O que falta dizer sobre os pedágios

Desde que a Artesp (Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados de Transporte do Estado de São Paulo) anunciou, no final de janeiro

14/02/2016 | Tempo de leitura: 5 min

“Nenhum homem tem o dever de ser rico, grande ou sábio; mas todos têm o dever de serem honrados”
 
Rudyard Kipling, escritor britânico
 
 
Desde que a Artesp (Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados de Transporte do Estado de São Paulo) anunciou, no final de janeiro, que duas novas praças de pedágio serão instaladas na região, o tempo fechou. A população - cujos sentimentos variam, com raríssimas exceções, entre indignação e revolta - partiu com tudo contra os políticos, especialmente prefeitos e vereadores, exigindo que se posicionassem e agissem em relação ao “presente” do governo do Estado. 
 
Não demorou para que críticas ácidas e moções de repúdio contra o governador Geraldo Alckmin (PSDB), cuja reputação e prestígio na região pareciam inabaláveis, começassem a se multiplicar. Quem teve coragem de se posicionar com clareza e firmeza, saiu-se bem. Fazem parte deste grupo o presidente da Câmara de Franca, Marco Garcia (PPS); o prefeito e a vice de Patrocínio Paulista, Marcos Ferreira (PT) e Néria Buzatto (sem partido); o vice-prefeito de Rifaina, Cidinho Diniz (PMDB); o vereador de Jeriquara, Dinei Dias (DEM); e o ex-prefeito de Cristais Paulista, Hélio Kondo (PMDB). Bastante contundentes no discurso, ainda ajudaram a organizar protestos que paralisaram o trânsito nos locais onde estão previstas as praças de pedágio.
 
No sentido oposto, há os que se recusaram a rechaçar os pedágios, se omitiram ou, tanto pior, tentaram ficar em cima do muro. Faz parte do primeiro grupo o vereador Cordeiro (PSB). Diante da moção de repúdio contra o governador, votou contra. Se sua posição não fez diferença para o resultado, já que a moção foi aprovada, o mesmo não se pode dizer da sua imagem, chamuscadíssima. 
 
No segundo grupo estão os omissos, que fingem que o problema não é com eles. São os casos dos vereadores Laercinho (PP), Donizete da Farmácia (PSDB) e Jépy Pereira (PSDB), que “desapareceram” do plenário na hora da votação da moção de repúdio. Também podem ser incluídos no mesmo saco os ex-deputados Marco Ubiali (PSB) e Gilson de Souza (DEM), além do prefeito de Franca, Alexandre Ferreira (PSDB). O trio tem feito cara de paisagem e, obviamente, irritado a população.
 
Pior é a situação de quem tenta acender uma vela para Deus e outra para o Diabo. É o caso do oblíquo vereador Adérmis Marini (PSDB), protagonista de um volume de selfies em redes sociais capaz de fazer corar muito ator de novela. Firme como uma vareta de bambu, Adérmis primeiro insinuou ser contra pedágios. Depois, diante da moção de repúdio ao governador, votou contra. Duramente criticado, tentou mudar outra vez e apresentou nova moção. Desta vez, contra os pedágios ao invés do governador, como se um e outro não fossem a mesma coisa neste contexto. Tentou ainda se apresentar como líder dos protestos. Acabou ouvindo uma vexatória reprimenda do seu colega, Daniel Radaeli (PMDB). “Todos nós sabemos que foi o Marco Garcia que trouxe este movimento para a Câmara. Temos que ter posicionamentos claros e não podemos ficar em cima do muro”, vaticinou Radaeli.
 
Obviamente, nenhuma situação é mais difícil do que a do deputado Roberto Engler (PSDB), que há anos faz da duplicação de rodovias da região uma de suas principais bandeiras de campanha. Engler foi veemente ao afirmar que em hipótese alguma haveria instalação de praças adicionais. “A proposta é um acordo com a Autovias, em que o trecho seria todo duplicado de Franca até Rifaina, sem nenhum pedágio. Não existe pedágio, ninguém fala em pedágio. Só terrorista tá falando em pedágio, porque não existe essa possibilidade”, disse o deputado tucano, conforme é possível assistir num arquivo resgatado por Sidney Elias, membro da Udecif (União em Defesa da Cidadania de Franca). Engler também mandou instalar dezenas de placas de outdoor comemorando a duplicação, com um nada discreto carimbo: “sem pedágio”. Não poderia haver inverdade maior.
 
Engler acusou o golpe. Disse se sentir traído, falou que só tinha prometido porque repetia as palavras do governador e que nunca antes enfrentara uma situação como essa. Afirmou também que tem tentado marcar uma audiência para discutir a situação pessoalmente com Alckmin mas que, apesar de seus sete mandatos, não tinha conseguido o tal encontro. Engler não fugiu do problema, o que merece registro, mas dificilmente vai conseguir anular um imenso dano ao seu patrimônio eleitoral. 
 
Instalar ou não pedágios para financiar a construção de rodovias é uma decisão de cada governo. Não raro, é a única alternativa possível para financiar o crescimento e a modernização da malha viária. O que não pode é essa justificativa ser construída sobre uma mentira. O governador Geraldo Alckmin nunca deixou claro que junto com a duplicação viriam pedágios. Fez campanha por aqui e jamais desmentiu seus correligionários que garantiam que não haveria cobrança. Se mudou de ideia, deve dizer o que houve, porque decidiu fazer assim – e, claro, apresentar seu mea culpa. Ou recuar 
 
Uma postura dessas seria muito mais eficiente do que colocar a polícia para coibir os protestos, mesmo porque não intimida mais ninguém nem abranda o humor da população. Se insistir neste caminho, não será surpresa se o prestígio e a reputação que fizeram de Alckmin uma unanimidade na região acabarem evaporando antes mesmo que o primeiro pedágio comece a funcionar. Neste Brasil de tantos políticos indignos, é uma péssima perspectiva para quem almeja a presidência da República ficar marcado como alguém que não honra o que promete. Palavra empenhada deve ter força de lei para um homem honrado. E ponto.
 
Corrêa Neves Júnior, diretor executivo do GCN 
email - jrneves@comerciodafranca.com.br

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

Fale com o GCN/Sampi! Tem alguma sugestão de pauta ou quer apontar uma correção?
Clique aqui e fale com nossos repórteres.

Receba as notícias mais relevantes de Franca e região direto no seu WhatsApp
Participe da Comunidade

COMENTÁRIOS

A responsabilidade pelos comentários é exclusiva dos respectivos autores. Por isso, os leitores e usuários desse canal encontram-se sujeitos às condições de uso do portal de internet do Portal SAMPI e se comprometem a respeitar o código de Conduta On-line do SAMPI.