Apesar de tudo

Franca tem o melhor ensino fundamental do Estado e, o 3º melhor do país.

11/09/2016 | Tempo de leitura: 4 min

“Se você quiser educar um homem, comece pela avó dele”
Victor Hugo, escritor francês
 
 
Saiu o resultado do Ideb, o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica, que mede a quantas anda a qualidade do ensino nas escolas públicas brasileiras. Para quem é de Franca, o ranking não poderia trazer números melhores. Segundo os dados divulgados na última quinta-feira, a cidade tem o melhor ensino fundamental do Estado de São Paulo e, simplesmente, o terceiro melhor do país. No caso do ensino médio, o desempenho das escolas estaduais de Franca ajudou São Paulo a ficar no topo do ranking nacional. Não é pouca coisa, especialmente se considerada a gravíssima crise econômica e política que assola o país e, claro, os turbulentos anos de Alexandre Ferreira (PSDB) no comando da prefeitura. Tinha tudo para dar errado. Felizmente, não deu.
 
Sou filho, sobrinho e primo de professoras e professores. Aprendi a ver com profundo respeito e admiração, desde cedo, o corre-corre de uma escola para outra a que os educadores são submetidos. De manhã, aulas num lugar. À tarde, num outro bairro. À noite, uma terceira escola – não raro, localizada em outra cidade. Isso para não falar no inferno vivido por aqueles que, aprovados num concurso do Estado, acabam designados para lecionar muito longe de casa. Seguem-se então anos de longas viagens de ônibus, hospedagens em pensões sem qualquer conforto e distância forçada da família à espera de uma “remoção” para, ao fim, receber um salário modestíssimo. Há ainda as inevitáveis avaliações e correções de prova que se estendem por jornadas intermináveis, cursos importantes para aprimoramento que precisam ser feitos com regularidade, a crônica falta de estrutura – e, ainda, a tensão com a violência crescente. 
 
No caso de Franca, há que se somar o trauma provocado pelo atual prefeito. A Educação foi a primeira área a sentir diretamente o impacto do singularíssimo humor de Alexandre Ferreira. Ainda antes de completar os primeiros quatro meses de governo, a então secretária de Educação, Leila Haddad, foi vítima de grosserias inaceitáveis. Preferiu demitir-se a seguir humilhada. Deixou o comando da secretaria de Educação no final de abril de 2013, após comandar a pasta nos oito anos da gestão de Sidnei Rocha (PSDB). Elegante, sinalizou que deixava bases sólidas após 42 anos de dedicação à Educação.  “Fico triste porque amo muito, sempre trabalhei com muito amor, dedicação e transparência. Este é o legado que eu deixo (...) Nossa equipe é muito boa e as metas estão estabelecidas. O planejamento será cumprido da mesma forma”. Dito e feito. 
 
Leila foi a primeira vítima, mas nem de longe foi a última. Na sequência, Alexandre Ferreira aniquilou a parceria com a Polícia Militar, que mantinha seis soldados dedicados exclusivamente ao Proerd, importante programa de prevenção às drogas, sem custos para o município. O cancelamento foi feito por telefone.
 
Vieram então as manifestações de junho de 2013, que reuniram milhões de brasileiros nas ruas do país. Como quase todo mundo, os professores queriam participar e dar o seu recado. Pediram, diplomaticamente, que a secretária de Educação recém-empossada, Fabiana Sampaio, autorizasse. Receberam uma resposta positiva e, assim, somaram-se aos 15 mil francanos que saíram às ruas naquele mágico instante. Dias depois, Alexandre Ferreira desautorizou a secretária e mandou cortar o ponto dos professores que tinham faltado, apesar da autorização prévia. Foi um gesto truculento, ilógico – e inócuo. Centenas de servidores entraram com ação na Justiça e já tiveram decisões favoráveis.
 
Houve ainda o triste episódio em que Alexandre tentou silenciar as críticas publicadas pelo Comércio da maneira mais tosca possível. Simplesmente proibiu alunos da rede municipal de visitar o jornal e tentou impedir os professores de participar das oficinas de treinamento oferecidas dentro do programa Jornal Escola. Vetou também a distribuição de jornais aos alunos. Fracassou em todas as frentes. Alguns professores o desafiaram e seguiram participando das oficinas. Os que temiam retaliações, deixaram as oficinas, mas continuaram recebendo o jornal e usando os exemplares para inúmeras atividades em salas de aula. Vale lembrar que a prefeitura não gastava um único centavo com o programa. Todo o treinamento oferecido, o material didático e os milhares de jornais distribuídos sempre foram custeados pelo Comércio, sem qualquer repasse do poder público. 
 
Viriam ainda as greves e as múltiplas perseguições aos servidores, especialmente da área de Educação; a recusa em utilizar os recursos do Fundeb (Fundo para o Desenvolvimento da Educação Básica) para melhorar minimamente a remuneração dos educadores, ainda que de forma indireta; os desvios de dinheiro na construção de quatro creches... A lista é extensa.
 
Mesmo assim, os professores e professoras resistem, buscam energia e disposição sabe-se lá onde, reciclam-se e reinventam-se permanentemente. A cada novo dia,  estão de pé mais uma vez, rumo às salas de aula, para ensinar e educar com tamanha paixão e entusiasmo que, mesmo com tantos obstáculos, são capazes de levar seus alunos a alcançar resultados expressivos, como mostram os números do Ideb. 
 
Fico me perguntando o que esses professores não conseguiriam fazer se tivessem maior apoio e salários um pouco mais condizentes com a responsabilidade que carregam. Aposto que, no lugar da nota 6,9 que alcançaram, levariam seus alunos a um 10. E Franca, à condição de cidade com uma educação pública de excelência em nível mundial. Alguém duvida? 
 
 
Corrêa Neves Júnior, diretor executivo do GCN 
email - jrneves@comerciodafranca.com.br

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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