Escolhas e prioridades

De um lado, a polêmica liberação de R$ 250 mil para as escolas de samba da cidade. Do outro, o envio pelo governo Gilson de um projeto que reduz o limite para gastos com bolsas de estudo nas faculdades da cidade.

05/03/2017 | Tempo de leitura: 4 min

"Governar é escolher"
Duque de Lévis, político francês
 


O governador Geraldo Alckmin (PSDB) costuma repetir que “governar é priorizar, fazer escolhas”. Bebe na fonte do Duque de Lévis, político francês que disse exatamente o mesmo há mais de 200 anos. O princípio é elementar. Como nunca há recursos suficientes para tudo que se pretende fazer, aquele a quem compete liderar uma cidade, um Estado, uma nação deve priorizar o que é mais importante. Estabelecer o essencial. Definir o que pode - e o que não pode - ficar para depois. 
 
Um bom exemplo de quão complexa podem ser estas escolhas acontece, neste instante, em Franca. De um lado, a polêmica liberação de R$ 250 mil para as escolas de samba da cidade. Do outro, o envio pelo governo Gilson de um projeto que reduz o limite para gastos com bolsas de estudo nas faculdades da cidade. 
 
Quem defende o investimento nos desfiles de Carnaval gosta de lembrar o simbolismo da festa, sinônimo de brasilidade, além do caráter popular do evento, que acontece sem cobrança de ingressos. Seus críticos avaliam que é um total desperdício. E que quem quiser fazer desfile de Carnaval, que o faça com dinheiro do próprio bolso. Obviamente, não há muito mais a ser discutido sobre o Carnaval deste ano - mesmo porque os R$ 250 mil aprovados pela legislatura anterior foram efetivamente liberados, as escolas “desceram” a avenida e tudo isso agora é passado. Mas há 2018 no horizonte. O debate já começou. 
 
Um dos mais enfáticos a se posicionar contra o repasse de dinheiro público para a festa é o presidente da Câmara Municipal, Marco Garcia (PPS), que usou a tribuna na sessão da última quinta-feira para anunciar que havia encaminhado requerimento ao prefeito Gilson de Souza pedindo que o dinheiro que eventualmente vier a ser reservado para a folia de 2018 seja destinado para o Bolsa Universidade. “Não sou contra o Carnaval. Apenas acho que Franca tem outras prioridades. Devemos priorizar o lazer ou a educação e a saúde?”, provocou. 
 
Apesar de ter recebido apoios, como dos vereadores Pastor Sérgio Palamoni (PSB) e Claudinei da Rocha (PSB), a posição de Marco Garcia não é unânime. Muitos vereadores pensam diferente e a discussão mais aprofundada, no momento oportuno, será decisiva. Mas, independente do que se pense a respeito da conveniência de liberação de dinheiro público para o Carnaval, uma coisa é certa: as prioridades precisam ser melhor definidas. Não tenho a menor dúvida de que a cultura popular em Franca precisa ser reestruturada, reorganizada, porque é fundamental para a construção da cidadania, mas o Bolsa Universidade precisa estar no topo, muito à frente do que se gasta com escolas de samba.
 
Tenho lutado para evitar a desidratação do programa Bolsa Universidade há algumas semanas, desde que o projeto foi encaminhado pelo Executivo para discussão e votação. A Comissão de Finanças e Orçamento, que presido, tem que emitir parecer sobre os aspectos formais da movimentação orçamentária antes que o projeto seja votado em plenário. Não foi difícil perceber que, tal qual encaminhado, era muito indigesto.
 
No texto do projeto, o limite de gastos com as bolas é reduzido em 32%. A explicação é risível. Dizem os técnicos da prefeitura que o “teto” foi reduzido porque o limite não é alcançado. E isso aconteceria porque as faculdades não querem conceder mais bolsas, ainda que parciais - a conta não é precisa mas, grosso modo, um pouco mais de um terço é pago pela prefeitura, outro terço pelo aluno e o restante é o “desconto/prejuízo” da faculdade. Invertemos então a pergunta. Se o teto nunca é alcançado, por que reduzir? Não seria melhor deixar ou, ainda, até mesmo aumentar e, com a ajuda dos vereadores e do prefeito, pressionar para que houvesse a concessão de mais bolsas? Se reduzir agora não fica muito mais difícil elevar depois? Não houve por parte dos técnicos da prefeitura respostas convincentes - nem mesmo depois de duas reuniões.
 
Hoje, a prefeitura investe apenas R$ 130 mil mensais em bolsas de estudo para 480 alunos - 162 que vão entrar no primeiro ano e 258 que já têm o benefício. É metade do que destinou para as escolas de samba desfilarem dois dias no Carnaval. Não é justo.
 
A discussão inicial na Comissão de Finanças de alguma forma sensibilizou o prefeito Gilson de Souza (DEM), que nesta semana retirou o projeto da Câmara para “novos estudos”. Conversei com ele, expus as contas e defendi que, melhor do que manter o antigo limite, seria avançar no número de bolsas concedidas. Uma boa medida seria usar a régua do Carnaval. Se ele destinar a mesma verba que reservou para a folia para incrementar o Bolsa Universidade, seria possível atender 67 novos estudantes. Assim, ao invés de contemplar 162 bolsistas de primeiro ano, o programa chegaria a 229 alunos. 
 
O investimento adicional corresponderia a meros 0,6% do caixa disponível legado por Alexandre Ferreira (PSDB). Ou a irrisórios 0,04% da arrecadação prevista para este ano. Está muito longe de ser o ideal, mas pelo menos seria um sinal de que as prioridades estão claras para o governo Gilson de Souza. Porque se tem dinheiro para o Carnaval, tem que ter dinheiro para outras áreas da cultura, e mais, muito mais, para as bolsas de estudos que beneficiam alunos carentes. Alguém discorda? 

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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