Investigador por um dia: a descoberta da 'Viúva Negra'

Não sei se é coincidência ou punição dos meus editores em represália pelo que faço eles passarem ao longo do ano. Fato é que, com raras

30/06/2013 | Tempo de leitura: 4 min

O agente policial Sandro Rocha e o repórter Edson Arantes mostram reportagem sobre a ‘Viúva Negra’
O agente policial Sandro Rocha e o repórter Edson Arantes mostram reportagem sobre a ‘Viúva Negra’

por Edson Arantes

Não sei se é coincidência ou punição dos meus editores em represália pelo que faço eles passarem ao longo do ano. Fato é que, com raras exceções nesses 13 anos de Comércio, quando a maior parte das pessoas está se fartando com a suculenta leitoa, eu sempre estou de plantão no dia 1º de janeiro. Em 2006, não foi diferente. A cabeça ainda doía, acho que havia exagerado nas azeitonas, quando o meu celular tocou. Do outro lado da linha, uma fonte da polícia avisou: “Edson, mataram um cara lá no Aeroporto”. Se havia alguma esperança de almoçar com a família, o policial amigo estragou tudo.

Liguei para o fotógrafo Silva Júnior, que na época trabalhava no Comércio, e fomos juntos passar o primeiro dia de 2006 ao lado de um cadáver esquartejado. O corpo do curtumeiro Carlúcio Dias de Almeida, 47 anos, havia sido encontrado em um córrego próximo à Rua Jerônimo Guido Menezes, no Aeroporto II. Golpes de facão na cabeça foram a causa da morte. Não havia sinais de luta no local. A lei do silêncio prevaleceu. Ninguém viu nada, ninguém ouviu nada. Péssimo sinal para o jornalista que precisava contar uma história completa.

O fotógrafo e eu rumamos para a casa da vítima, que ficava a uns 150 metros do local da desova do corpo. Não é uma experiência das mais agradáveis bater na porta de familiares de alguém que morreu. Se a morte foi por causas violentas, pior ainda. A missão de conseguir alguma informação torna-se quase impossível se o bárbaro crime aconteceu, justamente, no mesmo dia. Nesta hora, ninguém quer saber de jornalista por perto.

Arrependi-me amargamente de ter abandonado a promissora carreira de jogador de futebol, não desejei um feliz Ano Novo para o editor que me escalou para o plantão, “calcei” a cara e toquei a campanha. Não podia voltar para o jornal sem a foto e um mínimo de informação sobre o curtumeiro Carlúcio. Uma mulher baixinha, aparentando uns 35 anos, nos convidou a entrar. Uma simpatia só a dona Aparecida Ferreira Rodrigues.

Enquanto o fotógrafo Silva Júnior ficava quieto em um canto, dei meus pêsames à coitada da mulher e disse que gostaria de fazer algumas perguntas sobre o marido. “Ele era muito bom e vivíamos bem”. Cida contou que o marido havia saído de por volta das 21 horas do dia 31 com destino à casa de seu irmão, que mora no mesmo bairro. “Não sei o que aconteceu depois e nem como tiveram coragem de fazer isto com ele”, disse ela.

Já que a conversa estava evoluindo, pedi a Cida que me desse uma foto de Carlúcio para publicar no jornal. O álbum estava sobre um armário. Ela disse para eu escolher. Enquanto separava a melhor imagem, a mulher manipulava carne em uma embalagem plástica na pia. Com as informações que precisava em mãos, voltei para o jornal.

Da redação, liguei para o agente policial Sandro Rocha, um dos mais experientes e competentes de Franca. Comentei com ele que havia achado muito estranha a atitude da mulher. Ninguém é tão simpático com jornalista e prepara carne poucas horas após o marido ser encontrado com a cabeça arrebentada.

O policial, que não é bobo nem nada, resolveu averiguar e foi à casa da mulher. Encontrou marcas de carriola no quintal. Sinais parecidos haviam sido encontrados onde o corpo foi jogado. De volta à delegacia, Sandro puxou a ficha de Cida. Descobriu que ela havia matado o primeiro marido em março de 1993 e que havia sido condenada a sete de prisão pelo crime. Cida foi levada à sede da DIG e negou o crime. “O primeiro marido eu matei, o segundo não”. Dias depois, ela não conseguiu mais mentir e confessou que havia matado Carlúcio com a ajuda do namorado da filha. O curtumeiro havia sido morto a machadadas enquanto dormia em casa. A mulher e o comparsa colocaram o corpo na carriola e o levaram para o barranco.

Cida deixava o anonimato e entrava para a história como a “viúva negra”. Em julho de 2006, foi condenada a 16 anos de cadeia pelo segundo assassinato. Em março de 2011, foi beneficiada com a prisão domiciliar. Ela ganhou a liberdade, mas dizem que enfrenta dificuldades para encontrar um namorado...

Fale com o GCN/Sampi! Tem alguma sugestão de pauta ou quer apontar uma correção?
Clique aqui e fale com nossos repórteres.

Receba as notícias mais relevantes de Franca e região direto no seu WhatsApp
Participe da Comunidade

COMENTÁRIOS

A responsabilidade pelos comentários é exclusiva dos respectivos autores. Por isso, os leitores e usuários desse canal encontram-se sujeitos às condições de uso do portal de internet do Portal SAMPI e se comprometem a respeitar o código de Conduta On-line do SAMPI.