Uma morte sem explicação

Luara Prieto Ribeiro, 25 anos, era o nome de uma bonita garota francana. Desde meados de dezembro, buscava ajuda médica. Entre idas e vindas

12/01/2014 | Tempo de leitura: 4 min

“A liderança é uma poderosa combinação de estratégia e caráter. Mas se tiver de passar sem um, que seja estratégia”
Norman Schwarzkopft, general americano

Luara Prieto Ribeiro, 25 anos, era o nome de uma bonita garota francana. Desde meados de dezembro, buscava ajuda médica. Entre idas e vindas ao Pronto Socorro “Álvaro Azzuz” e à Santa Casa, estimam-se dez consultas com distintos profissionais, duas internações e duas cirurgias. O périplo foi desgastante - e inútil. Lu Prieto, como se apresentava nas redes sociais, está morta. Foi sepultada no cemitério da Saudade, num clima de consternação, no final da tarde da última quinta-feira.

Reconstituir seus passos no sistema público de saúde desde a primeira consulta, em 15 de dezembro, até sua morte, no final da noite de quarta-feira, 8 de janeiro, é tarefa penosa. No lugar de esclarecer e tranquilizar parentes e amigos com a certeza de que todo o possível foi feito para salvar sua vida, as muitas informações disponíveis sinalizam no sentido oposto, semeiam a terrível hipótese de que pode ter havido negligência ou erro e alimentam angústia e revolta nos familiares e amigos.

Sabe-se, por exemplo, que o primeiro médico que a atendeu diagnosticou infecção urinária e prescreveu antibióticos. Um segundo profissional, que cuidou de Luara num atendimento subsequente, trocou o antibiótico por um analgésico. Dias depois, a jovem seria encaminhada para a Santa Casa, onde passaria o Natal, e ainda que persistissem as dores, receberia alta. Seu estado clínico não evoluiria bem e, de volta ao hospital, acabaria operada por videolaparoscopia. Como persistissem as dores, uma segunda cirurgia, de grande porte, foi tentada para remover o que havia se convertido num resistente abcesso. Luara nunca se recuperaria desta segunda intervenção que, segundo seu pai, se estendeu por sete horas. Os médicos planejavam uma terceira cirurgia, mas não houve tempo. Luara não resistiu. Oficialmente, foi “morte natural”.

Desde que a rádio Difusora, o portal GCN e o Comércio denunciaram o caso, entre quinta e sexta-feira, a população de Franca e região repete, com sutis variações, as mesmas perguntas. Como pode uma menina saudável morrer assim? Por que tantas consultas sem diagnóstico conclusivo? Por que um médico cancelou o antibiótico que um colega havia prescrito? Por que ela foi liberada da Santa Casa se ainda sentia dores? Por que a videolaposcopia não drenou o abcesso? O que, afinal, tinha Luara?

Para estas e outras dúvidas que subsistam, não há qualquer sinal de resposta vindo de quem se espera uma explicação, com uma honrosa exceção: a secretária municipal de Saúde, Rosana Moscardini, a única a vir a público. Moscardini, serena até o limite em que a situação permite, não fugiu às necessárias explicações num momento de tensão e tristeza. Mostrou decência e firmeza de princípios. É uma pena que tenha sido voz isolada.

Dos corredores da Santa Casa de Franca, nem um pio ecoou. Quer seja representando a provedoria, a diretoria ou o corpo clínico vinculado à centenária instituição, ninguém apareceu para explicar coisa alguma. Apenas uma “nota oficial”, recurso típico daqueles que nada têm a acrescentar, foi distribuída em nome da instituição. Nada mais.

No Cremesp (Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo), tanto pior. Dali, nem nota veio. Os delegados da sede de Franca estão viajando e, segundo o solitário atendente, não há substitutos que possam falar em nome da instituição. Tentar o escritório central, na Capital, não resultou em melhor alternativa. Ninguém quis se pronunciar a respeito.

Mas, de longe, o pior e mais angustiante silêncio é aquele que se percebe a partir do paço municipal. O prefeito Alexandre Ferreira (PSDB) não emitiu um sussurro que fosse sobre o caso. Veterinário que se orgulha de seus conhecimentos em saúde pública, pasta que comandou por seis anos num período que prefere definir, hoje, como “governo anterior”, Alexandre Ferreira nada disse sobre a morte de Luara. Na mesma tarde de quinta-feira em que a garota foi sepultada, Alexandre Ferreira se reuniu com representantes da Acif para tratar de trânsito. Não permitiu que a imprensa participasse do encontro. Também não concedeu entrevista terminada a reunião. Tem fugido de repórteres com mais presteza do que o Diabo foge da Cruz. No seu perfil nas redes sociais, que costuma usar para brindar seus “amigos” com mensagens de auto-ajuda de gosto - e pertinência - duvidosos, não há um único post sobre o assunto. Luara Ribeiro não mereceu do prefeito de Franca nem mesmo uma mísera “nota oficial”, ainda que inócua. Dele, nenhum lamento, nenhuma palavra dedicada à família, nenhum pesar por uma morte estúpida ocorrida na cidade que governa, ninguém especialmente designado para acompanhar a sindicância. Nada.

É claro que não se imagina que o prefeito de Franca, qualquer que seja ele, tenha como acompanhar cada consulta, procedimento ou conduta profissional de seus milhares de servidores e subordinados. Não seria crível - nem justo. O mesmo não se pode dizer do que se espera do comportamento do líder diante de problemas sérios. E, num instante de grande comoção, o prefeito de Franca frustrou as mínimas expectativas.

A família de Luara, seus amigos e todos que se comoveram com o drama da jovem francana exigem uma explicação para o que houve. E merecem, acima de tudo, respeito. Dos médicos envolvidos, das autoridades de saúde, dos gestores públicos e, sobretudo e com maior ênfase, do prefeito de Franca. Porque sua morte pode ter sido qualquer coisa. Menos, “natural”.

Corrêa Neves Júnior, diretor executivo do GCN
email - jrneves@comerciodafranca.com.br

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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