Um jornal não é uma simples empresa. Apesar de privado, ele permeia o espaço público a todo o momento. Os interesses do jornal são o da população e, na maioria das vezes, o único espaço que a comunidade encontra para ter voz. Com o Comércio da Franca, não é diferente. Nestes 100 anos de história, retratamos nas nossas mais de 22 mil edições a evolução do nosso povo, da nossa Franca. Aprendemos, crescemos juntos, lutamos juntos. São dezenas de bandeiras levantadas em nossas páginas em defesa dos francanos. São lutas que temos orgulho de termos empreendido.
Um século da história do nosso povo foi retratado por nós. E ao nos transportamos lá para trás, lá no longínquo 1915, e caminhar na história até os dias de hoje, temos certeza de que valeu a pena. Temos certeza de que vale a pena lutar pelos nossos ideais, vale a pena lutar pelo nosso povo! Vamos juntos fazer esta viagem pelos 100 anos do Comércio? Confira a partir desta e pelas próximas páginas as principais histórias contadas por nós.
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Franca. O grande empório. Araguary... Terra do Capim Mimoso. Goyas. Minas Geraes... São Paulo. Uberaba. Igarapava... Santa Rita. Covas. União Sovietica... Garimpo das Canoas, Dores do Aterrado, São Thomas de Aquino. Estados Unidos. China. Rússia... Itália. Africa do Sul. Paraguai... Ah, Uruguai também!
Como noticiamos ilustres francanos indo para lá no início do século XX! A Europa era o centro do mundo, mas a Suíça sul-americana era o destino preferido dos nossos colunáveis.
Lutávamos contra o progresso. Não exatamente contra ele em si. Mas contra ele fora de si - aliás, fora de nós. Nem podíamos lutar contra o progresso! Afinal, nascemos e somos, um “orgam dedicado aos interesses do commercio, lavoura, industria e artes”. Tudo assim mesmo, sem acento e com emes de sobra. Somos o O Commercio da Franca. E por ser “da Franca”, defendemos o progresso da Franca.
Estranho pensar assim hoje. Normal, há cem anos. Nosso forte não era vender sapato ou couro. A “terra do capim mimoso” vivia a era do café. A cidade, apenas um ponto de passagem. Quem vinha de Goyas, Uberlândia, Uberaba pelo “trem rápido” com destino ao “grande empório” era obrigado a pernoitar na Franca. Na volta, também. Quem vinha de Santa Rita (hoje Cássia-MG), Passos e Sul de Minas, Patrocinio de Sapucay também. Esses, porém - coitados -, não tinham o privilégio do “rápido”. Andavam “legoas a cavalo, legoas essas despendiosas e encommodas.”
Defendíamos a “linha de automóveis” dessas “freguesias” para cá, mas de “trem rápido” de lá para o “grande empório” nem pensar. Já havíamos perdido a ‘freguesia‘ de São Thomas para Paraíso.
Logo nas suas primeiras edições, o Comércio da Franca - ou o O Commercio da Franca - empreendeu sua primeira grande batalha. A luta contra a implantação da linha férrea que ligaria Goiás e o Triângulo Mineiro a São Paulo, sem a necessidade de passar por Franca. “Um assumpto palpitante.”
Perderíamos inúmeros hóspedes. Perdemos! Mas houve um alento, o ramal Santa Rita-São Sebastião do Paraiso não passou de ideia. Logo, a cavalo ou automóveis, atraíamos sul-mineiros. Nosso comércio, nossos hotéis continuam a receber os passageiros da Mogyana que aqui pernoitavam. Vencemos parte da nossa primeira batalha. Grande parte.
Afinal, vanguardista que somos, não queríamos apenas manter o que tínhamos, queríamos mais para nossa Franca. Compensação? Também! Mas era preciso avançar. Almejávamos educação.
Queremos a Escola Normal. Queremos a Escola de “Pharmacia” e Odontologia. Escolas trazem progresso. “A exemplo de Guaratinguetá, Casa Branca e outros cidades, a Franca forçosamente há de sentir-se revigorada com esse melhoramento, porque, de facto, uma Escola Normal, é um elemento de primeira grandeza para o progresso intelectual e pecuniario de qualquer povo.”
Afinal de contas, “a Franca é uma cidade importante pelo seu collegio eleitoral, pela riqueza de seu município, pelo prestigio de seus politicos, e enfim, é importante por ser uma cidade largamente favorecida pela natureza que a dotou com um clima salubérrimo, admirado por todos os forasteiros.”
Vieram a Escola Normal e de Pharmacia e Odontologia. Celeiros de professoras e ‘doutores‘.
Almejávamos segurança.
Era o início de dezembro de 1915. A Primeira Guerra Mundial já rolava lá na Europa desde o ano anterior. E nós, aqui, já há quatro anos sem a Linha de Tiro nº 23, “a qual, durante o curto período de sua existencia, brilhou extraordinariamente, constituindo um padrão de orgulho para a população francana”. Mas “o serviço militar não vae adeante, porque o nosso povo tem horror à farda”.
E alertávamos: “Emquanto dormimos indolentemente nos braços sensuaes da Preguiça, a Argentina, Chile, Uruguay e outros paizes americanos augmentam o exercito, melhoram a marinha de guerra, abrem escolas de aviação, propagam em todos os pontos do territorio as linhas de tiro e difundem profusamente o escotismo. Previnem-se contra os imprevistos do futuro”.
E cutucávamos: “E no Brasil, que de todos é o paiz mais necessitado, quando se trata de fazer vingar qualquer projecto util, esbarra-se logo com a habitual resposta: Deixe-se disso; aqui nada vae adeante”. Curioso, né? Não, não era 2015. Era 1915. Mudaram as estações (exatamente 400 vezes), nada mudou!
Lá, há 100 primaveras, já defendíamos: “Precisamos banir esses termos desanimadores e combater com energia a hereditária preguiça, que nos tem infelicitado e travado a marcha do nosso progresso. Devemos adquirir, por meio de grandes esforços, o habito de cooperar em todas as sugestões que possam melhorar a situação do Paiz”.
Conclamamos nossos “collegas” - éramos uma meia dúzia de jornais na Franca daquela época. E todos responderam positivamente na campanha encabeçada por várias edições do O Commercio da Franca. Também a sociedade francana respondeu “bem” a essa “patriotica resolução de organisar a Linha de Tiro”. Em menos de um mês, exatamente no Natal de 1915, elegemos a nova diretoria e nossa milícia estava formada.
Não foi preciso combater na guerra, mas nossas páginas registraram as batalhas até 31 de julho de 1918.
Publicamos, inclusive o apelo do chefe da Nação, decretando o estado de guerra, ‘em vista dos crescentes e graves attentados à nossa bandeira praticados pelo governo allemão‘. Isso foi em 7 de novembro de 1917. A Alemanha perdeu a guerra. Podemos dizer que ganhamos?
O que podemos dizer é que em 7 de agosto de 1918 publicamos um pedido de desculpas a nossos leitores - revoltados com um artigo de um de nossos ilustres colaboradores, Sabino Loureiro. Entenderam que no texto da semana anterior teríamos defendido a Alemanha. Nunca!
Mas não vamos mais falar de guerra... Pelo menos até 1932. A nossa grande bandeira...
Lá no começo de 1922 - no começo mesmo! Dia 1º de janeiro, ao meio-dia, seria inaugurado o “moderníssimo” novo prédio da Santa Casa de Misericordia. Foi um festão. Começou no dia 24 do mês anterior. Mas o ápice foi no dia 1º. Teve alvorada às 4 da manhã, “bla-bla-bla” ao meio-dia, “vesperal cinematographica” às 14 horas no Santa Maria (esse era nosso cinema) e, à noite, concerto seguido de “kermesse”. Anunciamos a festa na primeira página com um “clichê” do Major Torquato Caleiro, nosso prefeito e provedor da Santa Casa.
Na edição seguinte e até fevereiro, registramos que “com o maior brilhantismo possível, effectuou-se, no dia 1° do corrente anno, a imponente solennidade da inauguração do novo edifício da Santa Casa de Misericórdia”. Publicamos discursos e contamos um pouco da história dessa senhora que, dias atrás - já em 2015 -, comemorou seu aniversário de 118 anos com abraço de funcionários no prédio (não aquele “moderníssimo”) e bexigas.
O dia em que concluímos as publicações sobre a Santa Casa (11 de fevereiro) foi o mesmo em que começou a Semana de Arte Moderna de 1922. Ano este que, em Franca, foi definitivamente um ano de inaugurações.
Exatamente quatro meses depois - em 11 de junho -, nossa primeira página e a 2 anunciavam a “inauguração official do Estadio de Franca”, com direito a duas fotos. Tal acontecimento mereceu repercussão na edição seguinte. Nosso velho “Nhô Chico” não imaginaria que, aberto com o “empolgante jogo Syrio - Francana” estaria hoje, em 2015, cravado - mas nem por isso desprezado - em pleno Centro de Franca.
Seis anos depois, nossa primeira edição especial. Em 7 de setembro de 1928, fomos às ruas com incríveis 24 páginas - graças à Escola Normal de Franca. Inaugurada nesse mesmo ano, a escola mereceu um O Commercio da Franca praticamente só sobre ela. Recém-criada, ainda não tinha sede própria. Fazia apenas um mês que havia sido lançada a pedra fundamental do prédio - hoje a Escola Estadual “Torquato Caleiro”.
Entramos na adolescência. Nosso aniversário de 14 anos. Era 30 de junho de 1929 - se o dia do aniversário não coincidisse com dia de publicação do jornal, uma vez que o jornal era semanal, a publicação ou era adiantada ou atrasada, mas todo dia 30 de junho tinha um Commercio da Franca. É, assim mesmo, sem o “O”. Adolescente e sem artigo.
15 de novembro de 1930. O Brasil comemorava 41 anos de república. Há quatro dias havia-se instalado no país o Governo Provisório, com Getúlio Vargas à frente. O Commercio tudo publicou, inclusive o decreto “da revolução”. Mas esta edição do dia 15 foi a última de 1930. O jornal só voltou a ser publicado dois meses depois.
No dia 11 de janeiro, apenas uma pequena menção sobre o acontecido: “Logo que circulou pela cidade a notícia de que o Commercio da Franca ia reapparecer, cessando a injustiça da medida que o suspendeu, a esta redacção affluiram numerosas pessoas amigas, collaboradores, assignantes e annunciantes que nos vieram felicitar por esse motivo. Uma confortadora demonstração de solidariedade que tanto nos commoveu”.
Nesse mesmo dia 11, reconhecíamos o triunfo da revolução. Mas já sinalizamos para a nossa maior batalha: “Não podemos nem devemos falar para já em constituinte e eleições. Ainda é cedo”. Mas em 3 de abril do ano seguinte, já era tarde. Os paulistas se alvoroçavam. Publicamos então, o artigo “A república que a revolução destruiu” - uma crítica um tanto quanto tímida, transvestida de resenha de livro com mesmo nome.
Um mês depois, levantamos de vez a bandeira por uma Constituinte. Chega de governo provisório! Patrocinamos um grande comício na Praça Barão, ao lado de outras lideranças francanas. O sucesso foi retumbante: 5 mil pessoas foram às ruas comemorar a vitória paulista, no movimento do dia 23 de maio, quando nosso Estado retomou sua autonomia. Também encomendamos uma missa em memória de MMDC.
São Paulo queria a Constituição, outros Estados nos viam como “algozes do Brasil”. Éramos apenas “inimigos da ditadura”. Em 26 de junho, a frente única é São Paulo reentregue a si mesmo. Vamos à luta.
Em 12 de julho, estava formada a Liga Constitucionalista de Franca. Foram meses de batalha, de luta, de clamor pela república. Francanos deram a vida por esta causa. Em setembro os combates se agravam. No dia 18 de setembro de 1932, com um brilhante texto de Antonio Constantino, exaltamos a participação dos filhos dessa terra e dos irmãos de Ribeirão Preto na Revolução.
É nossa última edição durante os combates, que se cessariam em duas ou três semanas. Com a nossa derrota. “Somos vencidos-vencedores (...) Caímos de pé”. Voltamos em 23 de outubro. “Nós ficamos onde estávamos, mas sem ódio, sem rancores, pairando num plano bem elevado, donde possamos ver o anjo da paz estender a doce brancura das suas azas por sobre todo o Brasil.”
No ano seguinte, Getúlio Vargas convocou eleições para a Assembleia Constituinte e, em 1934, publicou a terceira Constituição do Brasil. Finalmente a vitória!
Mas Franca demorou muito para homenagear a memória de seus filhos imolados no comb ate. Foi só em 2 de junho de 1935, que noticiamos as homenagens a nossos heróis. No dia 23 de maio chegaram à cidade as urnas dos Voluntários da Franca, para que recebessem “excepcionaes” homenagens e aqui fossem sepultados. A cidade parou para venerar os “gloriosos despojos” e fomos às ruas com uma edição repleta de fotos.

Na capa do jornal acima, de 11 de junho de 1962, a inauguração oficial do "majestoso" Estádio da Francana

No dia 1º de janeiro de 1922, foi inaugurado o "moderníssimo" novo prédio da Santa Casa de Franca. Na imagem abaixo, Dr. João Marciano de Almeida (sentado), à direita do Dr. Jonas Ribeiro e à esquerda Dr. Alcindo Ribeiro Conrado
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