Não vai ter golpe. Mesmo.

Desde que as investigações da Operação Lava Jato revelaram que o Brasil havia se transformado numa cleptocracia, com corrupção

20/03/2016 | Tempo de leitura: 5 min

“O povo brasileiro deu uma demonstração de que é possível o mesmo povo que elege um político, destituir este político. Eu peço a Deus que nunca mais o povo brasileiro se esqueça dessa missão”
Luiz Inácio Lula da Silva, após o ‘impeachment ‘de Fernando Collor de Mello
 
 
Desde que as investigações da Operação Lava Jato revelaram que o Brasil havia se transformado numa cleptocracia, com corrupção sistêmica contaminando estatais, grandes grupos empresariais, ministérios, boa parte dos parlamentares, partidos políticos e, também, o Palácio do Planalto, um degradante fenômeno tem se verificado com impressionantes frequência e abrangência. 
 
Não importa a biografia de alguém, sua história de vida, a retidão de seu caráter, a idade, a força dos argumentos ou a robustez dos documentos apresentados, basta defender as investigações e a punição dos culpados para ser imediatamente taxado de “coxinha” ou “golpista” pelos próceres petistas e seus simpatizantes. Se quem exige providências já pertenceu ao Partido dos Trabalhadores ou participou dos governos Lula e Dilma, muito provavelmente será chamado de “mentiroso”, “vingativo”, “traidor” ou coisa que o valha. 
 
Tome-se o exemplo do jurista Hélio Bicudo. Hoje com 93 anos, Bicudo ganhou notoriedade durante a ditadura militar – então promotor de Justiça, investigou as atuações do Esquadrão da Morte e denunciou o delegado Sérgio Paranhos Fleury como seu comandante e responsável por dezenas de atrocidades. Nos anos 80, entrou para o PT dez meses após a fundação do partido. Foi secretário municipal, deputado federal e vice-prefeito da Capital. Desiludido com o que viu após Lula assumir a presidência, afastou-se. Bicudo é hoje um dos signatários do pedido de impeachment que está em discussão na Câmara dos Deputados e que pode resultar no afastamento de Dilma. Apesar de seu histórico de coragem e reputação ilibada, teve que ouvir insinuações de que estaria “senil”. Um de seus filhos, o biólogo José Eduardo Bicudo, não economizou nos adjetivos para criticar a postura do pai. “É triste ver uma pessoa que possuía um patrimônio político e uma história de vida digna juntar-se à direita mais sórdida do nosso país para fazer um papel no mínimo ridículo, extemporâneo e se expondo de uma maneira pueril”. Considerações ideológicas à parte, o filho de Bicudo não foi capaz de elencar um único argumento concreto para rebater as acusações de corrupção que pesam contra o governo.
 
Delcídio Amaral, filiado ao PT por quinze anos, é senador da República desde 2002. Durante dois anos, foi líder do governo Dilma Rousseff no Congresso Nacional. Despachava semanalmente com a presidente da República, interagia com os ministros de Estado, acompanhava liberação de emendas para os colegas parlamentares e ainda era muito próximo do ex-presidente Lula, com quem conversava frequentemente. Preso pela Operação Lava Jato ao ser flagrado num conversa gravada tentando comprar o silêncio de Nestor Cerveró, que ameaçava fazer delação premiada, resolveu contar tudo o que sabia. De uma hora para outra, virou um “mentiroso contumaz”, como o classificou o então ministro da Justiça, José Eduardo Martins Cardozo, como se Delcídio não tivesse sido homem de confiança de Dilma até três meses antes. Lula o chamou de “imbecil”. Ofensas à parte, ninguém exibiu um argumento capaz de derrubar as evidências que ele apresentou, como voos, horários de reuniões e encontros que manteve a mando de Lula e Dilma para tentar abafar a Lava Jato.
 
O juiz Sérgio Moro, ironizado por Lula como “comandante” da “República de Curitiba”, conduz uma operação que já recuperou impressionantes R$ 3 bilhões desviados dos cofres públicos e condenou, ao longo de dois anos de atuação, dezenas de corruptos a mais de 900 anos de cadeia. Mas para o PT, Moro não serve, porque é “justiceiro”, “não respeita o devido processo legal”, “gosta de aparecer”, “comete arbitrariedades”. O promotor paulista Cláudio Conserino, que pediu a prisão preventiva do ex-presidente por conta do tríplex do Guarujá, é considerado “louco” pelo presidente do PT, Rui Falcão. O juiz federal Itagiba Catta Preta, que concedeu a primeira liminar que suspendeu a posse de Lula no Ministério da Casa Civil, é atacado como “parcial” porque havia participado de manifestações contra Dilma. 
 
Nem os integrantes dos tribunais superiores são poupados da verborragia lulopetista. O ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes, que também concedeu liminar contra a posse de Lula, foi acusado de estar “sob suspeição” porque havia criticado o governo um dia antes. Aqui, cabe um parênteses. Seu colega Dias Tóffoli, que foi advogado do PT e de José Dirceu, participou normalmente do julgamento do mensalão sem que jamais qualquer petista o tenha colocado “sob suspeição”.  Registre-se que sua caneta foi bastante leve na “dosimetria das penas” aplicáveis aos mensaleiros. Mas se um magistrado decide contra o PT, pronto: não serve mais, não é isento, não pode julgar. Tem mais. Na opinião de Lula, a corte suprema inteira “está acovardada” e “não tem saco”; o procurador geral da República, Rodrigo Janot, é “ingrato” porque se recusa a atender suas demandas. O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Carlos Lamachia, “é filho da puta”, na ‘elegante’ avaliação do então ministro da Casa Civil, Jaques Vagner.
 
Num único ponto concordo com os petistas que insistem em defender Dilma, Lula e a organização criminosa que, sob comando de ambos, se instalou nos mais altos escalões da República: não vai ter golpe. O que vai haver é a deposição constitucional da presidente da República por crime de responsabilidade, dentro das regras democráticas e como parte de um processo de impeachment que será, primeiro, avaliado pela Câmara dos Deputados e, depois, pelo Senado. Tudo absolutamente dentro da lei. O resto é discurso míope de quem rechaça a realidade. 
 
 
Corrêa Neves Júnior, diretor executivo do GCN 
email - jrneves@comerciodafranca.com.br

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