por mim, tinha ainda os colegas Diretor Marcos (PSDB), como relator, e Ilton Ferreira (DEM), como terceiro membro. Suplente na Câmara, o Diretor Marcos deixaria a comissão com o retorno do titular. Na comissão, foi substituído por Carlinhos da Farmácia (PMDB), que assina o relatório final. 
 
A CEAR trabalhou duro. Foram meses de oitivas de testemunhas, de visitas, de muitas reuniões e de horas intermináveis dedicadas à difícil análise de uma montanha de documentos, que somaram mais de 13 mil páginas distribuídas em 67 volumes. Muito disto já relatei em diversas entrevistas, no plenário da Câmara e, inclusive, neste mesmo espaço. Mas algumas conclusões deste trabalho precisam ser repetidas, ainda que de forma sintética:
 
1 - O edital de 2009, preparado e finalizado no governo Sidnei Rocha (PSDB), estabeleceu condições, como o tamanho da frota (170 ônibus), que a empresa sabia que jamais cumpriria, ainda que tenha concordado com elas, conforme assombroso relato do representante da própria São José durante depoimento na CEAR. ; 2 - É impossível saber que outras empresas se interessaram pela licitação de Franca nem porque desistiram de fazer ofertas, porque toda a documentação “desapareceu” do Arquivo Central do Município; 3 - As gratuidades não representam 43% dos passageiros transportados, como alega a empresa, mas apenas 22,5%; 4 - A Emdef (Empresa Municipal para o Desenvolvimento de Franca) não realizava, até o início deste ano, nenhum tipo de fiscalização efetiva da qualidade do transporte, limitando-se a funcionar como uma espécie de “apoio operacional” para a própria São José; 5 - Todas as informações que servem de base para o cálculo da tarifa são fornecidas pela própria São José, sem qualquer outra fonte independente; 6 
- A prefeitura de Franca não aplicou, nos últimos cinco anos, uma única multa contra a São José, por qualquer falha que seja; 7 - Há cidades de porte semelhante a Franca, como Rio Preto, onde o serviço é infinitamente superior e a passagem, sensivelmente mais barata, com subsídio (R$ 2,90) ou sem (R$ 3,45).
 
O prefeito Gilson de Souza é um conciliador. Prefere mil vezes o diálogo ao atrito, nunca é rude com quem quer que seja, nem mesmo com seus desafetos, e raramente perde a paciência, por mais que um assunto qualquer seja desgastante. Ainda assim, e apesar de todas essas características, Gilson já deu mostras inequívocas de que, mesmo para ele, há momentos em que a conciliação não é possível. Que o digam os demitidos nestes primeiros seis meses, alguns deles o tipo de gente que se acha insubstituível. Não podiam estar mais errados.
 
Por isso mesmo, é lamentável que Gilson tenha cedido e autorizado justamente o aumento da tarifa de ônibus. Diante da postura da São José, a alternativa possível era bater com força na mesa e dizer “não”. Se preciso, que deixasse a Justiça arbitrar o caso. R$ 1 aos domingos ajuda, mas não resolve. O jeito, agora, é lutar duro e continuar com as mangas arregaçadas para que a partir de 2019 tenhamos um contrato realmente justo. A cidade merece um serviço decente com um preço mais em conta. Já ultrapassamos qualquer limite do razoável. A luta continua. Até o fim. 

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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