Desgraça pouca é bobagem

A Primeira Guerra Memeal é uma realidade. E diz muito sobre nós. Brasileiro sempre foi bom de piada.

19/06/2016 | Tempo de leitura: 5 min

“Através do humor nós vemos no que parece racional, o irracional; no que parece importante, o insignificante. Ele também desperta o nosso sentido de sobrevivência e preserva nossa saúde mental”
 
Charles Chaplin, ator, escritor e humorista inglês
 
 
O Brasil foi à guerra nesta última semana. Em que pese o sucateamento de nossas forças armadas, a instabilidade do cenário político e a maior crise financeira da história do país, conseguimos vencer. E tudo, registre-se, sem o derramamento de uma única gota de sangue. O inesperado “conflito” contra Portugal, iniciado na segunda-feira, 13 de junho, chegou ao fim três dias depois. Apesar de muito rápido, o confronto teve lances tão inusitados que, em muitos momentos, tonou-se o assunto mais comentado do mundo nas redes sociais – especialmente, no twitter. Não faltaram matérias em portais, jornais, revistas, rádio e TV. Acha que estou louco? Que é tudo mentira? Nada disso. A Primeira Guerra Memeal é uma realidade. E diz muito sobre nós.
 
Antes de mais nada, é preciso que se entenda o que é meme. Certamente, na sociedade hiperconectada de hoje, todo mundo já viu pelo menos um, ainda que não tenha associado o “nome” à “pessoa”. Memes são aquelas piadas que circulam em redes sociais e grupos de whatsapp, normalmente uma montagem tosca com alguma frase bem sacada sobre uma foto qualquer. É uma espécie de charge moderna, normalmente sem autor conhecido e que ironiza uma situação qualquer do cotidiano. Há memes que só fazem sentido para determinados grupos que entendem o contexto da brincadeira. Outros, universais, têm potencial para divertir, viralizar e alcançar milhões mundo afora.
 
Brasileiro sempre foi bom de piada – e, portanto, de meme. Há muitos, impagáveis. Um que mostra o Chapolim Colorado, com sua expressão característica, dizendo que os americanos têm “Ipod, Imac, Iphone, IBM...” enquanto os brasileiros têm “IPTU, IPVA, ICMS, ISS...” é muito bom. Dilma Rousseff, numa paródia de Arnold Schwarzenegger, repaginada como A Exterminadora do Futuro, é hilária. O melhor dos últimos tempos, na minha opinião, mostra o deputado federal afastado, Eduardo Cunha, dizendo que diante de uma derrota na Câmara, iria fazer sucessivas votações – até vencer. Impagável!
 
A origem da Primeira Guerra Memeal está numa brincadeira de 2015. Um brasileiro espirituoso resolveu usar o twitter para brincar com versões irônicas de traduções de expressões em inglês. Era uma versão turbinada daquela brincadeira que muito brasileiro costuma fazer quando “ensina” algumas palavras a um incauto estrangeiro. E assim, o pobre diabo acha que está arrasando, mas só o que “aprendeu” a falar é “bunda”, “caca”, “Timão”. E lá vem o infeliz, para risada geral. “Oi, gente. Bunda dia!. Tudo Timão com vocês?” 
 
Na versão twitter, batizada de “In brazilian potuguese you don’t say...” (Em português você não diz...), surgiram coisas muito engraçadas. “Em português você não diz Eu te Amo. Diga te pago um salgado, que significa amor infinito e eu acho lindo”, brincava um certo @rodrigoplss no carnaval do ano passado. Centenas de outros viriam, como este atribuído a @barba_gato: “Em português eles não dizem Como vai você?, eles dizem Fala Jão é nóis que avoa e eu acho lindo”.
 
Na semana passada, alguém resolveu reeditar em Portugal a brincadeira surgida aqui, usando expressões típicas da antiga metrópole. Pronto. Bastou para que os brasileiros se sentissem “usurpados”, acusassem  Portugal de “roubo” e começassem a criar memes em série dos portugueses. Que, obviamente, reagiram. Começava, então, a Primeira Guerra Memeal, com milhares de postagens de parte a parte – e, claro, com milhões de curtidas e compartilhamentos. Foi muito engraçado. Pelo menos, para a maioria.
 
Alguns portugueses não gostaram muito – especialmente, o criador da brincadeira por lá. Revoltado, depois de reclamar de Portugal estar sendo “atacado” como “nação”, o sujeito fez um post mal-educado na manhã de terça. “Em Portugal, não temos um país cheio de favelas”. Depois, apagou o post. E a conta. Apelou – e perdeu. Os brasileiros, felizes, se declararam “vencedores”. Dois dias depois, uma nova “disputa” começou. Desta vez, Portugal ganhou reforço da Argentina. Ambos, fazendo piadas sobre o Brasil. Imagine como tem sido a reação brasileira diante dos “inimigos”. Haja meme.
 
A Primeira Guerra Memeal foi mais um instante em que os brasileiros mostraram sua inesgotável capacidade de rir de si mesmos. Tudo, absolutamente tudo, termina em piada por aqui. Rimos dos políticos, dos artistas, dos esportistas, das nossas manias, dos muitos fracassos que acumulamos. Rimos dos outros também, mas sobretudo porque conseguimos rir de nós mesmos. Mesmo em momentos agudos, como nos protestos contra o governo. Apesar de ruidosas e impactantes, nossas manifestações são alegres, coloridas, bem-humoradas – com exceções, obviamente, mas que não contaminam a atmosfera geral. Há o “pato da Fiesp”, Lula vestido de presidiário, a Dilmeca cobra. O japonês da federal virou samba. Os delatores, máscaras de Carnaval. Propina de milhões era chamada de “pixuleco”, que já virou sinônimo de dinheiro. Bin Laden por aqui é nome de funkeiro. É uma virtude imensa, que nos mantém de pé e nos faz seguir em frente, por maiores que sejam as decepções, os obstáculos ou as dificuldades.  Mesmo porque, no país da piada pronta, rir é o que nos resta.
 
Em tempo: descobriu-se nesta última semana que o Brasil gasta R$ 5 bilhões anuais apenas em taxas e contribuições para participar de alguns organismos internacionais absolutamente irrelevantes, especialmente para um país na bancarrota. Entre eles, o Acordo Internacional de Conservação de Albatrozes e Petréis e a Comissão Internacional da Pimenta do Reino. Não, não é piada. É a mais absoluta verdade. Tem como não gargalhar?
 
 
Corrêa Neves Júnior, diretor executivo do GCN 
email - jrneves@comerciodafranca.com.br

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