#émuitamentira

No mesmo domingo, aqui em Franca, um áudio com uma voz feminina começou a circular por grupos de whatsapp. A mulher, não identificada até agora, dizia que havia acontecido um sequestro naquela manhã no Centro.

11/12/2016 | Tempo de leitura: 4 min

“Uma mentira dá uma volta inteira ao mundo antes mesmo de a verdade ter oportunidade de se vestir”
Winston Churchill, político e escritor inglês
 
 
A pizzaria Comet Ping Pong, localizada num trecho tranquilo da Connecticut Avenue, em Washington DC, capital dos Estados Unidos, estava cheia de gente na tarde do último domingo, 4 de dezembro. O clima era de tranquilidade. Passava um pouco de 15h quando um sujeito chamado Edgar Maddison Welch, 28 anos, ator/produtor/escritor com três filmes no currículo dos quais ninguém nunca ouviu falar, entrou na pizzaria. Estava “acompanhado” de um fuzil AR-15, uma espingarda, um revólver Colt calibre 38 e uma faca dobrável. Imediatamente, apontou para o primeiro funcionário que viu na sua frente. Edgar queria comprovar uma teoria conspiratória que agitou a disputa presidencial entre Donald Trump e Hillary Clinton.
 
A tal “teoria”, difundida pelas redes sociais, dizia que Hillary era integrante de uma organização secreta que praticava rituais de abuso sexual contra menores de idade, mantidos em regime de escravidão. Os propagadores da esdrúxula teoria diziam ainda que a fachada dos “templos” onde aconteceriam os rituais escondiam elementos que só seus integrantes sabiam identificar. Segundo as postagens, um dos endereços da organização em Washington, com direito a calabouço e túneis subterrâneos, era exatamente a Comet Ping Pong. 
 
Depois de fazer um disparo e ser cercado pela polícia, Welch ainda demorou cerca de 45 minutos para se entregar, tempo suficiente para que ele fizesse uma “busca” no local. Obviamente, não encontrou nada além de farinha, peperoni, muçarela, manjericão, molho de tomate e fornos de pizza. Acabou preso. Pelo menos, admitiu que estava errado, virtude rara entre os apoiadores da tal “teoria”. Mesmo assim, muita gente ainda acredita que Welch não encontrou nada porque a tal organização seria tão poderosa que teria desaparecido com tudo tão logo o caso fora “denunciado” no mês passado. Haja paciência.
 
Não que esse tipo de problema seja exclusividade dos americanos. No mesmo domingo, aqui em Franca, um áudio com uma voz feminina começou a circular por grupos de whatsapp. A mulher, não identificada até agora, dizia que havia acontecido um sequestro naquela manhã no Centro da cidade. Segundo o relato, uma menina de seis anos havia sido levada do estacionamento da Caixa Federal, na praça Nossa Senhora da Conceição, e a ação teria sido testemunhada por muitos que acompanhavam a missa na Catedral.
 
A coisa viralizou depressa. Em poucas horas, havia recebido dezenas de vezes o mesmo áudio. Quase sempre, acompanhado de uma expressão de consternação, preocupação e de muitos pedidos para que todos “ajudassem” a “encontrar” a menina. Como era de se esperar, ninguém sabia o nome da vítima, dos pais e, no próprio áudio, a tal mulher dizia que a família não tinha fotos da menina. Todos, indícios mais do que suficientes para indicar que era uma farsa.
 
Na segunda e terça-feira, a coisa ganhou tal proporção que muitos começaram a acusar o jornal de “silenciar” diante de uma notícia tão importante. Ouvintes enviaram áudios cobrando uma posição nossa, como se estivéssemos ignorando uma notícia grave. Não estávamos. Apenas não havia notícia nenhuma, porque não aconteceu sequestro nenhum, muito menos na manhã de domingo, na saída da missa, em plena Catedral de Franca. 
 
Uma outra mentira desvairada ganhou ainda mais projeção, impactando milhões de brasileiros na última semana. Se você tem um perfil no Facebook, muito provavelmente topou com uma publicação compartilhada por alguém convidando para assistir a uma fantástica e reveladora entrevista de Jô Soares com o juiz-herói-celebridade Sérgio Moro. O post dizia que os milhões de brasileiros não deveriam perder a entrevista que traria, ainda, grandes revelações. Muita gente curtiu e compartilhou. Houve quem comentasse que o bate-papo tinha sido “incrível”. Tudo mentira.
 
A entrevista jamais aconteceu. “O boato foi tão grande nas redes sociais que até eu acreditei. Foi só um boato. Eu convidei o juiz Sergio Moro uma vez, duas vezes, aí a pedido de todas as jornalistas da minha equipe, eu tentei. Mas ele falou: ‘eu não posso dar uma entrevista, que aí eu tenho que dar entrevista pra todo mundo”, esclareceu Jô, que se aposenta nesta semana – sem entrevistar Moro.
 
O três exemplos narrados acima são apenas uma ínfima parcela do que acontece hoje na internet. Em meio a uma avalanche incessante de informações, posts, comentários e correntes em grupos de whatsapp, o problema tem se agravado. Uma pesquisa divulgada nesta última semana mostrou que 75% dos americanos – três em cada quatro - são incapazes de identificar uma notícia falsa quando se deparam com ela. Não tenho a menor dúvida de que, no resto do mundo, aí incluído o Brasil, o resultado é o mesmo – se não for pior. 
 
O problema é tão sério e perigoso – no caso de Washington um massacre poderia ter acontecido – que muitos cérebros se dedicam, neste instante, a desenvolver algoritmos e métodos que permitam banir falsas notícias. Não é um desafio simples. Enquanto alguma solução não surge, um pouco de prudência ajuda. Diante de uma “notícia” esquisita qualquer distribuída por rede social ou grupo de whatsapp, confirme antes de repassar. Verifique num jornal impresso, procure ouvir na sua rádio preferida, acompanhe se a televisão noticiou – ou, claro, busque nas versões de internet destes mesmos veículos. Se não encontrar nada, certamente é porque a tal “notícia” não existe. É um comportamente responsável – e profilático. A verdade, fragilizada, agradece.
 
 
Corrêa Neves Júnior, diretor executivo do GCN 
email - jrneves@comerciodafranca.com.br

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

Fale com o GCN/Sampi! Tem alguma sugestão de pauta ou quer apontar uma correção?
Clique aqui e fale com nossos repórteres.

Receba as notícias mais relevantes de Franca e região direto no seu WhatsApp
Participe da Comunidade

COMENTÁRIOS

A responsabilidade pelos comentários é exclusiva dos respectivos autores. Por isso, os leitores e usuários desse canal encontram-se sujeitos às condições de uso do portal de internet do Portal SAMPI e se comprometem a respeitar o código de Conduta On-line do SAMPI.