A hora é essa? Na política tudo tem seu tempo

Gilson passou a campanha repetindo que 'tudo tem seu tempo' e que 'a hora é essa'.

06/11/2016 | Tempo de leitura: 4 min

“Política é como nuvem. Você olha e ela está de um jeito. Olha de novo e ela já mudou”

Magalhães Pinto, político e banqueiro brasileiro
 
 
Há exatos 20 anos, num hoje distante setembro de 1996, Gilson de Souza chegava à reta final da disputa eleitoral como favorito absoluto para conquistar a cadeira de prefeito de Franca. Aos 40 anos, tinha sido vereador por duas legislaturas (83-88, 89-92). Naqueles últimos dias de setembro de 96, liderava com folga todas as pesquisas. O segundo colocado era o petista Gilmar Dominici. Ainda disputavam a cadeira de prefeito o médico Joaquim Pereira Ribeiro, que permanecia na terceira posição, e o ex-deputado federal Airton Sandoval.
 
Fui testemunha de uma tensa reunião no início da tarde do domingo que antecedia a votação. Além de Gilson de Souza e de seu candidato a vice, o radialista Ricardo Piéri, participaram do encontro o então prefeito, Ary Balieiro; seu homem forte, Sebastião Ananias; e meu pai, entre outros. Havia enorme pressão. Naquela noite, a EPTV realizaria seu tradicional confronto entre os candidatos. Gilson havia tido um desempenho fraco nos embates anteriores e havia dúvidas sobre a pertinência de sua participação naquele confronto final. 
 
Me lembro do Ary e de meu pai, veteranos de outras disputas, serem bastante cautelosos. “Gilson, esse é o tipo de decisão que só o candidato pode tomar. Ninguém mais”, alertou meu pai. Muito religioso, Ary recomendou que Gilson orasse em busca de uma resposta. Ananias acrescentou que se Gilson decidisse pela participação, era preciso algumas horas de preparação. Mas a decisão só veio mesmo quando Ricardo Piéri decidiu se posicionar. Muito emocionado, pediu para falar com Gilson de Souza em particular. Ambos saíram da sala. Voltaram, minutos depois, abraçados. “Falei para o Gilson que é melhor perder do que fugir. Ele tem que ir”, disse Ricardo, aos prantos. Gilson assentiu. A reunião acabou em seguida. 
 
Horas depois, Gilson de Souza teria o pior desempenho de sua vida num debate. Foi massacrado por Gilmar Dominici e Joaquim. Apesar do enorme esforço de Sebastião Ananias, Gilson parecia um boxeador grogue acuado nas cordas. O desastre foi absoluto. No domingo seguinte, Gilmar Dominici venceria – e com boa margem. Impossível saber se, caso tivesse faltado, o resultado seria outro. Mas aquela experiência marcaria Gilson de Souza para sempre.
 
Vitoriosos, os petistas ficaram extasiados. Acreditavam que tinham extirpado o que classificavam como “velha política” e que, de quebra, ainda haviam derrotado o establishment. Pareciam acreditar que eram capazes de tudo, sem ajuda – e começaram execrando o governo de Ary Balieiro. Tinham convicção de que Gilson de Souza, Sebastião Ananias, Ary Balieiro e tantos outros eram “passado”. Achavam-se tão bons que escalaram um governo praticamente só de petistas. Quase ninguém no entorno do então prefeito Gilmar Dominici parecia ter qualquer dúvida de que uma “nova era” começava, um governo “do povo”. Apesar dos excessos retóricos e da verborragia que demorou quase um ano para refrear, havia gente honesta e realmente bem intencionada naquele grupo. Ainda assim, deu no que deu.
 
Duas décadas mais tarde, muitos dos personagens de 96 estavam de volta. Depois de perder outras duas vezes a eleição municipal neste período, Gilson entrou na corrida eleitoral deste ano na condição de azarão. Obviamente, sonhava com a prefeitura, mas tenho comigo que, se conseguisse fazer uma campanha mínima e manter seu nome em evidência para a disputa de deputado, dentro de dois anos, já estaria satisfeito. 
 
Mas, com o passar das semanas, muitos equívocos cometidos por seus adversários e a disputa caminhando para definição num segundo turno, o jogo começou a mudar. De novo, havia debates decisivos no meio do caminho. Desta vez, Gilson de Souza optou por não arriscar. Certamente assombrado pelo fantasma de 96, preferiu transferiu a responsabilidade para seu oponente, Sidnei Rocha, argumentando que como seu adversário não havia ido aos debates no primeiro turno, não havia razão para que ele participasse na reta final. Apesar de amarga para a democracia, a manobra funcionou do ponto de vista eleitoral. Aos 60 anos, o mineiro de Delfinópolis foi eleito prefeito de Franca.
 
Gilson de Souza passou toda a campanha repetindo que “tudo tem seu tempo” e que “a hora é essa”, reforçando que se sente preparado para administrar Franca. Só os anos dirão se ele estava com a razão. Inegavelmente, seus primeiros movimentos depois de eleito foram acertados. A escalação de Sebastião Ananias, considerado eficientíssimo na gestão das finanças públicas até por quem é seu opositor ideológico, transmite segurança a todos. A indicação de Flávia Lancha para liderar a secretaria de Desenvolvimento traz frescor a um ambiente onde são raras as novidades e, de quebra, ainda faz de uma adversária sua aliada.
 
Quanto mais Gilson mantiver os olhos no futuro, sem que isso signifique deixar de se fiar nas lições do passado, especialmente naquilo que aconteceu em Franca a partir de 97 e, particularmente, nos últimos 4 anos, maiores serão as suas chances de sucesso. Suturar as feridas resultantes da disputa, nunca governar com o fígado e construir tantas pontes quantas forem possíveis construir são lições que a História ensina como fundamentais para o êxito. 
 
Que Gilson, agora prefeito de todos, inclusive dos 60% de eleitores que não votaram nele (somados as abstenções, brancos, nulos e votos em Sidnei Rocha), faça um excelente governo. É do que Franca precisa – e o que a população merece. Boa sorte!
 
 
Corrêa Neves Júnior, diretor executivo do GCN 
email - jrneves@comerciodafranca.com.br

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

Fale com o GCN/Sampi! Tem alguma sugestão de pauta ou quer apontar uma correção?
Clique aqui e fale com nossos repórteres.

Receba as notícias mais relevantes de Franca e região direto no seu WhatsApp
Participe da Comunidade

COMENTÁRIOS

A responsabilidade pelos comentários é exclusiva dos respectivos autores. Por isso, os leitores e usuários desse canal encontram-se sujeitos às condições de uso do portal de internet do Portal SAMPI e se comprometem a respeitar o código de Conduta On-line do SAMPI.