Prefeito para quê?

Sempre que há eleições no Brasil, candidatos dos mais diversos partidos se apresentam cheios de boas intenções. Todos têm propostas “concretas”

22/02/2015 | Tempo de leitura: 4 min

“A omissão é a forma mais abjeta da mentira”
Baptista-Bastos, escritor português
 
 
Sempre que há eleições no Brasil, candidatos dos mais diversos partidos se apresentam cheios de boas intenções. Todos têm propostas “concretas”, garantem ser “diferentes” de seus opositores, cantam em prosa e verso sua “honestidade” e a disposição infinita para o “trabalho duro”. Claro, juram que seu “único” objetivo na vida pública é “fazer o bem”. Na absoluta maioria dos casos, é puro deboche. 
 
A canhestra realidade oferecida pela grande maioria dos políticos tão logo passada a posse não poderia ser mais diferente. Investidos nos cargos, lixam-se para a opinião pública, para o bem comum, para o que é certo e digno. O que conta, na prática, são os “amigos”, o círculo íntimo de bajuladores, a lei do mínimo esforço e os interesses nada republicanos. E o povo? “Dane-se o povo”, parecem murmurar, protegidos pelas sombras dos edifícios públicos onde se instalam com seus protegidos. É assim em Brasília. Não há nenhum elemento que indique que seja diferente em Franca.
 
Desde o início de seu governo, Alexandre Ferreira (PSDB) ignora os problemas e parece brincar com os instrumentos e instituições que as democracias modernas forjaram para garantir transparência e lisura. A “sindicância” é uma delas. Na atual administração, sindicâncias são abertas - mas quase nunca concluídas. Os responsáveis por um problema recorrem sempre à desculpa clássica - “há uma sindicância em andamento” - para jamais serem claros ou específicos sobre qualquer assunto. Quase ninguém é punido, afastado ou cobrado. Ninguém, jamais, se desculpa por coisa alguma.
 
Nas áreas de saúde e obras, por conta da gravidade das denúncias e da repercussão de alguns episódios, os problemas ganharam contornos tão trágicos quanto ridículos. Os pronunciamentos nas últimas duas semanas feitos pela responsável pela área da Saúde, Rosane Moscardini, e pelo comandante da pasta de Planejamento Urbano, Nicola Rossano, no plenário da Câmara Municipal, são tristemente autoexplicativos.
 
Rosane Moscardini falou antes do Carnaval. Numa sessão em que os vereadores só faltaram estender tapete vermelho, a secretária que está enroscadíssima com denúncias do Ministério Público Federal, Estadual e do Trabalho falou sem ser interrompida. Sobre os problemas mais graves, como o valor que terá que ser ressarcido por médicos que receberam a mais da prefeitura ao longo de anos, nenhuma explicação. Limitou-se a dizer que o relatório foi encaminhado ao MP, mas que não tinha calculado os valores. Rosana só computou as horas, como se os valores fossem migalhas. Claro, também não se recordava de quantos profissionais estavam envolvidos no esquema nem o total de horas a serem ressarcidas. 
 
Quanto às mortes, bateu na tecla das “sindicâncias”. Disse que algumas foram concluídas, mas que não podia falar sobre o que foi feito com os servidores envolvidos. Nada mais absurdo. Foram advertidos? Suspensos? Exonerados? Que tipo de erro cometeram? Os erros contribuíram para a morte dos pacientes? De quem? Nenhuma palavra. A secretária também não explicou porque a prefeitura insiste em construir UPAs (Unidades de Pronto Atendimento) que ficam fechadas por falta de profissionais, como a do Aeroporto, nem porque tem acontecido o desmantelamento da Casa do Diabético. Mesmo assim, recebeu “parabéns” de Nirley de Souza (DEM) e Donizete da Farmácia (PSDB) pela “qualidade” do seu trabalho. 
 
Nesta semana, foi a vez de Nicola Rossano falar. Admitiu, entre soluços e hesitações, que os fiscais da prefeitura de Franca “mediram errado” as obras das creches da Quinta do Café, do Palermo City, Guanabara e Luiza. Para mais, obviamente. Segundo o MP, que ao invés de “erro” aposta em má-fé, o prejuízo só nestas obras foi superior a meio milhão de reais. Mas para Nicola, nada disso é razão para afastar os suspeitos. Uma “sindicância” foi aberta mas, enquanto isso, os fiscais seguem trabalhando. Normalmente. 
 
Sem corar, Nicola ainda culpou a falta de equipe para tentar justificar a razão pela qual, nas suas próprias palavras, é “impossível” fiscalizar as obras. Nicola perdeu a chance de explicar porque os pagamentos para a construtora não foram suspensos na época do atraso e continuaram a ser feitos pelos cinco meses seguintes. Não esclareceu por que não visita as obras e nem a razão pela qual não analisava com lupa os relatórios de obras executadas por uma empreiteira como a FFC, que já respondia a processo por contratos esquisitos.
 
Diante de tudo isso, é imperativo perguntar: se este governo não pode dizer quais funcionários cometeram erros que levaram à morte de pacientes, nem se desculpa com os familiares das vítimas; se alega não saber como serão ressarcidos os valores desviados dos cofres públicos para pagar a farra das horas-extras; se ignora como vai colocar em funcionamento uma UPA já construída; se não tem equipe para fiscalizar as obras em construção na cidade e, se os poucos fiscais que tem, não podem ser punidos quando flagrados em atitude tão suspeita que levou a Justiça a decretar a indisponibilidade de seus bens, para que precisamos de prefeito? 
 
O que faz, afinal, o prefeito de Franca que justifique o seu salário, os benefícios e, ainda mais importante, a confiança que milhares de pessoas depositaram em seu nome? Alexandre Ferreira tem tudo para conseguir a proeza de reduzir a pó o respeito da população pelo cargo que ocupa. Não precisa nem de muito esforço. Do que jeito que as coisas vão, falta pouco para chegar lá. 
 
Corrêa Neves Júnior, diretor executivo do GCN 
email - jrneves@comerciodafranca.com.br

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