Tiro no pé

O prefeito e sua equipe têm demonstrado dificuldades para lidar com os distintos obstáculos.

18/06/2017 | Tempo de leitura: 4 min

“A sabedoria começa na reflexão”
Sócrates, filósofo grego

 
O governo Gilson de Souza (DEM) passa por um momento delicado. Às vésperas de completar seu primeiro semestre, o prefeito e sua equipe têm demonstrado dificuldades para lidar com os distintos obstáculos que se colocam — simultaneamente — no seu caminho. Nenhum deles, registre-se, fácil de resolver.
 
Primeiro, houve a “herança maldita”, que fez com que se multiplicassem logo de cara problemas que ninguém previa, derivados de ações ou omissões de governos anteriores e cujos efeitos se fazem sentir agora. Tome-se como exemplo a decisão judicial de outubro do ano passado que retirou as equipes de Obras e Posturas da fiscalização de ambulantes; a sentença que forçou a dispensa de estagiários da função de assistentes na rede municipal, o que gerou enorme dificuldade para as crianças com cuidados especiais; as irregularidades na criação e definição dos cargos comissionados da prefeitura num processo que atravessou distintos governos e que acabou sendo objeto de ação por parte do Procurador Geral de Justiça do Estado de São Paulo, cujo prazo para solução do problema expira agora; a mudança na lei federal 13.019, que alterou a forma de se estabelecer convênios com o terceiro setor, que começou a vigorar neste ano e tem complicado bastante o repasse de dinheiro para creches e projetos sociais; e por aí vai.
 
Segundo, a organizada articulação da oposição, empenhada em travar toda e qualquer ação do governo, ainda que muitas vezes às custas de lançar — ou, no mínimo, reforçar — boatos desprovidos de mínima fundamentação na realidade, tudo para frear projetos e ideias do governo. São exemplos deste comportamento a maldosa — e criminosa — insinuação, sem qualquer pé na realidade, de que uma negociação para a venda das faculdades municipais para um grupo chinês tivesse sido conduzida — neste caso, por mim e pelo prefeito —, o que travou, de fato, a discussão existente, que tentava aumentar o número de bolsas de estudo oferecidas, especialmente para cursos mais caros, como Medicina. 
 
Exemplos não faltam. Há, atualmente, ofensivas contra qualquer iniciativa do Executivo, como se sempre houvesse um interesse escuso por trás. Assim, se Gilson de Souza anuncia uma PPP para revitalizar o Lanchão, eis que surge uma “fonte anônima” para dizer que tem esquema com uma construtora, ainda que o projeto sequer tenha sido apresentado. Prova, nenhuma. Evidências, nem as mínimas. 
 
Se o prefeito tenta modificar uma lei de parcelamento do solo para garantir que se possa investir em projetos do Minha Casa Minha Vida faixas 1.5 e 2, sem qualquer repasse de recursos municipais, sem que haja cessão de terreno que possa beneficiar indevidamente um particular, recorre-se aos mais criativos expedientes para impedir o projeto de ir a votação no plenário. Houve de tudo: do adiamento puro e simples da votação do projeto numa manobra da mesa diretora à exigência posterior de uma audiência pública, passando nos últimos dias à tese de que a parcela que será paga pelo futuro contemplado não é “popular” e, de novo, às insinuações de que existe uma “esquema” com uma construtora. É nítido que se tenta travar qualquer iniciativa do governo.
 
Terceiro, e talvez o mais complicado, a própria dificuldade do Executivo de fazer com que seus comandados trabalhem num mesmo compasso. São incontáveis os episódios em que o governo acabou derrotado por ninguém menos do que o próprio... governo. Em muitos instantes, é difícil não imaginar que haja gente muito próxima do prefeito disposta ao mais puro e simples boicote. É fogo amigo, na veia.
 
Melhor exemplo do que a já histórica — pelo que tem de mais ridículo — audiência pública desta semana para discutir a mudança na lei de parcelamento do solo não poderia haver. O procurador jurídico que trabalhou por meses na formulação do projeto, Eduardo Campanaro, resolveu, na véspera, avisar ao prefeito que não presidiria a audiência porque tinha uma “viagem familiar”. Escalado para conduzir os trabalhos no lugar do procurador, o secretário de Planejamento, Virgínio Reis, deu uma lição de como implodir um projeto. Diante de um grupo de vereadores, gaguejou, admitiu que não tinha preparo para explicar nada e, cereja do bolo, afirmou ainda que naquelas circunstâncias “votaria contra”. É possível que tenha dito isso no contexto de que, como não havia lido, não entendia e, assim, fosse ele vereador, votaria contra. Pouco importa o que ele quis dizer. O fato, inequívoco, é que o governo precisa, com urgência, se preparar muito melhor para defender seus projetos. 
 
Gilson de Souza certamente terá dias duros pela frente. Faz parte. Cabe ao prefeito tomar as decisões — e inspirar as pessoas a segui-lo. Não vai conseguir isso enquanto tiver gente no seu próprio time jogando contra. Quem não está confortável, precisa sair. Quem errou, tem que ser punido. Quem não se empenha, não pode ser de confiança. 
 
De resto, na relação com o Legislativo, Gilson precisa entender de uma vez por todas que a oposição existe, está articulada, cumpre seu papel e nem de longe vai facilitar seu trabalho. Cabe ao prefeito organizar sua base de apoio, instruir melhor seus projetos, alinhar seu discurso e garantir os votos necessários para vencer no plenário. Para isso, precisa somar mais votos do que a oposição. Caso contrário, pode até ser o prefeito, mas não vai conseguir governar. E isso é um risco que nenhum chefe do Executivo pode correr. Nem aqui, nem em nenhum lugar. 
 
Corrêa Neves Júnior, jornalista e vereador em Franca
email - jrneves@comerciodafranca.com.br

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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