Remédio amargo, mas sem partidarismo

Convenhamos, a derrota da seleção brasileira para a Alemanha, no último dia 8, terça-feira, por 7 a 1, além de inesperada conseguiu arrancar

13/07/2014 | Tempo de leitura: 4 min

“A desilusão é o remédio amargo que sara e traz de volta a alegria da realidade”.
Adhe Ribeiro, compositor
 
 
Convenhamos, a derrota da seleção brasileira para a Alemanha, no último dia 8, terça-feira, por 7 a 1, além de inesperada conseguiu arrancar lágrimas de cidadãos comuns, jovens, crianças, donas de casa, trabalhadores, como se a nação tivesse seu foco de atenção e expectativa unicamente voltados para o futebol. Eis um erro de interpretação e comportamento.
 
As redes sociais, ainda no intervalo dessa partida pela Copa do Mundo, achincalhavam jogadores, técnico da equipe, políticos, ONGs e, obviamente, Dilma Rousseff, como se fossem responsáveis pelo resultado: outro erro. A Alemanha foi um time mais coeso e superior dentro de campo. É fato. O Brasil se viu perdido, desconectado; mas a partir daí culpar, por exemplo, o governo pela derrota é chegar muito tarde ao cenário das interpretações do que acontece hoje no país.
 
Há duas semanas, nesta coluna, adverti os leitores sobre o desacerto que seria misturar, num só caldeirão de fervura, política e futebol. Mas parece que esse procedimento tende a continuar.
 
Quando digo que estão chegando tarde, é que a maioria dos que hoje enxergam na derrota da seleção uma derrota do governo não conseguia ver que, durante a preparação para a Copa e durante ela, muitos fatos desacertados ocorriam e quase nenhum canal midiático - impresso, televisivo, falado - relatava, por exemplo, que os pedágios subiram mais 5%, que a energia elétrica subiu mais de 15%, que a indústria teve o terceiro mês consecutivo de diminuição na atividade, que mensaleiros foram soltos do cárcere, que o presidente do STF sofria ameaças de morte... Enquanto Neymar era uma unanimidade nacional por uma lesão na coluna, ninguém estampava em primeira folha os mortos e feridos, e a dor de seus familiares, pela queda de um viaduto em Belo Horizonte.
 
Se você analisar o que se passa em Franca, verá que homens públicos, dos mais variados partidos políticos, cometem erros e desatinos, como, por exemplo, a tentativa de aumento das cadeiras na Câmara Municipal, configurando o cenário que já cansei de denunciar: a opção pela quantidade em detrimento da qualidade. O prefeito autoriza aumento das tarifas de ônibus urbano e vai tentando se equilibrar entre erros e acertos.
 
Se você analisar o que se passa no Estado de São Paulo, verá que um governador tucano desorganiza ainda mais a estrutura educacional pública, com uma política salarial risível e falta de diretrizes curriculares fundamentadas na real necessidade do educando. 
 
Se você analisar o que se passa no interior do Palácio do Planalto, saberá com espanto que provavelmente teremos a aprovação do decreto presidencial 8.243 de maio de 2014. Este decreto sugere negar parte da Constituição Federal brasileira para modificar o sistema de governo por decreto. Tem como objetivo “consolidar a participação popular como método de governo”. Em outras palavras: não será nada impossível que militantes de esquerda possam definir o destino da maioria.
 
Se você analisar o que se passa nos corredores dos hospitais públicos, notadamente no Norte e Nordeste, ficará escandalizado com o que se gastou com a Copa e o que não se investiu em saúde pública. Que morram os desassistidos, mas que role a bola no gramado padrão Fifa, segundo a visão vesga do fenômeno Ronaldo.
 
Se você pesquisar a situação da educação brasileira, sofrerá como eu, educador, ao constatar que nosso país ocupa o penúltimo lugar no ranking mundial da educação, enquanto a USP deixa de ser a primeira universidade da América Latina e perde seu espaço para o Chile. 
 
Mas se você não estiver ciente de nada disto e somente a partir dessa semana passa a desconfiar da má vontade política brasileira por causa da derrota da seleção, está chegando tarde a esta mesa de debates.
 
Por outro lado, antes tarde que nunca. A derrota por 7 a 1 talvez funcione como um remédio amargo que auxilie na formação mínima de consciência crítica de toda a situação que vivemos. Mas é preciso cautela - não cometer erros como o de “partidarizar” a derrota. Petistas acusam Aécio por talvez não ter estado presente no Mineirão; tucanos creditam a derrota aos desmandos do PT. Entende agora, leitor, como isto é pequeno, como nada resolve?
 
Ainda temos uma seleção de futebol entre as quatro melhores do mundo. Mas o que isto auxilia na educação, na economia, na política, na saúde, na segurança pública, no salário? 
 
Nenhum partido político é responsável pela derrota brasileira no futebol. Eles são responsáveis, sim, por todas as mazelas arroladas neste artigo. E nós, eleitores, somos responsáveis por lhes dar tamanha autoridade de mando e desmando.
 
Votar da mesma forma como se torce por um time de futebol talvez seja a mais nefasta das paixões para o povo de uma nação inteira.
 
Everton de Paula, acadêmico e editor 
email - evertondepaula33@yahoo.com.br

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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